Nietzsche travou uma inusitada polêmica com Flaubert sobre a relação entre pensar e caminhar. Flaubert escreveu que só era possível pensar corretamente sentado. Nietzsche replicou: “Apanhei-te niilista, pensar sentado é pecado contra o Espírito Santo. Só têm valor os pensamentos que temos caminhando”. Nietzsche teve as grandes intuições de sua filosofia enquanto caminhava.
Pois bem, com o objetivo mais modesto de desenferrujar os ossos durante o isolamento social, tenho feito caminhadas cotidianas. No entanto, notei uma mudança no comportamento das pessoas em relação ao início da pandemia: alguns usam e outros não usam máscaras.
Uma senhora que trabalha como empregada doméstica passou por mim de volta para casa. Logo em seguida, veio um carro com um rapaz que limpa piscinas, também sem máscaras. Ao ver a senhora, em ato de solidariedade, parou o carro e deu carona para ela.
Com essa atitude descuidada, ambos têm chances de serem contaminados. Se um dos dois estiver, pode transmitir para o outro. Em caso da doença prosperar, não será fácil conseguir leito em UTI para internação. Alguns precisam ingressar com ação judicial pela Defensoria Pública. Mesmo quando deferida, a vaga pode demorar e o risco de agravamento aumentar.
Não estou entendendo este novo normal, o normal fake, em que as pessoas não usam máscaras provocam aglomerações, promovem festas e não tomam mais cuidados ao saírem às ruas. É como se a batalha contra o vírus já estivesse ganha. E isso no momento em que atingimos a marca trágica de mais de 100 mil mortos e permanecemos com a média em torno de mil mortos por dia.
É compreensível que seja difícil para todos manter o isolamento social por mais de cinco meses. As pessoas estão cansadas. Mas o vírus não é sensível a esse argumento. Existem guerras com a duração de cinco ou 10 anos. E ninguém baixa a guarda sob a alegação que está fatigado. O alongamento da pandemia no Brasil é consequência direta das teses negacionistas propagadas pelos governantes.
Eles diziam que o isolamento social atrapalhava a economia, quando, obviamente, o problema era a pandemia. Negar a doença, em um ardil de avestruz, não é uma solução.
Basta olhar para o exemplo do nosso vizinho, a Argentina, que, com 40 milhões de habitantes, tomou as providências sensatas e chegou a 5 mil mortos em agosto, enquanto o Brasil, com mais de 200 milhões de pessoas, acumula quase 110 mil óbitos.
Mesmo se a gente considerar a proporcionalidade decorrente do fato de o Brasil ter cinco vezes mais gente, salta aos olhos a disparidade da situação dos dois países. E, antes mesmo do coronavírus, a Argentina já enfrentava uma grave recessão econômica.
Quer dizer, a gestão da crise de saúde faz a diferença. Se não forem tomadas providências, o Brasil baterá novos recordes de mortes, alertam os cientistas. A ignorância é uma tragédia maior do que a pandemia. Use a máscara, proteja a si mesmo e aos outros.
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