ASA NORTE

Vândalos destroem a primeira rotatória do Cerrado de Brasília

Pioneiro no DF, projeto paisagístico com plantas exclusivamente da savana brasileira foi criado em fevereiro no balão da 210/211 Norte. As espécies começariam a florescer com a chegada das chuvas

Adriana Bernardes
postado em 04/10/2020 22:24 / atualizado em 05/10/2020 00:23
 (crédito: Amalia Robredo/Divulgação - Dani Azul/Divulgação)
(crédito: Amalia Robredo/Divulgação - Dani Azul/Divulgação)

Nascidos em Brasília ou recém-chegados à cidade sabem do apreço da população pelas rotatórias da capital. Em qualquer estação do ano, elas estão sempre floridas. O que pouca gente sabe é que, neste 2020, a capital ganhou rotatória com plantas 100% nativas do Cerrado, um projeto inédito mas que não teve a chance de florescer.

As espécies nativas da savana brasileira foram plantadas na primeira quinzena de fevereiro na rotatória da 210/211 Norte. Na última quinta-feira (1/10), os idealizadores do projeto estiveram no local para fazer a manutenção. “Com a chegada da chuva, estávamos com a expectativa da floração das espécies. Então, veríamos, pela primeira vez, o paisagismo com plantas 100% do cerrado em sua plenitude”, relata a arquiteta e paisagista, Mariana Siqueira.

No entanto, naquele mesmo dia à noite, se depararam com o local depredado. “O professor Julio Pastore, da Faculdade de Agronomia e Veterinária da UnB passou por lá e viu todas as plantas arrancadas. Ele me ligou muito abalado. Só deixaram as gramíneas. As espécies que floresceriam agora, estão destruídas”, relata Mariana.

Apesar da tristeza, os autores e apoiadores da proposta começaram, ainda no sábado (3/10), o cultivo das espécies em laboratório. Eles esperam fazer o replantio em no máximo três meses. Neste domingo (4/10), Mariana fez um boletim de ocorrência. “Não sabemos se as plantas foram arrancadas por alguém querendo ajudar, talvez pensando que fosse mato, ou se por pessoas que discordam da proposta”, lamenta.

Semente lançada

A semente do projeto de paisagismo só com plantas do Cerrado, foi lançada pela arquiteta e paisagista, Mariana Siqueira. Ela conta que, ao chegar à capital em 2014, vinda de São Paulo, imaginou que teria à disposição diferentes espécies da savana brasileira para compor seus projetos. “Mas não encontrava em lugar lugar algum para comprar. Nos viveiros, diziam que era uma dificuldade técnica, que não era possível reproduzir. Então, comecei a fazer experiências e vi que era, sim, possível”, relata. (Leia entrevista completa abaixo).

Ao lado do professor Julio Pastore, da Universidade de Brasília e da paisagista argentina Amalia Robredo, surgiu o projeto do Jardim Piloto. A Roman Filmes e Jardins de Cerrado, gostou da ideia e decidiu documentar a proposta em vídeo. E a ideia foi ganhando parceiros: Rede de Sementes do Cerrado, do Laboratório de Paisagismo da Faculdade de Agronomia e Veterinária da UnB, do Estúdio Amalia Robredo, Claudomiro de Almeida Cortes (Associação Cerrado de Pé), das prefeituras das SQN 210 211 410 e 411, da Secretaria de Projetos Especiais e da Administração do Plano Piloto (ambas do Governo do Distrito Federal). Agora, é dar tempo ao tempo até que as mudas se desenvolvam e possam ser plantadas no local. 

Três perguntas para

Mariana Siqueira, arquiteta a paisagista

Por que você defende o paisagismo urbano com espécies que vão além das árvores do Cerrado?

Por que as árvores são apenas um dos componentes da flora e nem é o mais importante. O mais importante é o estrato herbáceo arbustivo, quem vem a ser um conjunto de capins, ervas e arbustos, plantas rasteiras ou baixinhas. É a convivência desse estrato herbáceo que, junto com as árvores, forma a savana.

O que você busca ao defender elementos do Cerrado no paisagismo da cidade?

Ao criar os meus projetos de jardins do Cerrado busco duas coisas: difundir que é possível cultivar e fazer projetos com representação da flora através dos jardins e aproximar o público urbano dos valores estéticos e ecológicos da paisagem do Cerrado. No primeiro momento, ouvi de todo mundo que era impossível. Rapidamente provei não ser. Não há limitação técnica para o cultivo dessas plantas, mas, falta de interesse cultural.

No grupo de idealizadores, tem uma paisagista argentina e você disse que ela é sua grande mentora. Pode falar um pouco mais sobre ela?

Amélia Robredo é minha mentora para esse tipo de paisagismo, chamado naturalista. Ele consiste em usar o maior número possível de espécies nativas, o mais natural possível, quase selvagem. A vantagem das plantas nativas, é que elas são adaptadas para a variação de chuva e seca. Com isso, economiza-se o recurso hídrico com a rega e elas não dependem tanto de adubação. Para você ter uma ideia, fizemos a análise do solo do balão entre de plantar. Ele estava tão rico em nutrientes que trocamos uma camada de 40 cm de terra para não intoxicar as mudas do Cerrado.

  • As espécies nativas da savana brasileira foram plantadas na primeira quinzena de fevereiro na rotatória da 210/211 Norte
    As espécies nativas da savana brasileira foram plantadas na primeira quinzena de fevereiro na rotatória da 210/211 Norte Reprodução Amalia Robredo
  • O projeto foi chamado de Jardim Piloto
    O projeto foi chamado de Jardim Piloto Reprodução Amalia Robredo
  • À época a proposta foi documentada pela  Roman Filmes e Jardins de Cerrado
    À época a proposta foi documentada pela Roman Filmes e Jardins de Cerrado Reprodução Amalia Robredo
  • A semente do projeto de paisagismo só com plantas do Cerrado, foi lançada pela arquiteta e paisagista, Mariana Siqueira
    A semente do projeto de paisagismo só com plantas do Cerrado, foi lançada pela arquiteta e paisagista, Mariana Siqueira Reprodução Amalia Robredo

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