PANDEMIA

Falso Negativo: conversas de WhatsApp revelaram esquema

Na 4ª fase da Operação Falso Negativo, promotores do Gaeco e policiais do Decor cumprem 15 mandados de busca e apreensão em investigação sobre suposto favorecimento de amigo do ex-secretário de Saúde na compra de testes de covid-19

Ana Maria Campos
postado em 04/03/2021 06:00
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

A apreensão do telefone celular de um fornecedor de kits para testes de covid-19 para a Secretaria de Saúde do DF descortinou um bastidor de possível favorecimento na escolha, sem licitação, das empresas contratadas. Nas mensagens de WhatsApp do empresário baiano Matias Machado da Silva, os investigadores da Operação Falso Negativo encontraram todo o trâmite de uma parceria com um sócio oculto em Brasília, Fábio Gonçalves Campos.

O roteiro é completo. Fábio, então assessor parlamentar do deputado federal João Carlos Bacelar (PL-BA), grava uma mensagem pedindo que a empresa de Matias, seja usada para conseguir o contrato de venda de kits de detecção de contaminação pelo novo coronavírus.

Fábio não podia aparecer. Era amigo do então secretário de Saúde, Francisco Araújo Filho, padrinho de seu casamento, realizado menos de um ano antes, em julho de 2019, em cerimônia badalada no Rio de Janeiro, com a auditora federal de Finanças e Controle Renata Mesquita D’Aguiar. O evento contou com a presença de amigos do casal na política, as deputadas federais Celina Leão (PP-DF) e Iracema Portela (PP-PI), ex-mulher do senador Ciro Nogueira (PP-PI).

Nas mensagens analisadas pelo setor de inteligência do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), há troca de documentos entre Fábio e Matias, combinações e até fotos da entrega dos kits de testes, em junho de 2020. Um negócio de R$ 8,8 milhões, com sobrepreço de cerca de R$ 5 milhões, segundo o MP. A empresa de Matias forneceu 12 mil kits, a R$ 2,2 milhões.

Pouco depois, em julho, foi deflagrada a primeira etapa da Operação Falso Negativo. Em 25 de agosto, na segunda fase, a cúpula da Secretaria de Saúde do DF teve a prisão preventiva decretada pelo desembargador Humberto Ulhoa, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT). Entre os presos, Francisco Araújo. Um dia depois, sem que seu nome fosse ainda investigado, Fábio Campos foi exonerado do gabinete do deputado João Carlos Bacelar.

Isso não impediu, no entanto, que a mulher de Fábio, Renata D’Aguiar assumisse um cargo importante no governo Bolsonaro, por indicação do Centrão e de Ciro Nogueira. Ela é diretora de Gestão de Fundos e Rendimentos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Mas tem voo próprio. Foi candidata a deputada distrital pelo PP em 2018, porém, conquistou apenas 3.912 votos e não se elegeu.

Renata, Fábio e Matias estão entre os alvos da 4ª fase da Operação Falso Negativo, deflagrada na quarta-feira (3/3), com o cumprimento de 15 mandados de busca e apreensão no Distrito Federal e no interior da Bahia, coordenada pelo Gaeco-DF, com apoio de policiais civis do Departamento de Combate à Corrupção (DECOR) da Polícia Civil do DF. Policiais e promotores do Gaeco da Bahia auxiliaram nas medidas.

Durante as buscas, policiais encontraram R$ 280 mil no carro de Fábio, estacionado na frente do prédio do casal, na Asa Sul. O dinheiro estava espalhado em uma caixa no porta-malas, no porta-luvas e no console, segundo relato de investigadores. A defesa do casal não foi localizada ontem.

O advogado Cleber Lopes, que representa Francisco Araújo, disse que a operação se refere a fatos antigos e não estão vinculados a seu cliente, que já está denunciado.

Em nota, a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) afirma que tem colaborado com as investigações, fornecendo todos os documentos necessários para a apuração dos fatos relativos à operação Falso Negativo, desde a sua fase inicial. “A atual gestão tem tomado todas as medidas para esclarecer dúvidas, acatar recomendações e aprimorar os mecanismos de transparência dos atos e ações da pasta junto à sociedade”, diz a nota.

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“Puder falar, meu irmão, me liga aí que eu queria ver um negócio da empresa contigo aí, que aqui no GDF eu não posso ‘botar’ minha empresa, eu queria ver se você poderia me emprestar a sua aí, pra eu mandar uma proposta aqui pro GDF.”
Empresário Fábio Gonçalves, em áudio enviado por WhatsApp ao empresário Matias Machado Silva, cuja empresa foi contratada pela Secretaria de Saúde para fornecimento de testes para covid-19.

"Fábio, o que você precisar aí, referente essa empresa minha, você pode me ligar, viu? Que eu mando pra você, tá bom?”
Resposta em áudio de WhatsApp do empresário baiano Matias Machado Silva, depois de encaminhar uma série de documentos, como atestados de capacitação técnica e regularidade fiscal.

As mensagens foram obtidas pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) no telefone do empresário Matias Machado Silva, durante a busca e apreensão realizada na primeira etapa da Operação Falso Negativo.

 

 

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