A vida dá várias dicas de que uma nova fase se aproxima. Os ciclos se completam e vamos nos moldando, ao sabor das ondas do tempo. E ele é implacável. Noticiar a morte do pai de uma amiga foi um desses alertas para mim. Um renascimento, uma cicatriz a mais no peito, um mergulho profundo para puxar o ar a plenos pulmões na subida à superfície.
Renato Souza, o comandante da Polícia Civil do Distrito Federal que morreu defendendo um de nossos maiores patrimônios, era um ser humano vibrante. Ele transparecia uma serenidade cativante. Era daqueles pais descolados, divertido e companheiro. Tudo isso poderia contrastar com a rigidez e a disciplina que o trabalho exigia, mas, na verdade, se combinava em uma sinergia única, que quem o conheceu deve se lembrar.
A história é digna de super-herói. E é assim que ele ficará guardado na memória da filha e de tantos que passaram pelo seu caminho. Apaixonado por mergulho, deixou avisado que se morresse fazendo isso ou em atuação profissional, morreria feliz. Já havia cumprido o tempo necessário para se aposentar, mas decidiu continuar na ativa. Venceu a covid-19 e, cedido à Força Nacional, foi ao Pantanal atuar no combate ao incêndio que devasta o bioma.
Antes disso, também trabalhou nas buscas em Brumadinho (MG), após o rompimento da barragem. O cansaço pesava sobre o corpo e a vontade de voltar para casa, também. Mas sempre recebia cartas dos filhos de vítimas do desastre desaparecidas, emocionava-se e ganhava forças para continuar. Trabalhou à exaustão para salvar quem pudesse da lama que encobriu o município. Os 55 anos de vida certamente foram pouco e a saudade será proporcional ao legado que ele deixou.
Outro super-herói, dessa vez dos cinemas, partiu na última semana. O sessentão Pierce Brosnan interpretou o 007 da minha geração, e eu adorei acompanhar toda a saga. Cada estreia vinha acompanhada de enorme expectativa. Mas Sir Sean Connery é, sem dúvidas, o eterno Bond. James Bond. O escocês tinha classe, jeito de galã e voz inebriante. Crescer assistindo à atuação dele em outros clássicos, como Intocáveis e Indiana Jones, dava aquele gostinho de conhecer super-heróis da vida real. E Renato provou que eles podem existir.
O tempo é implacável, mas também generoso. Brindou a todos nós com os momentos ao lado desses dois gigantes. Sigam em paz.
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