Dia das Crianças

Crônica da Cidade

Severino Francisco
postado em 12/10/2020 22:03

Como é fácil fazer uma criança feliz. Basta juntá-la com outras crianças e inventar uma brincadeira. Ontem, no Dia das Crianças, desaposentamos uma antiga piscininha, compramos uma bomba para enchê-la, e os dois netos, Aurora, de 7 anos, e Judá, de 3, fizeram a festa. Aurora é um personagem conhecido da coluna. Por isso, hoje, falarei mais do Judá. Ele representará todas as crianças.

A avó afirma que Aurora veio da academia de dança celeste; e Judá veio de uma caverna celestial. Ela caminha com passos de bailarina; ele parece um lutador de MMA. Quando crescer um pouco, vou matriculá-lo em uma boa academia de artes marciais para aprender a ter disciplina, a defender-se, a controlar a força, a saber ganhar e saber perder, a cair e a levantar.

Judá é muito sociável, desde muito pequenino gosta de participar. Ouvia uma piada ou blague em uma roda de conversa à mesa e, quando todos riam, caía na gargalhada, como se estivesse entendendo tudo. Ele é do signo de câncer, das pessoas afetuosas, intimistas, manhosas e familiais.

É encantador, mas, ao mesmo tempo, terrível. Parece um daqueles personagens dos Irmãos Metralha, toca o terror e se diverte, com cara e jeito de anjo. Certo dia, a mãe entrou em desespero, chorou lágrimas de esguicho, diria Nelson Rodrigues, e desabafou: “Não é possível, você não me ama”. Pois esse se tornou o mote para o Judá defender-se quando apronta.

Ele é muito voluntarioso, tem iniciativa e não deixa nada para depois. Se quer um biscoito, não faz como a irmã, que pede: “Por favor, será que poderia me trazer um biscoito?” Não, ele improvisa uma escada com duas cadeiras empilhadas, perigosamente, e escala o alto do armário ou da geladeira para pegar o biscoito, o sorvete ou o iogurte.

Tem um senso de identidade e de dignidade muito forte. Quando alguém diz: “Você é um moleque terrível”, ele responde: “Não sou um moleque terrível, eu sou o Judá”. Sempre está aprontando. Mas, quando leva bronca, fica muito sentido e repete a frase inapelável: “Você não me ama...”

No fundo, essa é uma grande questão da vida: quem nos ama e quem não nos ama. Mas, ensinamos a ele: “Porque a gente te ama, a gente te dá bronca quando você faz besteira.” Quem ama, ensina limites.

Para mim, Aurora e Judá representam todas as crianças. Eles trazem esperança de renovação e impõem o compromisso com a vida. Depois que eles nasceram, mais do que nunca, acho que, nós, os adultos, temos de lutar em defesa das florestas, da redução das desigualdades sociais, da educação e da cultura.

As excelências do Congresso Nacional, os governantes, o Ministério Público, a imprensa e a sociedade civil precisam acordar. Que mundo deixaremos para as nossas crianças? Enquanto isso, faço minhas as palavras do Krysto Negro, personagem do filme A Idade da Terra, de Glauber Rocha, interpretado por Antonio Pitanga, que berra no meio do cerrado bravo de Brasília para ninguém: “Acorda, humanidade! Acorda, humanidade!”

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