Com a aproximação da fase crítica do período de seca, o olhar dos especialistas volta-se para os reservatórios que abastecem a capital federal. Na última semana, o nível médio das duas barragens do DF variou entre 97% e 98%. No cenário mais pessimista da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do Distrito Federal (Adasa) para este ano, o menor volume útil que a Barragem do Descoberto deve atingir ao fim de um mês é de 57%, em novembro. No caso da Barragem de Santa Maria, esse indicador deve chegar a 78%, em outubro e novembro.
Apesar de o cenário ser bem diferente em relação ao de dois anos atrás, quando a capital federal enfrentava a crise hídrica, o uso consciente da água não deve ser esquecido. À época, os dois reservatórios atingiram os menores níveis da série histórica, que começou em 1987: o de Santa Maria chegou a 21,6% — em novembro de 2017 —, enquanto o do Descoberto atingiu 5,3% da capacidade, naquele mesmo mês.
Entre 2013 e 2016, a quantidade média de água consumida por brasiliense era de 155 litros por dia. Durante o período de crise hídrica, esse total caiu para 132 litros. Agora, encontra-se em 135 litros por habitante e por dia. “Estamos no período de seca e, naturalmente, os índices dos reservatórios vão baixar. Trabalhamos no monitoramento constante para garantir a segurança hídrica no DF, mas é importante que toda a população se envolva e faça uso racional da água. Ela é um importante bem finito e deve ser usada com responsabilidade”, ressalta o diretor de Operação e Manutenção da Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb), Carlos Eduardo Pereira.
Caso os volumes registrados em determinado mês fiquem muito abaixo do esperado, a Adasa pode adotar medidas para frear o consumo. No entanto, um novo racionamento está fora de cogitação, segundo o diretor-presidente da agência, Paulo Salles. “Aquela crise mexeu com a cabeça das pessoas. Dá muito medo ficar sem água. As pessoas perguntavam-me o que aconteceria, e eu tentava dar explicação. Então, resolvemos fazer as curvas e publicá-las, para mostrar a previsão até o fim do ano. Fazemos várias simulações e escolhemos sempre a pior. Nunca é uma curva otimista. Felizmente, nunca aconteceu de (o resultado) ser pior do que imaginamos”, afirma.
Média
Para os cálculos das curvas de referência, a Adasa leva em conta fatores como taxa de evaporação, início do período chuvoso, consumo de água, área das bacias hidrográficas e a precipitação do fim do ano. As chuvas registradas entre 2019 e 2020, por exemplo, ficaram acima do esperado e contribuíram para que os níveis dos reservatórios entrassem em julho com 100% da capacidade. Na Barragem do Descoberto, isso aconteceu apenas em 1990 e 1994. Na de Santa Maria, esse fato só foi registrado em cinco anos, todos na década de 1990.
Dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) mostram que as chuvas de 2020 ficaram muito acima do esperado nos meses de janeiro, março e abril. A comparação leva em conta a média climatológica, em milímetros, registrada de 1981 a 2010. “Nos últimos cinco ou seis anos, a média estava ficando abaixo do esperado. Neste ano, ficou acima, por causa das chuvas de verão”, explica a meteorologista Andrea Ramos. “Estamos na estiagem, quando o período da chuva diminui significativamente, o que está associado à baixa umidade”, completa.
Nesta época, é comum a umidade do DF cair a 20% ou menos. E a menor ocorrência de chuvas, segundo Andrea, também é observada em outras partes do país, à exceção da região Norte. “O que tem acontecido nos últimos anos é um aumento dos extremos. No DF, 2020 foi bem chuvoso. Nossas estações mediram chuvas acima da média. É difícil falar do papel da ação antropogênica nesse processo, porque temos de avaliar mais a fundo. Nossas informações são do passado, e os prognósticos com que trabalhamos são para, no máximo, três meses”, ressalta a meteorologista do Inmet.
Sustentabilidade
Desde que começou a pandemia do novo coronavírus, o consumo de água dos brasilienses quase não variou em relação ao mesmo período do ano passado, segundo a Adasa. Enquanto houve aumento dos gastos nas residências entre março e junho, a variação foi amortecida pela queda da demanda no comércio, na indústria e no serviço público. Nos cinco primeiros meses do ano, observou-se maior consumo, por pessoa e por dia, em regiões de maior renda do DF: lagos Norte e Sul, bem como Park Way. Fercal, São Sebastião e Pôr do Sol registram os menores índices (veja Por área).
Climatologista e professor do Departamento de Geografia da Universidade de Brasília (UnB), Rafael Rodrigues da Franca considera necessária uma ocupação sustentável e planejada para o DF. “A capital do país veio depois da água. Antes de surgir o Plano Piloto, havia uma bacia hidrográfica. Ocupamos (a região) de forma muito ruim e perigosa, sem levar em consideração os cursos naturais das águas. E isso diminui a disponibilidade hídrica. Você está impermeabilizando (o solo). O pior vem depois: inundações e alagamentos. É muito difícil que a água encontre espaço para escoar ou se infiltrar. E, se a cidade está mais quente, é provável que as chuvas sejam mais fortes e concentradas”, observa.
» Por área
Veja as cinco regiões administrativas que mais gastaram e mais economizaram água no DF. Os dados são de janeiro a maio e levam em conta o dispêndio de litro por habitante por dia:
Maior consumo por pessoa
Lago Sul — 353 l/hab./dia
Park Way — 216 l/hab./dia
Lago Norte — 211 l/hab./dia
Jardim Botânico — 218 l/hab./dia
Plano Piloto — 205 l/hab./dia
Menor consumo por pessoa
Fercal — 97 l/hab./dia
São Sebastião — 104 l/hab./dia
Pôr do Sol — 106 l/hab./dia
Ceilândia e Riacho Fundo 2 —
107 l/hab./dia
Itapoã — 108 l/hab./dia
Fonte: Adasa e Caesb
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