Inimigo invisível
Março é o mês em que as associações médicas se reúnem para conscientizar a população sobre a importância da prevenção ao câncer colorretal. Em 2020, o mundo se surpreendeu com a partida precoce do ator Chadwick Boseman, estrela do filme Pantera Negra, aos 42 anos. Vítima de um tumor desse tipo em estágio quatro, ele enfrentava a doença desde 2016. Embora trágicas, histórias como a do astro de Hollywood não são incomuns. Em entrevista ao CB.Saúde — parceria entre o Correio e a TV Brasília — dessa quinta-feira (25/3), o oncologista Gustavo Fernandes, da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica, explicou que esse tipo de tumor às vezes passa despercebido, mesmo estando entre os cinco mais recorrentes e entre os mais letais em todo o mundo.
“(O câncer vem de) um processo inflamatório crônico. É fácil a gente enxergar quando você tem câncer de pele, que o sol vai lá e danifica, agride, mas quando se trata do sistema digestivo, ver essas agressões rotineiras, causadas por hábitos como má alimentação e sedentarismo, é algo difícil”, explicou o médico. Sobre a crença de que a doença é, em geral, agressiva em pessoas mais novas, o médico esclareceu: “A estimativa de vida, com doença, dos pacientes que têm câncer colorretal diagnosticado mais jovem é maior. O ponto é que eles terminam vivendo menos. Se alguém com 45 anos tem um câncer colorretal e vive oito anos, por exemplo, ele viveu 53. Alguém que adoece com 80, e falece dois anos depois, viveu 82. Assim, essas mortes fora do tempo biológico esperado chocam e machucam”
Entretanto a medicina atual dispõe de formas para evitar a maioria dos quadros fatais: atenção aos sintomas e busca de auxílio o mais cedo possível. Confira trechos da entrevista em que Fernandes detalha o assunto:
Qual o papel do rastreamento na redução de mortes pelo câncer colorretal?
Se a gente tiver o rastreio apropriado com colonoscopia a partir dos 50 anos, conseguiremos reduzir a morte pelo câncer colorretal em mais da metade. Isso não quer dizer só que as pessoas não morrerão. Quer dizer que elas continuam trabalhando, produzindo, dando sustento e atenção às suas famílias. Assim, são muitos anos de vida que nós podemos ganhar.
O que é necessário para um diagnóstico mais rápido?
No Brasil, no Sistema Único de Saúde (SUS), que cuida de 80% da população, a gente precisava de algum programa. Não temos nenhum. Se fizesse colonoscopia, por exemplo, a partir dos 60, já seria muita coisa, porque a média de idade diagnóstica é 65 anos. A partir dos 55, talvez fosse bastante apropriado se a gente tivesse (o exame de) sangue oculto nas fezes, seguido de colonoscopia, para quem é sangue oculto positivo. Temos que sair do tempo zero, do nada, e estruturar alguma coisa.
E, pensando no paciente, quais são os primeiros sintomas e sinais de que ele precisa procurar um profissional especializado?
O diagnóstico precoce pode vir a partir de sinais e sintomas interpretados corretamente. Naturalmente, tem gente que não tem sintomas e abre o quadro de uma maneira avançada. Entretanto há uma boa proporção de pacientes que está, por exemplo, com evacuação com sinais de sangue há um ano. Isso não é tolerável, não é razoável. ‘Ah, mas podia ser hemorroida’, podia. Se o médico examina e fala ‘olha, tem uma hemorroida’, tudo bem, você pode pacificar o seu coração. O que não dá é para não investigar. É a mesma coisa com alguém que tem o intestino regular e passa a ter constipação. O formato das fezes muda, ficam mais ressecadas, a pessoa passa a ir ao banheiro a cada dois dias, isso merece investigação.
Com que regularidade é preciso fazer exames?
O exame de sangue oculto nas fezes, idealmente, uma vez por ano. De um a dois anos, no máximo. A colonoscopia é algo entre cinco e dez anos, porque a sequência de transformação da doença benigna até a doença maligna demora, na maioria dos casos, algo em torno de sete anos. Então, você consegue pegar quase todos os casos de maneira precoce ou ainda na fase inicial.
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