Em tempos de conectividade e de transformação digital, as pessoas não precisam mais esperar um documento chegar pela caixa do correio ou imprimir um papel para assinar, digitalizar e enviar a correspondência. Todo esse processo foi facilmente eliminado com o uso, cada vez mais frequente, de contratos e assinaturas digitalizadas. Na pandemia, a prática aumentou. Com restrições para sair de casa, a necessidade de fechar negócios não pôde parar, e muitos consumidores — com o intuito de resguardar a saúde — recorreram às praticidades dos contratos eletrônicos.
Apesar das facilidades, muitos empresários e consumidores têm dúvidas quanto à validade jurídica deste tipo de documento. É o caso do aposentado José Antônio Filgueira, 63 anos, que precisou assinar contratos recentemente sem poder sair de casa. “Eu faço parte do grupo de risco devido a algumas doenças cardíacas, e precisei me resguardar mais ainda. Mas a vida não pode parar, precisei resolver algumas situações que demandavam minha assinatura”, lembra.
José Antônio diz que, apesar das tecnologias aumentarem cada vez mais, ainda é “das antigas”. “Prefiro métodos mais convencionais, mas precisei recorrer a essas atualidades nesse momento. Sou muito desconfiado, não sei se esses documentos têm credibilidade. Como sou mais velho, algumas pessoas acham que é mais fácil passar a perna na gente. Precisei ficar atento, recorri ao meu advogado e solicitei ajuda. Só depois disso tive a suficiente confiança para assinar”, conta.
Além de José, o processo de assinatura virtual causa desconfiança em muitas pessoas. A advogada especialista em direito do consumidor Ildecer Amorim explica que a Medida Provisória nº 2.200-2, de 2001, garante a autenticidade, integridade e validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras.
Nesse sentido, Ildecer afirma que é permitida a assinatura digital de documentos particulares ou públicos, mediante um certificado que assegura a sua autenticidade e integridade. “Isto é, garante a validade do documento, uma vez que é impossibilitada a alteração por terceiros. Assim, sendo possível a certificação de que o documento foi enviado pela pessoa que o assina e que não houve alterações no seu conteúdo, atribui-se à assinatura digital o mesmo valor da assinatura manuscrita”, afirma a especialista.
Verificação
De acordo com a especialista, esse tipo de dispositivo legal oferece aos cidadãos os direitos de verem as assinaturas digitais serem reconhecidas, facilitando o trâmite de documentos, mas impõe deveres a todos de acolher as firmas eletrônicas. “Sendo assim, o receptor do documento com a assinatura digital deve possuir meios de verificar sua validade. Algo que é facilmente obtido por dispositivos eletrônicos como computadores, notebooks, smartphones, etc”, diz. Ildecer explica que não há complexidade no procedimento de verificação de autenticidade de assinaturas eletrônicas. O necessário resume-se a um aparelho celular com internet.
A discussão acerca da veracidade dos contratos eletrônicos ainda é grande, conforme explica o advogado especialista em direito do consumidor Rafael Brasil. “Isso ocorre por não haver uma previsão específica em lei que diga de que maneira esse contrato deve ser reconhecido. No entanto, a realização do contrato eletrônico não tem nenhuma diferença em relação ao contrato físico — as partes devem ser capazes, o objeto deve ser lícito, a forma não pode ser proibida por lei e a vontade das partes deve ser livre”, afirma.
Caso o contrato não seja assinado de modo seguro, pode haver questionamentos. “Por isso, sempre é indicado que o contrato seja firmado por meio de uma assinatura digital, com o protocolo da Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil). A assinatura digital já é reconhecida como válida pelo Código de Processo Civil, portanto, é o modo mais seguro de assinatura de um contrato eletrônico”, garante Rafael.
Atualmente, sites já permitem que as pessoas assinem com um clique, sem haver obrigatoriedade da assinatura digital. Nestes casos, Rafael diz que os fornecedores devem investir em mecanismos que garantam a segurança aos consumidores, justamente porque um simples aceite pode não configurar a adesão ao contrato. “O ideal é que todas as informações acerca daquele negócio estejam evidentes e que o consumidor dê o aceite em cada cláusula do contrato assinado, demonstrando, assim, que deu ciência a todas as condições impostas”, explica o especialista.
Cuidados
Para evitar frustrações futuras, é importante que os consumidores estejam atentos. Rafael pede que realizem uma leitura cuidadosa dos contratos antes de assiná-los digitalmente. “Por ser mais fácil dar um clique do que assinar em um papel, muitos consumidores agem por impulso. Uma forma de se evitar isso é pesquisar bem sobre o fornecedor, se é de confiança ou não, se há muitas reclamações sobre aquele mesmo produto ou empresa”, adverte. “Além disso, os fornecedores devem disponibilizar de maneira clara todas as disposições do contrato — como prazo, forma de pagamento e características do produto ou serviço, bem como sobre os dados da empresa”, completa o advogado Rafael Brasil.
