Crônica da Cidade

(cartas: SIG, Quadra 2, Lote 340 / CEP 70.610-901)

Precisamos rejuvenescer

“Você não sente, não vê
Mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo
Que uma nova mudança em breve vai acontecer
O que há algum tempo era novo, jovem
Hoje é antigo
E precisamos todos rejuvenescer”

Espero que tenha aproveitado o refrão de Velha roupa colorida e cantado junto, com a empolgação de Elis Regina ou mesmo com o tom mais melancólico da versão do compositor, Belchior.

Parece contraditório citar, em 2020, uma canção dos anos 1970 que tratava justamente da necessidade de rejuvenescer e deixar o passado para trás, como roupa velha que não serve mais.

Mas é para isso que servem os clássicos, a arte, a cultura. Transcender o tempo e nos mostrar tanto a nossa insignificância quanto as marcas indeléveis que somos capazes de deixar.

Falo de Elis com frequência porque a voz da pimentinha lembra os bons momentos da infância, os aprendizados da adolescência e traz fascinação na vida adulta. Não sei que surpresas as novas fases guardam, mas certamente haverá uma música interpretada por ela para embalar a trilha sonora da vida.

A potência da cantora me lembra, em certa medida, a de Clarice Lispector, escritora que também admiro. As entrevistas concedidas pelas duas à TV Cultura mostram inquietações semelhantes de almas criativas. Sempre em busca de novas roupas e impregnadas das memórias de passados vividos.

Os novos tempos nos obrigam a operar revoluções diárias. Pedem mudanças à revelia de qualquer zona de conforto. E elas definitivamente viveram fora desses espaços. Seja nos versos interpretados com ardor, seja nas crônicas, contos e romances datilografados na máquina de escrever.

É nessas horas que os clássicos ensinam. Enquanto tudo isso não passa, talvez seja a hora de renovar o guarda-roupa e descartar tudo o que não serve mais.

“No presente, a mente, o corpo é diferente
E o passado é uma roupa que não nos serve mais”