A trajetória de “Emilia Pérez” no Oscar 2025 exemplifica como controvérsias podem derrubar candidatos favoritos em questão de dias. O filme de Jacques Audiard começou o ano como fenômeno absoluto, conquistando recorde de 13 indicações ao Oscar e vitórias importantes no Globo de Ouro. Porém, a descoberta de posts antigos controversos da protagonista Karla Sofía Gascón transformou uma campanha triunfal em campo minado, forçando a Netflix a reformular completamente sua estratégia promocional.
A crise se intensificou quando usuários das redes sociais ressuscitaram publicações antigas de Gascón com comentários considerados ofensivos sobre muçulmanos, George Floyd e diversidade no Oscar. A primeira atriz trans indicada na categoria principal viu sua candidatura histórica ofuscada pela polêmica, enquanto Audiard e Zoe Saldaña se distanciaram publicamente de suas declarações. A Netflix removeu Gascón da campanha promocional, cancelou sua participação em eventos cruciais e suspendeu o financiamento de viagens e styling, deixando a atriz por conta própria durante a temporada de premiações.
Por que a Netflix abandonou Karla Sofía Gascón no momento crucial?
A Netflix tomou decisões drásticas para salvar as chances do filme após as revelações dos posts controversos. A plataforma retirou Gascón de todos os materiais promocionais “For Your Consideration”, substituindo sua imagem por fotos de Zoe Saldaña, Selena Gomez e Adriana Paz. A comunicação entre o estúdio e a atriz foi cortada, passando apenas pelo agente Jeremy Barber da UTA, enquanto a empresa de relações públicas The Lede Company deixou de representá-la.
A atriz, que recebeu apenas 100 mil euros pelo papel que mudou sua vida, ficou responsável por arcar com todos os custos de viagem, hospedagem e styling para eventos da temporada de premiações. Fontes da indústria revelaram que Gascón não compareceu ao SAG Awards, Critics Choice Awards e outros eventos importantes, aparecendo apenas no Oscar sem desfilar no tapete vermelho. A estratégia da Netflix demonstra como estúdios podem sacrificar talentos individuais para proteger investimentos multimilionários e a reputação de projetos maiores.
Como Jacques Audiard lidou com a crise de sua protagonista?
O diretor Jacques Audiard adotou postura ambígua durante a crise, criticando publicamente Gascón enquanto mantinha gestos de cordialidade em premiações. Em entrevista explosiva ao Deadline, Audiard declarou não ter falado com a atriz e questionou por que ela continuava “prejudicando a si mesma e às pessoas próximas”. O cineasta francês descreveu o comportamento de Gascón como “autodestrutivo” e expressou decepção com sua incapacidade de controlar a situação.
Paradoxalmente, Audiard continuou agradecendo Gascón em discursos de premiação, enviando-lhe “beijos” durante a vitória no BAFTA e elogiando seu trabalho no filme. Esta dualidade reflete a complexidade de separar contribuições artísticas de comportamentos problemáticos, especialmente quando milhões de dólares em campanhas promocionais estão em jogo. A posição de Audiard ilustra como cineastas enfrentam pressões para proteger suas obras enquanto lidam com crises de relações públicas causadas por colaboradores.
Que impacto as polêmicas causaram nas chances do filme no Oscar?
As controvérsias afetaram significativamente a percepção de “Emilia Pérez” entre eleitores da Academia. Membros anônimos do Oscar relataram mudanças de opinião sobre o filme, com alguns declarando ter “passado” da candidatura após as revelações. A Netflix investiu milhões na campanha promocional, mas viu o momentum construído ao longo de meses desmoronar em semanas pela má gestão da crise.
O filme ainda conquistou vitórias no BAFTA com Zoe Saldaña levando Melhor Atriz Coadjuvante e Audiard vencendo Melhor Filme em Língua Estrangeira. No Oscar, apenas Saldaña repetiu o feito, levando a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante, enquanto “El Mal” conquistou Melhor Canção Original. As duas vitórias, embora significativas, ficaram aquém das expectativas iniciais para um filme que liderava as indicações e era considerado favorito em múltiplas categorias.

Como Zoe Saldaña navegou pela crise sem comprometer sua carreira?
Zoe Saldaña demonstrou habilidade política excepcional ao se distanciar das polêmicas sem abandonar completamente Gascón. A atriz de “Avatar” expressou tristeza pela situação e declarou não tolerar “retórica negativa contra pessoas de qualquer grupo”, estabelecendo posição clara sobre os comentários controversos. Simultaneamente, Saldaña continuou mencionando Gascón em discursos de premiação, demonstrando profissionalismo e solidariedade mínima.
A estratégia de Saldaña resultou em campanha individual bem-sucedida, culminando nas vitórias no BAFTA e Oscar como Melhor Atriz Coadjuvante. Sua abordagem equilibrada protegeu sua reputação pessoal enquanto honrava o trabalho coletivo no filme, estabelecendo modelo de como atores podem navegar crises envolvendo colegas sem comprometer suas próprias carreiras. O sucesso de Saldaña contrasta drasticamente com a trajetória descendente de Gascón, ilustrando a importância da gestão de crise na era das redes sociais.
Qual o legado desta polêmica para futuras campanhas de premiação?
O caso “Emilia Pérez” estabelece precedentes importantes sobre como estúdios e agentes devem monitorar o passado digital de talentos antes de campanhas de premiação. A Netflix aprendeu que investimentos milionários podem ser comprometidos por posts antigos, forçando a indústria a implementar protocolos mais rigorosos de verificação de antecedentes digitais. A experiência também demonstra como plataformas podem rapidamente abandonar talentos problemáticos para proteger investimentos maiores.
Para a comunidade trans, a polêmica representa revés significativo após a indicação histórica de Gascón como primeira atriz trans concorrendo ao Oscar de Melhor Atriz. O episódio ilustra como representatividade pode ser comprometida por comportamentos individuais inadequados, potencialmente dificultando futuras oportunidades para artistas trans em Hollywood. A indústria do entretenimento deve agora equilibrar representação diversa com due diligence mais rigorosa, aprendendo que visibilidade histórica não oferece proteção contra consequências de ações problemáticas.