As recomendações são as mesmas quando o contrato é feito de modo físico. “As partes devem agir de boa-fé, sem o intuito de lesar o outro contratante. O que deve prevalecer sempre nos contratos é o bom senso: as partes devem entender que são, na verdade, parceiros na celebração de um negócio, e não são inimigos. Deve prevalecer o dever da cooperação mútua e da transparência sobre o negócio realizado”, diz o especialista.
Os contratos de consumo celebrados virtualmente têm a prerrogativa do direito de arrependimento, conforme explica Rafael. “Por isso, caso o consumidor se sinta arrependido ou perceba que se enganou acerca daquela contratação, ele tem o prazo de sete dias, a contar do recebimento do produto ou serviço, para pedir o cancelamento do contrato sem qualquer ônus”, ressalta o advogado. Além disso, caso o consumidor perceba ser vítima de algum erro na relação de consumo, deve procurar o Instituto de Defesa do Consumidor (Procon) ou acionar um advogado de confiança”.
A quem recorrer
Caso parte dos envolvidos não admita envolvimento do instrumento contratual em forma eletrônica, é importante que os contratantes produzam o maior número de provas possíveis. “O contrato assinado, seja físico ou virtual, é apenas a materialização das vontades das partes naquele negócio. Mas, ainda que o contrato não seja assinado, o negócio continua existindo e, por isso, segue tendo validade. Por isso, sempre é importante ter testemunhas quando um contrato for celebrado, para que mais pessoas possam atestar as condições impostas naquele contexto”, ressalta Rafael.
* Estagiária sob a supervisão de Adson Boaventura
Marceneiro autônomo
Serviço inacabado
Nara de Deus
Guará
A assistente social Nara de Deus entrou em contato com a coluna Grita do Consumidor para reclamar de um serviço de marcenaria inacabado. “Estou com o armário da cozinha caindo, sem portas e gavetas. Já fiz o pagamento de todo o serviço, no entanto, o marceneiro não concluiu o que foi combinado. Na próxima semana, fará 1 ano e 3 meses que não consigo ter minha cozinha concluída. Eu liguei para ele 128 vezes e ele não me atendeu. Ele responde no WhatsApp, diz que vai terminar o serviço, mas nada é feito. Caso contratasse outro profissional para arrumar, o prejuízo seria de R$ 12 mil”, afirma.
Resposta da empresa
O Correio entrou em contato com o marceneiro Alexandre Lima, que afirmou que trabalha com a cliente há muito tempo e que já fez alguns reparos. “Já deixamos agendado tudo pra semana que vem. A nossa empresa está no mercado há bastante tempo e nunca tivemos problema algum. A nossa intenção é fazer o melhor para o cliente”, informou.
Resposta do consumidor
“Na verdade, ele fala a mesma coisa há 1 ano e 3 meses. Então, nem posso dizer se isso ele realmente fará o serviço. Espero que sim”, declara.
NET TV/ Claro
Canais bloqueados
Sarah Batista
Núcleo Bandeirante
A moradora do Núcleo Bandeirante recorreu à coluna Grita do Consumidor para reclamar que paga por um serviço que não está usando. “Assinei a Net TV/Claro para os serviços de internet e de tevê por assinatura. Assinei um pacote que me dá acesso a 243 canais, contudo, desde a instalação, diversos canais prosseguem fechados, e vou ser cobrada por um serviço pelo qual não tive acesso. Entrei em contato com a empresa, inclusive falei com a responsável por me vender o serviço, logo após identificar o problema. Obtive o retorno de que tudo seria solucionado ‘rapidamente’, em 26 de setembro. Contudo, até hoje, nada foi resolvido e sequer fui procurada pela empresa”, reclama.
Resposta da empresa
A Claro informou que contatou a senhora Sarah Batista e realizou os ajustes necessários. “A Claro continua à disposição por meio de todos os canais de atendimento disponibilizados”, conclui.
Resposta do consumidor
“No momento da compra, a vendedora da empresa informou que o pacote que estava adquirindo, de tevê por assinatura, oferecia canais que na realidade não integravam a grade que eu escolhi. Apesar da demora e pelo erro cometido, a empresa realizou uma negociação oferecendo 12 meses com a grade de canais desejada, sem alteração do valor. A negociação me deixou satisfeita”, comemora.
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