Chegar atrasado com frequência não é um comportamento raro, e costuma gerar estranhamento em ambientes de trabalho, relações afetivas e até em compromissos simples do dia a dia. Em muitos casos, a impontualidade é vista apenas como falta de educação, desorganização ou desinteresse pelas outras pessoas, mas estudos indicam que o hábito pode estar ligado a formas específicas de lidar com o tempo, com as emoções, com as próprias expectativas e até com condições como TDAH e altos níveis de estresse crônico.
O que significa ser sempre impontual segundo a psicologia
Na visão de especialistas em comportamento, a impontualidade crônica costuma ser explicada por um conjunto de mecanismos psicológicos. Um deles é a tendência a subestimar o tempo necessário para realizar atividades, fenômeno conhecido como falácia do planejamento, que leva a crer que “dá tempo” mesmo quando a rotina mostra o contrário (Kahnemann e Tversky, 1979).
Outro aspecto relevante é a diferença na percepção subjetiva do tempo. Algumas pessoas sentem a passagem dos minutos de maneira diferente, o que favorece decisões pouco realistas sobre quando começar a se arrumar ou sair de casa. Em alguns quadros, isso também aparece associado a dificuldades de atenção, impulsividade e problemas de funções executivas, como priorizar e organizar tarefas.
O especialista Fabrício Carpinejar, em seu perfil do TikTok, trouxe uma reflexão sobre o tema, abordando os problemas que podem trazer:
@carpinejar É ACHAR SEU TEMPO MAIS VALIOSO DO QUE O DO OUTRO #carpinejar #atraso ♬ Amélie – Comptine d’un autre été, l’après-midi – (reimagined) – Andrea Vanzo
Por que ser impontual nem sempre indica desinteresse
Apesar de muitas vezes ser interpretada como falta de respeito, a impontualidade recorrente nem sempre está ligada à desvalorização do outro. Em diversos casos, trata-se de um conflito interno entre o desejo genuíno de cumprir o combinado e a dificuldade de compatibilizar tempo, tarefas e limites pessoais de forma realista e saudável.
A psicologia também associa a impontualidade crônica a alguns padrões de comportamento específicos, que podem coexistir e se somar a crenças internas do tipo “dá tempo” ou “é rapidinho”, mantendo o ciclo de atrasos mesmo diante de contratempos repetidos:
- Busca por adrenalina: começar tudo “em cima da hora” gera sensação de urgência que mantém a pessoa em alerta (Fernbach et al., 2011)
- Dificuldade de organização: problemas em priorizar tarefas, estimar prazos e planejar etapas do dia.
- Procrastinação: adiar o início de atividades por insegurança, cansaço mental ou medo de falhar.
- Rotina sobrecarregada: tentativa constante de encaixar mais compromissos do que o tempo realmente permite.
Como as pessoas impontuais costumam se sentir no dia a dia
A experiência emocional de quem vive em atraso costuma ser marcada por tensão e desgaste psicológico. Antes mesmo de sair de casa, muitas pessoas já sabem que não chegarão no horário e começam a sentir culpa, ansiedade ou vergonha, além de medo de julgamento em contextos profissionais e afetivos.
Do ponto de vista clínico, esse padrão não é interpretado apenas como falha de caráter, mas como um modo particular de lidar com o tempo e com a autoexigência. Em alguns casos, a impontualidade se mistura com medo de avaliação, perfeccionismo, pressão profissional intensa e dificuldades emocionais mais amplas, reforçando a sensação de estar sempre “devendo algo” aos outros.

Como lidar com a impontualidade crônica no dia a dia
Quando a impontualidade passa a prejudicar relações, carreira ou bem-estar, a psicologia sugere estratégias práticas para tornar a rotina mais alinhada aos horários combinados. O objetivo não é apenas “forçar” a pessoa a chegar cedo, mas construir novos hábitos de gestão do tempo e de cuidado com limites pessoais.
- Revisar a forma de calcular o tempo: anotar quanto se leva, na prática, para se arrumar, se deslocar e encerrar tarefas importantes.
- Criar margens de segurança: incluir alguns minutos extras em cada compromisso para absorver imprevistos.
- Reduzir o número de tarefas antes de sair: evitar “só mais uma” atividade imediatamente antes do horário marcado.
- Usar lembretes escalonados: configurar alarmes antecipados para início da preparação, saída de casa e horário limite.
- Observar o impacto emocional: notar quando culpa, ansiedade ou pressão exagerada aparecem em torno dos horários.
Em situações em que a impontualidade crônica se associa a sofrimento significativo, conflitos constantes ou dificuldades em outras áreas da vida, o acompanhamento psicológico pode auxiliar na compreensão das causas e na construção de estratégias personalizadas. Em alguns casos, pode ser importante investigar condições como ansiedade, depressão ou transtornos de atenção, para que o tratamento inclua tanto mudanças de hábito quanto intervenções emocionais mais profundas.
Referências bibliográficas
- Kahneman, D., & Tversky, A. (1979). Prospect Theory: An Analysis of Decision under Risk. Econometrica, 47(2), 263-291.










