O poder das abelhas

Responsáveis pela polinização da maioria da flora do cerrado, esses insetos nativos correm risco de extinção. Conheça apicultores que manipulam e resgatam colmeias que ajudam a preservar a natureza

Correio Braziliense
postado em 20/09/2020 22:28 / atualizado em 20/09/2020 22:30
 (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press                          )
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press )

Com a chegada da primavera, as abelhas tomam conta da capital federal. É nesta época do ano que começamos a observar com mais frequência a locomoção dos enxames, em casas, postes, pelas cidades e áreas rurais. Mas, é importante ter consciência dos perigos resultantes do contato com elas. Para manipulá-las ou retirá-las de algum local, é preciso contar com ajuda especializada e, neste caso, nada melhor do que um apicultor, como Adão Batista da Silva, 41 anos, que atua na área de criação e tratamento de abelhas, com extração de produtos provenientes desse inseto.

Além de manter o próprio apiário — Puro Mel —, próximo a Sobradinho, onde cria abelhas da espécie Apis mellifera, conhecida como abelha-europeia, Adão cultiva em casa espécies do inseto sem ferrão, que são nativas do Brasil. O apicultor trabalha, também, realizando os mais diversos resgates de abelhas. Os enxames resgatados são cuidadosamente manejados, ambientados em uma espécie de quarentena para adaptação, e, aos poucos, uma nova colmeia se prepara para produzir o mel.

“Cultivar e criar abelha não é só pegar e colocar numa caixa qualquer. Uma vez que você a retira da natureza, de uma árvore caída, ou mesmo de uma residência, você coloca em uma caixa específica, chamada de langstroth, que contém quadras em que são colocadas e levadas para o apiário. Lá, será feita a alimentação energética e proteica para manter o enxame forte, além de fazer troca de cera todo o ano nas épocas certas, para que o enxame proporcione uma boa rentabilidade de mel. Tudo isso tem um período certo para ser feito, que é agora, durante a primavera”, explica o apicultor.

Adão explica que a história com as abelhas começou há três anos, quando decidiu plantar pimenta importada. “Quando plantava, a flor nascia, murchava e caía. Não vingava. Ao pesquisar, vi que isso se tratava de falta de polinização. Comprei a primeira caixinha de abelha, a abelha-mirim, pela internet. Coloquei em casa e, na primeira semana, começou a nascer pimenta”, lembra. “Eu fiquei abismado com aquilo, achei muito interessante, e comecei a criar abelha sem ferrão, como jataí, mandaguari. Depois desse tempo, conheci um amigo que trabalhava com apicultura, e ele me convidou a trabalhar com ele. Gostei, fiz o curso e, com o certificado em mãos, a decisão tomou uma proporção muito bacana”, conta.

Mas, nem tudo são flores. O trabalho acumulou muitas histórias, algumas delas doloridas. “Eu cheguei a levar de 86 a 89 ferroadas. O fundamental é ter os equipamentos de proteção individual (EPIs), principalmente com abelhas que têm ferrão. Se você trabalhar sem luva, bota, ou tênis, é certo: vai tomar ferroada.”

O trabalho de multiplicação das espécies é algo que Adão incentiva na produção. “Hoje, eu cultivo abelha sem ferrão, da espécie mandaçaia. Ela é nativa do Centro-Oeste, mas, devido a tanta devastação, dificilmente você encontra ninhos naturais”, explica. A Associação de Meliponicultores (AMeDF) incentiva a criação racional de abelhas sem ferrão. Criado em junho, o grupo conta com 180 integrantes que buscam fazer o trabalho de enriquecimento do meio ambiente.

Nativas

“Elas (mandaçaias) estavam no nosso país quando foi descoberto e eram criadas pelos índios para o consumo do mel. Hoje, praticamente não existem, devido ao desmatamento e queimadas”, afirma o presidente da Associação Apícola do Distrito Federal (Api-DF), Carlos Alberto Bastos. Segundo ele, estas espécies de abelhas são inofensivas, e não têm defesa contra a ação do homem.

“A criação destas abelhas nativas é de fundamental importância para a preservação da espécie, elas são polinizadores da nossa mata, do nosso bioma. Quem poliniza muitos dos frutos do cerrado são esses insetos, devido ao seu tamanho, que permite que polinize certos tipos de frutos que outras espécies não conseguem”, ressalta Carlos. “O meliponicultor, sendo guardião dessas abelhas, poderá, no futuro, inseri-las novamente na natureza, em áreas preservadas. Sendo assim, hoje deveria haver mais incentivo ao meliponicultor”, pondera o presidente.

