Durante muito tempo, a língua portuguesa registrou apenas a forma masculina ator para nomear quem representava papéis no teatro. A presença de mulheres nos palcos era rara e, em muitos contextos, até restrita, o que ajudou a manter o masculino como referência geral; com a ampliação da participação feminina nas artes cênicas, especialmente a partir do século XIX, surgiu a necessidade de criar um feminino específico, consolidando o uso de atriz como forma padrão e socialmente reconhecida.
Como surgiu a palavra-chave atriz na língua portuguesa
A palavra atriz segue um padrão comum em português: a formação do feminino com o sufixo -iz, a partir de substantivos masculinos em -or, como em “ator/atriz”, “imperador/imperatriz” e “executor/executriz”. No entanto, esse feminino não apareceu de forma imediata, surgindo de modo esparso em jornais do século XIX à medida que companhias teatrais com elenco feminino se consolidavam nas grandes cidades.
A difusão do termo também se relaciona à influência de outras línguas europeias, como o francês (actrice) e o italiano (attrice), que possivelmente inspiraram gramáticos, jornalistas e empresários do teatro lusófono. Assim, a adoção de atriz resulta de um processo que combina contatos culturais, circulação de textos e adaptação de modelos estrangeiros às estruturas da língua portuguesa.
Para explicarmos esse processo de criação, trouxemos o vídeo do perfil @pedrodemendonca:
@pedrodemendonca Formação do feminino das palavras terminadas em -ão 🇵🇹 #diainternacionaldamulher 🟣 #portugues #portugueseuropeu #portugal #feminino #mulher #idioma #womaninternationalday #portuguese #europeanportuguese #female #woman #language ♬ som original – Pedro Antonio de Mendonça
O feminino de ator sempre foi atriz
Nem sempre o feminino de ator foi percebido como algo estável, pois durante muito tempo o masculino funcionou como termo genérico para qualquer pessoa que atuasse, independentemente do gênero. Com o aumento do protagonismo de mulheres em companhias teatrais, revistas de variedades, radionovelas e, mais tarde, no cinema e na televisão, consolidou-se a distinção entre ator para o masculino e atriz para o feminino.
Alguns gramáticos do século XIX registram incerteza quanto à forma mais adequada, e havia quem defendesse o uso genérico de ator, como ainda ocorre em certos nomes de profissão. Outros já apontavam atriz como forma recomendável para marcar o feminino, e a padronização se fortaleceu ao longo do século XX em dicionários, manuais escolares e na imprensa cultural, em créditos de filmes, programas de TV e premiações artísticas.
- Até o século XVIII – prevalência de “ator” como forma única, com raríssimas referências a mulheres atuando profissionalmente.
- Século XIX – surgimento e difusão de “atriz” em cartazes, anúncios e críticas, ainda em convivência com o masculino genérico.
- Século XX – consolidação de “atriz” em dicionários, na mídia e em prêmios, reforçando de vez o par “ator/atriz”.
Como a evolução de atriz se relaciona às mudanças sociais
A história da palavra atriz acompanha transformações mais amplas na sociedade, como a profissionalização do teatro, o surgimento de escolas de formação artística e o crescimento da indústria cultural. Com a presença feminina cada vez mais constante em cena, tornou-se necessário nomear de forma clara essas profissionais, e o vocábulo atriz passou a funcionar como um marcador de reconhecimento e visibilidade.
Esse percurso não é isolado, pois outras profissões também passaram por processos em que o feminino foi sendo criado, ajustado ou reconhecido com o tempo. A discussão sobre o uso de femininos de profissão ganhou espaço em debates sobre igualdade de gênero, em políticas de comunicação institucional e em documentos oficiais, refletindo a relação constante entre linguagem e organização social.

Como evoluíram as palavras femininas em nomes de profissão
A formação de femininos em português envolve diferentes estratégias, e nem todas seguem o mesmo caminho de atriz, o que gera variações e, por vezes, debates. Alguns pares se estabelecem de maneira regular, enquanto outros permanecem em adaptação ou passam por disputas de uso em contextos formais e midiáticos.
Esse cenário pode ser observado em grupos de profissões e títulos que ilustram diferentes tipos de formação do feminino. A seguir, estão alguns padrões relevantes na evolução das palavras femininas em nomes de profissão e cargos, que mostram como o uso social influencia a consolidação dessas formas.
- Femininos em -a: casos como “professor/professora”, “doutor/doutora” e “médico/médica”, que seguem um padrão produtivo e amplamente aceito.
- Femininos em -iz ou -triz: como em “ator/atriz”, “imperador/imperatriz” e “executor/executriz”, ligados a formações mais antigas e muitas vezes de origem erudita ou influenciadas por outras línguas.
- Formas em adaptação: profissões de surgimento recente ou ligadas a áreas técnicas, como “piloto”, “gerente” ou “presidente”, podem funcionar como comuns de dois gêneros (“a gerente”, “a presidente”), sem alteração morfológica.
- Termos em disputa de uso: femininos como “embaixadora”, “engenheira”, “ministra” e “presidenta” estiveram por muito tempo restritos ou pouco registrados, mas ganharam espaço com a presença crescente de mulheres nesses cargos.
Nos últimos anos, a discussão sobre femininos de profissão passou a aparecer com frequência em manuais de redação, orientações institucionais e debates públicos. Em geral, a tendência é admitir e registrar formas femininas sempre que houver uso consistente, como ocorreu com atriz desde o século XIX, mostrando que a língua acompanha, com seus próprios ritmos, as mudanças na participação social de mulheres em diferentes áreas.







