ECONOMIA

Pandemia aumenta o peso do aluguel no bolso do brasiliense

Brasilienses sentem no bolso o reajuste baseado no IGP-M, que, no acumulado de 2020, ficou em 23,14%. Dificuldade em arcar com mais um aumento é sentida por muitos. Especialistas alertam para a cobrança excessiva e dão dicas de como negociar valores mais baixos

Os inquilinos brasilienses levaram um susto na hora de renegociar o aluguel ou procurar um imóvel no Distrito Federal. Isso porque o Índice Geral de Preços-Mercado (IGP-M), indexador que reajusta os contratos, teve alta de 23,14%, no acumulado de 2020. Com a economia afetada pela pandemia do novo coronavírus, a dificuldade em arcar com mais um aumento é sentida por muitos.

Esse é o caso do advogado Nauê Bernardo de Azevedo, 31 anos. Ele ficou preocupado durante a renovação do contrato do apartamento em que mora sozinho, na Asa Sul. “O grande problema de aplicar, de forma direta, um ajuste de 23% é que, no meu caso, por exemplo, o meu orçamento não subiu desse mesmo jeito. Aplicar um índice desse tamanho causa um buraco nas minhas contas”, afirma.

Na avaliação do Nauê, o momento não é adequado para aumentar os preços, já que muitas pessoas perderam o emprego por conta da pandemia. “Não houve nenhum ganho por parte dos que pagam aluguel”, reitera.

O economista Benito Salomão aponta os problemas que a alta nos aluguéis pode causar. “Quando o IGP-M vem muito acelerado, como veio em 2020, acaba impactando no preço dos alugueis, porque é o indexador automático. No entanto, há uma recessão muito forte no país, e reajustar os aluguéis com base no IGP-M de 23,14% vai comprometer ainda mais a margem de lucro de algumas empresas e contribuir para o fechamento delas, por exemplo”, explica.

Aumento abusivo

Como identificar um aumento abusivo? O advogado especialista em direito imobiliário Rodrigo Fagundes alerta sobre a questão. “Os reajustes nos aluguéis, via índice de variação de preços, visam uma recomposição de perdas causada pela inflação no Brasil. Então, o objetivo principal é devolver ao contrato o seu equilíbrio original. Se tal reajuste gerar um lucro exorbitante, o equilíbrio perseguido com a cláusula terá sido extrapolado”, reitera o advogado.

Para resolver, a primeira alternativa sempre é uma discussão conciliadora entre as partes, visando um acordo que beneficiaria ambos os lados da relação contratual, aponta o especialista. “Caso não seja possível uma composição amigável, que é sempre o primeiro caminho a ser percorrido, sugere-se, então, o ajuizamento de uma ação revisional, buscando discutir exatamente a cláusula contratual causadora do desequilíbrio entre as partes”, explica Fagundes.

Bolha imobiliária

O estudante Rodrigo Drummond, 27 anos, está à procura de um imóvel para alugar. Tendo em mente a Asa Norte, a Asa Sul ou o Guará, há um mês, ele pesquisa preços de aluguéis. Além dos valores, ele reclama da dificuldade em encontrar imobiliárias ou proprietários que aceitem métodos alternativos no lugar de fiador.

“O valor, que já era abusivo, está ainda mais alto. Brasília vive numa bolha imobiliária surreal. É um absurdo o valor cobrado por apartamentos pequenos, velhos e malcuidados, sem contar o alto valor dos condomínios”, desabafa Drummond.

O assistente administrativo Breno Nascimento, 27 anos, e a companheira, Flavia Nascimento, 24 anos, microempreendedora, moram em Sobradinho 2 e estão procurando outro imóvel na região há pelo menos dois meses. Eles também sentiram a diferença no preço. “Está muito acima da normalidade. Acredito que, por conta da pandemia, o orçamento das famílias tem diminuído, e como a demanda de aluguel sempre existe, acredito que os proprietários aproveitaram a oportunidade para cobrar um pouco mais”, diz Breno.

A decisão de mudar é devido ao reajuste do imóvel onde eles moram atualmente. “O IGP-M está em quase 24%. O meu aluguel atual foi reajustado nesse valor. Por isso, estamos procurando algo mais ‘barato’”, explica.

Dois meses de procura. Esse é o tempo que o casal Adalto Mateus, advogado, 32 anos, e a estudante Nathália Ribeiro, 27, estão pesquisando imóveis para morarem com os dois cachorros. Eles pagam menos de R$ 1.000 de aluguel em Taguatinga, mas decidiram se mudar por conta de problemas no imóvel atual. Os apartamentos pesquisados estão, pelo menos, 50% mais caros, além de serem menores e mais antigos.

Eles estão procurando na Asa Norte, Asa Sul, Cruzeiro e Sudoeste. “Os melhores estavam entre R$ 1.700 e R$ 2 mil. Com este valor, conseguimos pagar um financiamento. Então, por ora, ainda estamos procurando”, diz Adalto. “Só encontramos estilo studio. Para a gente, não daria, infelizmente”, afirma.

Negociação

Manter uma casa pode ser muito caro. Por isso, muitas pessoas estão dispostas a economizar de todas as formas. Mas, como fazer isso em um contrato de aluguel? Na avaliação do empresário e especialista em mercado imobiliário Ramon Claudino Dias, todo contrato pode ser negociável.

“Se encontrar um imóvel ideal, que atenda a suas necessidades e expectativas, busque fazer a sua proposta dentro do seu limite financeiro pessoal ou familiar. Pode ser uma carência inicial em seu contrato visando alguma benfeitoria que possivelmente fará no imóvel, e que de certo modo agregará valor ao bem do proprietário”, explica. “Se tiver a possibilidade, tente adiantar algumas parcelas do aluguel, logo no início de seu contrato. Isso, sem dúvidas, ajuda bastante”, conclui Dias.

A conta

» Com o índice dos últimos 12 meses fixado em 23,14%, para atualizar um aluguel de R$ 1.500, com vencimento em janeiro de 2021, por exemplo, basta multiplicar o valor por 1,2314 (R$ 1.500,00 X 1,2314). O resultado: R$ 1.847,10. Este passa a ser o valor que vai vigorar mensalmente até o próximo reajuste, daqui a 12 meses.

O que é o IGP-M

O IGP-M é calculado mensalmente e divulgado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV) no final de cada mês referência. O índice é o principal indexador de tarifas de serviços. Entre eles estão: internet, energia elétrica, tevê por assinatura e a correção anual dos contratos de aluguéis residenciais.