Entre notificações, mensagens e atualizações que parecem não ter fim, uma sensação silenciosa tem se tornado comum: a de que estar conectado o tempo todo já não traz descanso, mas desgaste. A cena de alguém rolando o feed do celular até tarde da noite, mesmo exausto, deixou de ser exceção para se tornar rotina em muitas casas.
O que é FOMO e por que esse medo de perder algo influencia o comportamento
A sigla FOMO vem do inglês fear of missing out, isto é, medo de estar perdendo algo. Ela descreve o incômodo que aparece quando a pessoa sente que outros estão vivendo experiências mais interessantes, informadas ou vantajosas, o que pode intensificar sentimentos de comparação social e de inadequação.
Com as redes sociais e os aplicativos de mensagem, esse medo ganhou combustível constante, pois em segundos é possível ver viagens, festas, conquistas profissionais e opiniões em tempo real. Esse fluxo contínuo pode gerar checagens frequentes, redução da capacidade de foco, maior vulnerabilidade à ansiedade digital e até sintomas físicos, como tensão e dificuldade para relaxar.
Para aprofundarmos no tema, trouxemos o vídeo do especialista Rafael Gratta:
@rafaelgrattap O termo F.O.M.O. (Fear of missing out ou medo de não aproveitar) surgiu recentemente e representa um problema de saúde mental nos dias de hoje 📲 Precisamos ter consciência disso para podermos tomar nossas decisões de forma consciente e orientada aos nossos desejos, e não aos dos outros. Mais Foco Menos Ansiedade 🙏🏽 #saúdemental #ansiedade #foco ♬ som original – Rafael Gratta
Como o FOMO se relaciona com a comparação social e a autoestima
Do ponto de vista psicológico, pesquisas como a de Przybylski et al. (2013), publicada em Computers in Human Behavior, definem o FOMO como um medo persistente de estar perdendo experiências potencialmente recompensadoras. Esse padrão está ligado à necessidade de pertencimento, à satisfação de necessidades psicológicas básicas e ao uso compulsivo de redes sociais.
Nesses casos, a pessoa passa a se conectar não apenas por prazer, mas para aliviar a sensação de estar “de fora”, reforçando um ciclo de vigilância constante. Estudos como o de Vogel et al. (2014) mostram que a exposição contínua a versões idealizadas da vida alheia tende a reduzir a autoestima e intensificar a percepção de fracasso pessoal.
Como o FOMO se manifesta em diferentes fases da vida
Na prática, o FOMO se manifesta de formas variadas ao longo do desenvolvimento. Em adolescentes e jovens adultos, a preocupação costuma estar ligada à vida social, à imagem pública e à necessidade de acompanhar tendências, posts e comentários, em busca de validação por meio de curtidas e compartilhamentos.
Em adultos, o foco frequentemente se volta para o mercado de trabalho, cenários econômicos, decisões políticas e oportunidades profissionais. Em todos os casos, repetem-se padrões como checagens constantes do celular, dificuldade em se desconectar e sensação de nunca estar “em dia” com as demandas informativas.
O que é ROMO e como o alívio de perder coisas pode ser positivo
Em resposta a esse ritmo acelerado, surgiu o conceito de ROMO, abreviação de relief of missing out, ou alívio por perder algo. Em vez de enxergar a desconexão como ameaça, o ROMO propõe vê-la como descanso e como escolha consciente de priorizar o que é realmente relevante em cada momento.
A ideia central é simples: não é necessário participar de todas as conversas, acompanhar cada notícia ou opinar sobre todo assunto para ter uma vida completa. Essa postura se aproxima de um uso mais intencional das telas, em que a pessoa assume o direito de não estar sempre disponível nem totalmente atualizada, reduzindo a culpa por se afastar temporariamente do ambiente digital.

Quais são os benefícios do jejum digital e do ROMO para o bem-estar
O ROMO se aproxima de práticas como o jejum digital, em que a pessoa reduz ou pausa temporariamente o uso de redes sociais, notificações e aplicativos. Nos primeiros dias, podem surgir inquietação, impulso de verificar o celular e sensação de estar “desatualizado”, sinais de quanto a rotina estava guiada pelo FOMO.
Com o tempo, relatos clínicos e pesquisas mencionam ganhos como melhora da qualidade do sono, redução de sintomas de ansiedade, maior capacidade de concentração e retomada de hobbies offline. Em muitos casos, surge também uma percepção mais clara de limites pessoais e de quais conteúdos realmente contribuem para o bem-estar.