Novas colônias

As abelhas produzem enxames devido ao seu instinto reprodutor e, com a chegada da primavera —o período de procriação desses insetos — aumenta a quantidade de colmeias. É o que explica o professor Antônio Aguiar, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade de Brasília (UnB). “As abelhas são responsáveis pela reprodução das plantas, que dependem dos vetores para levar o seu pólen para outras. Sendo assim, para a sobrevivência da espécie é necessário que haja transferência do pólen, e as abelhas são responsáveis por isso. Elas são fundamentais para reprodução de todas essas plantas que vão iniciar o processo de floração”, ressalta.

De acordo com o professor, 90% das plantas reproduzem por intermédio das abelhas. “Agora, no início da primavera, vamos ter um aumento da floração, mas existe, também, um aumento das atividades, principalmente das abelhas sociais, que vão visitar as flores”, afirma. “Da mesma forma que os cupins vão liberar os seus machos e terão revoadas, a chegada da primavera traz isso para as abelhas, que começarão a ter um acúmulo de recursos, como néctar e pólen”, completa.

Segundo o especialista, há, aproximadamente, 500 espécies de abelhas no cerrado, que se dividem entre ambientes urbano; a zona rural, com áreas mistas e nativas; e as áreas naturais, que são parques e unidades de conservação. “Nas áreas urbanas, vamos ter uma quantidade de abelhas relativamente baixa. As ocorrências são de abelhas sociais sem ferrão, como jataí, mandaçaia, mandaguari. São abelhas muito dóceis e tranquilas. Já nas áreas agrícolas, mistas e naturais, teremos uma infinidade”, explica.

Com o surgimento de novas espécies e colônias durante a primavera, o professor adverte quanto aos cuidados que a população deve ter ao reconhecer ninhos próximos às residências. “No caso de abelhas Apis mellifera, conhecidas como abelhas europeias, o sugerido é sempre contatar profissionais que façam a retirada desses ninhos para levá-los até apiários”, ressalta. No caso de destruição de ninhos de abelhas nativas, a Lei nº 9.605/98 considera crime ambiental. “O ninho de abelha nativa não oferece perigo, elas são extremamente inofensivas. É bom sempre entrar em contato com órgãos ambientais para verificar a possibilidade de retirada.”

*Estagiária sob a supervisão de José Carlos Vieira


Serviço

Puro Mel: produtos naturais Para fazer encomendas, entre em contato pelo número (61) 99332-0965 ou acesse a página no instagram @puromel.sobradinho1.df


Você sabia?

O DF abriga cerca de 1.300 apicultores

Possui cerca de 50 apiários

No Entorno, a média é de 300 apiários

Cerca de 500 espécies de abelhas vivem no DF

*Dados: Associação Apícola do Distrito Federal (Api- DF)


Serviço

Puro Mel: produtos naturais
Para fazer encomendas, entre em contato pelo número (61) 99332-0965 ou acesse a página no instagram @puromel.sobradinho1.df

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Cuidado com elas!

Essenciais para a polinização e para a manutenção do ecossistema, as abelhas possuem um complexo sistema de defesa. Sozinhas, elas parecem inofensivas, mas, em enxame, podem causar grandes lesões em seres humanos e animais, e até levar à morte. E nesta época da primavera e verão é quando os acidentes aumentam mais.
Segundo a subtenente do Corpo de Bombeiros Militar do DF (CBMDF) Walesca Santa Cruz, o ataque de abelhas acontece sempre em duas situações: durante o processo de migração do enxame, quando as abelhas procuram um local para instalação do novo ninho. “Nesse processo, as abelhas ficam muito agressivas, pois tentam proteger a rainha”, afirma. A segunda possibilidade é quando o enxame está com muito mel e a colmeia é invadida por outros insetos ou pessoas que tentam retirar o doce, fazendo com que as abelhas fiquem em estado de alerta constante.
Caso o ataque ocorra durante o processo migratório, Walesca alerta que as pessoas devem procurar um local fechado para abrigo, além de não realizarem movimentos bruscos ou se abanarem com roupas. “Evite matar as abelhas, pois toda vez que uma abelha é morta, ela libera feromônios que fazem com que outras abelhas fiquem extremamente agressivas”, ressalta. Caso aconteça quando a colmeia estiver com muito alimento, as pessoas devem se afastar. “Em geral, as abelhas que protegem a colmeia e não se distanciam muito da mesma”, afirma a subtenente.
Caso o cidadão esteja com problemas em casa, o CBMDF aconselha que solicite uma equipe dos Bombeiros, pelo número 193, para fazer uma avaliação. “Nunca tente exterminar o enxame, pois a quantidade de abelhas que existe dentro da colmeia é aproximadamente 10 vezes maior do que as que estão pelo lado de fora”, explica Waleska. Feita a averiguação, a equipe decide pela retirada da colmeia do local, e entra em contato com apicultores, a fim de conduzi-las para um apiário. “Caso a colmeia esteja oferecendo risco e a captura for inviável, a equipe realiza o extermínio do enxame, sempre no período noturno, momento em que todas as abelhas estarão na colmeia e quando elas estão menos agressivas”, completa Walesca.

Tags

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação