Crônica da Cidade

O caso Robinho

“É aviltante a forma como esses jogadores de futebol têm tratado as mulheres. Você fala mal de sertanejo e funk, mas nunca criticou a forma como esses homens tratam as mulheres porque têm fama e poder vindo desse esporte que é o símbolo do país. São esses os nossos heróis?”, indaga autora do e-mail.

E continua: “Olhe o exemplo dos atletas americanos nas manifestações nos EUA contra o racismo, correndo risco de perder patrocínio, mas indo para as ruas por algum idealismo... E por aqui? As notícias dos jogadores envolvem somente orgias, estupros, infrações à Lei Maria da Penha, pensão alimentícia... E eles são exemplos para milhares de jovens. Você deveria escrever sobre isso”.

Recebi essa mensagem da minha filha, Isabel, professora, estudante de direito e mestranda. Ela se refere à acusação da justiça italiana de que o jogador Robinho teria participado de um estupro coletivo com amigos a uma jovem albanesa em Milão, em 2013.

O tema já estava em mira, e, depois desse bilhete, tornou-se imperativo. O nível do futebol brasileiro despencou, não apenas dentro de campo, mas também fora dele. A maioria dos jogadores vive na bolha das redes sociais em um estado de alienação monstruosa.

A Copa do Mundo de 2014 escancarou a decadência futebolística, educacional e moral do futebol brasileiro. Segundo Tostão, o 7 x 1 humilhante que levamos da Alemanha teria sido castigo divino contra a corrupção. Mas talvez fosse possível acrescentar: e contra a mediocrização também.

É claro que o futebol não é um retiro de santos, ele reflete as condições sociais, o nível de educação e os valores da sociedade brasileira. Mas temos exemplos em que mirar: Tostão, Gérson Canhotinha, Zico, Sócrates, Casagrande, Leonardo e Raí. Enquanto isso, a maioria dos jogadores atuais vive na bolha da internet e só usa as redes sociais para mostrar o relógio que comprou, o novo penteado e outras frivolidades.

Não utilizam o enorme poder de influência que têm para protestar e conscientizar contra o desmatamento delituoso de nossas florestas, que afetará as próximas gerações e o futuro do planeta. Como disse Glauber Rocha, no Brasil os jogadores de futebol têm uma bola de capotão na cabeça, se fizer um furo, só sai vento. Nada viram do movimento dos jogadores de basquete da NBA para defender as vidas negras.

Segundo a Justiça italiana, as conversas extraídas de escutas telefônicas de Robinho e seus amigos são autoincriminatórias: “Estou rindo e nem aí porque ela estava bêbada, não sabe nem o que aconteceu”.

E as declarações de Robinho à imprensa só confirmam o descaso com a mulher vítima de um ato covarde. Ele culpou o feminismo e a Rede Globo, que apenas transcreveu conversas gravadas pela justiça italiana.

Ainda bem que existe feminismo para defender as mulheres, o movimento antirracista para defender os negros, o movimento ambientalista para defender as florestas e o jornalismo para apurar os fatos. É santa a indignação contra a barbárie normalizada.

 


A17-CID-2010