Lições de Burle
Cada vez mais a obra e a figura de Burle Marx tornam-se dramaticamente atuais. Enquanto as queimadas da Mata Atlântica e da Floresta Amazônica avançam, os nossos governantes optam por um ardil de avestruz: querem esconder o óbvio.
Em vez de tomar providências efetivas para barrar a devastação, querem comprar equipamentos de aferição para competir com o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). Por isso, neste momento de trevas, temos de voltar muitas vezes a Burle Marx para aprender as lições de um mestre da natureza.
Ele é reconhecido na condição de mais importante paisagista do século 20. Em depoimento ao Senado Federal, disse em 1976: “A vegetação autóctone está sendo devastada a passos de gigante. Uma simples máquina de fazer estradas destrói em minutos o trabalho de séculos da natureza. E o pior é que arrasam para plantar depois árvores que não têm nada a ver com a paisagem”.
É uma pena que lhe tenha sido concedida a oportunidade de executar um plano paisagístico completo para Brasília. Mesmo assim, ele deixou a marca do seu talento no Palácio do Itamaraty, no Teatro Nacional, no Palácio da Justiça, na 308 Sul.
Em Brasília é preciso compreender o clima, não se pode modificá-lo, ensinava Burle:“Se eu construo uma cidade num lugar onde a terra abriga uma flora característica, eu não posso transformá-la em Champs Elisées ou Hyde Park. Dizer que o cerrado não pode ser uma maravilha é um erro. Acho-o uma beleza, apenas deve-se compreendê-lo como ele é”.
Em 1976, Burle viajou de carro por Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo. Ficou estarrecido com a magnitude do desmatamento ao longo de 4 mil quilômetros para retirada das árvores de valor comercial. Com isso, a fauna também é exterminada. Naquela época, ele já previa uma drástica mudança climática, a erosão do solo, com grande perda de nossos mananciais e calcinação da camada fértil da terra. Uma marcha para desertificação inapelável.
Depois dessa viagem, Burle concedeu uma entrevista à revista Veja, que parece uma mensagem do outro lado da vida para os nossos governantes, falsos patriotas, ignorantes, tolos, falastrões covardes que destroem as riquezas naturais do país e empobrecem as próximas gerações: “Creio que é tempo de o Brasil aprender a amar a natureza — as florestas, os rios, os lagos, os bichos, os pássaros”, disse Burle. “Creio que é preciso reformular nosso conceito de patriotismo. Patriotismo, para mim, é proteger o nosso patrimônio. Artístico, cultural, e a terra, que nos dá tudo isso”.
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