Como a geração Z está redefinindo a exposição nas redes sociais
Esse movimento dialoga com mudanças percebidas em parte da geração Z, formada por quem cresceu em meio à internet e aos smartphones. Muitos jovens têm optado por perfis mais discretos, menos exposição e interações mais restritas, priorizando encontros presenciais e conversas em grupos menores.
Mais do que rejeitar a tecnologia, essa escolha indica uma busca por experiências menos filtradas, com mais espaço para autenticidade e vínculos profundos. Em vez de acumular seguidores, cresce o interesse em relações significativas, menos performáticas e mais alinhadas a valores de saúde mental e equilíbrio emocional.
Como adotar o ROMO no dia a dia e manter o equilíbrio digital
Apesar de seu nome, o ROMO não incentiva o isolamento nem prega que todos devem “sumir” das redes. A proposta é encontrar um ponto de equilíbrio digital em que a pessoa consiga se informar, trabalhar e se relacionar sem se tornar refém das notificações, reduzindo o uso automático e aumentando o uso consciente das telas.
Em vez de uma ruptura brusca, muitos profissionais sugerem ajustes graduais na rotina digital. Entre as estratégias mais citadas para reduzir o impacto do FOMO e favorecer o ROMO estão práticas simples que podem ser incorporadas no cotidiano:
- Silenciar notificações não essenciais, especialmente de aplicativos que interrompem o tempo todo.
- Definir horários específicos para checar redes sociais, e-mail e notícias, evitando consultas aleatórias a cada poucos minutos.
- Evitar o uso de telas antes de dormir, criando um período de transição sem estímulos intensos.
- Reservar momentos sem celular em refeições, encontros presenciais ou atividades de lazer.
- Rever a lista de perfis seguidos, reduzindo conteúdos que despertam comparação constante ou sensação de inadequação.
Quando o jejum de redes deve fazer parte de um cuidado profissional
Em alguns casos, especialmente quando há sintomas importantes de ansiedade, depressão ou alterações de sono, o chamado “jejum de redes” pode ser incorporado a um plano terapêutico mais amplo, sempre com acompanhamento profissional. Nesses contextos, o foco é entender o papel das telas na rotina e como elas podem estar agravando quadros emocionais já presentes.
A ideia não é impor regras rígidas, mas oferecer ferramentas para que a pessoa retome o controle sobre o próprio tempo e atenção. Psicólogos e psiquiatras frequentemente combinam ajustes digitais com terapia cognitivo-comportamental, técnicas de relaxamento, reorganização de hábitos de sono e intervenções para fortalecer redes de apoio presenciais.
Como construir uma relação mais consciente com as telas no cotidiano
O avanço da tecnologia digital permitiu ampliar contatos, acessar informação em segundos e encurtar distâncias. Ao mesmo tempo, trouxe desafios para a saúde mental quando o uso de telas passa a substituir grande parte das interações presenciais e das pausas de descanso, reduzindo momentos de silêncio e de introspecção necessários para o equilíbrio emocional.
Nesse cenário, o FOMO funciona como fator de risco, associado à sensação constante de insuficiência, atraso e comparação, enquanto o ROMO aparece como possível fator de proteção. Ao legitimar o direito de se ausentar de certos espaços digitais sem culpa, o ROMO favorece escolhas mais alinhadas com valores pessoais e com um uso mais saudável da tecnologia.
Como encontrar o equilíbrio entre estar on-line e viver o mundo offline
Entre ficar sempre on-line e se desligar completamente, há um território intermediário em que a tecnologia continua presente, mas deixa de comandar cada gesto. Pequenas mudanças, como permitir momentos de tédio, aceitar períodos de silêncio e priorizar conversas sem mediação de telas, ajudam a abrir espaço para experiências menos aceleradas e mais significativas.
A discussão sobre FOMO e ROMO, mais do que propor rótulos, aponta para essa busca por equilíbrio: usar o que o mundo digital oferece sem deixar que o medo de perder algo impeça a pessoa de viver o que está diante dela, fora da tela, com mais presença e qualidade nas relações e nas escolhas cotidianas.
Referências bibliográficas
PRZYBYLSKI, A. K.; MURAYAMA, K.; DEHAAN, C. R.; GLADWELL, V. Motivational, emotional, and behavioral correlates of fear of missing out. Computers in Human Behavior, v. 29, n. 4, p. 1841-1848, 2013.
VOGEL, E. A.; ROSE, J. P.; ROBERTS, L. R.; ECKLES, K. Social comparison, social media, and self-esteem. Psychology of Popular Media Culture, 2014.









