Pesquisadores da ETH Zurich confirmaram que, a cerca de 2.700 a 3.000 quilômetros abaixo da superfície, a rocha sólida do manto terrestre realmente flui, resolvendo um enigma geológico que intrigava cientistas há décadas. Esse fenômeno ocorre não como o fluxo de lava derretida, mas sim como um deslocamento extremamente lento de material sólido, alterando a compreensão sobre o funcionamento interno do planeta. A descoberta foi liderada pelo professor Motohiko Murakami, especialista em física mineral experimental, e publicada em maio de 2025 na revista Communications Earth & Environment.
O estudo traz respostas para uma das maiores dúvidas sobre a estrutura interna da Terra, especialmente sobre a chamada camada D”, localizada próxima à fronteira entre o manto e o núcleo. Essa região sempre chamou atenção porque ondas sísmicas, geradas por terremotos, aceleram repentinamente ao atravessá-la, sugerindo a presença de materiais ou condições muito diferentes das camadas acima. Por mais de cinquenta anos, a explicação para esse comportamento permaneceu incompleta.
O que é a camada D” e por que ela é tão misteriosa?
A camada D” situa-se na base do manto terrestre, a cerca de 2.700 quilômetros de profundidade. Ela marca a transição entre o manto sólido e o núcleo externo líquido do planeta. Desde a década de 1970, sismólogos notaram que as ondas sísmicas se comportam de maneira incomum ao passar por essa zona, indicando mudanças bruscas nas propriedades físicas dos materiais ali presentes. Por muito tempo, acreditou-se que a explicação estava apenas na transformação mineralógica do perovskita, principal mineral do manto inferior, em uma nova fase chamada pós-perovskita, sob condições extremas de pressão e temperatura.
Como os cientistas desvendaram o fluxo da rocha sólida?
Apesar da hipótese sobre a pós-perovskita, experimentos e simulações mostraram que apenas a mudança de fase não justificava a aceleração das ondas sísmicas. O avanço veio quando Murakami e sua equipe utilizaram modelos computacionais sofisticados e experimentos laboratoriais para analisar o comportamento dos cristais de pós-perovskita. Eles descobriram que, quando todos os cristais desse mineral se alinham na mesma direção, a velocidade das ondas sísmicas aumenta, reproduzindo o fenômeno observado na camada D”.
Para comprovar essa hipótese, os pesquisadores submeteram amostras de minerais a pressões e temperaturas semelhantes às do interior da Terra. Medindo a propagação das ondas sísmicas nessas condições, conseguiram replicar em laboratório o mesmo salto de velocidade observado nas profundezas do planeta. Isso demonstrou que, de fato, existe um alinhamento dos cristais de pós-perovskita na D”, causado pelo fluxo horizontal da rocha sólida no manto inferior.

Por que a rocha sólida flui nas profundezas da Terra?
O fluxo da rocha sólida no manto profundo é resultado de um processo chamado convecção mantélica. Diferente do que ocorre com líquidos, nesse caso, o material permanece sólido, mas se move lentamente devido à pressão e ao calor intensos. Esse movimento lembra o de água fervendo, mas ocorre em escalas de tempo geológicas, ao longo de milhões de anos. O fluxo é responsável pelo alinhamento dos cristais de pós-perovskita, que, por sua vez, altera a propagação das ondas sísmicas.
- Convecção mantélica: Movimento de material sólido causado por diferenças de temperatura e pressão.
- Alinhamento cristalino: Os cristais de pós-perovskita se orientam na direção do fluxo, mudando as propriedades sísmicas da região.
- Impacto geológico: Esse processo influencia diretamente a dinâmica das placas tectônicas, vulcanismo e até o campo magnético terrestre.
Quais são as implicações dessa descoberta para a geologia?
Com a confirmação do fluxo de rocha sólida no manto profundo, os cientistas podem agora aprimorar modelos sobre a dinâmica interna da Terra. Esse avanço permite entender melhor como se formam terremotos, como ocorrem erupções vulcânicas e de que maneira as placas tectônicas se movimentam. Além disso, a descoberta abre caminho para mapear os fluxos internos do planeta, ajudando a visualizar o “motor invisível” que impulsiona diversos fenômenos geológicos.
- Permite a criação de modelos mais precisos sobre o interior da Terra.
- Auxilia na previsão de eventos sísmicos e vulcânicos.
- Contribui para o entendimento do campo magnético terrestre.
O estudo liderado por Murakami representa um marco na geociência, transformando uma antiga teoria em certeza experimental. O conhecimento sobre o fluxo de rocha sólida nas profundezas do planeta reforça a ideia de que a Terra é dinâmica não apenas em sua superfície, mas também em seu interior, influenciando fenômenos que moldam o planeta ao longo de sua história.










