E, finalmente, chegou a minha vez de ser vacinado. Sou aquariano, tenho 66 anos, completados em 21 de janeiro. Na quinta-feira, a secretaria de Saúde do DF avisou que no sábado haveria imunização para quem tivesse 65 e 66 anos, com 18 postos em sistema drive-thru. Mas, na sexta, tudo mudou. O estoque ficou reservado para quem precisa tomar a segunda dose. Sobraram apenas 1.100 doses para a faixa dos 66 anos, a serem aplicados em apenas três locais.
Na noite de sexta, tinha gente na fila do Parque da Cidade para a vacinação que começaria no sábado, às 9h. Era um sinal do caos anunciado. Moro em um condomínio horizontal no Jardim Botânica. Na madrugada de sábado, minha mulher, Juçara e eu acordamos de madrugada e fomos para o Lago Norte, rumo ao posto instalado no shopping Iguatemi. Ao chegarmos, às 5h40, logo nos deparamos com uma fila quilométrica de carros, que se estirava por várias quadras. Sou brasileiro, não desisto nunca. Entramos na fila para ver o que podia acontecer.
Se existiam 1.111 doses disponíveis, caberiam 370 para cada um dos três postos. Sai, caminhei uma quadra e contei os carros para avaliar se tínhamos alguma chance de sermos vacinados. Contei 117 veículos. Na volta, me encontrei com um camarada do bloco Pacotão, que chamarei de Paulo porque não me lembro do nome dele. Ele ficou animado ao ouvir o meu relato: se for essa a média, existem mais duas quadras, dá umas 300 e poucas pessoas e nós temos chance. “Vamos botar fé. Eu sou o brasileiro profissão esperança”, disse, bem-humorado.
Enquanto esperávamos no carro, ligamos o rádio para saber notícias. De repente, apareceu a voz do Macaco Simão: “Bomba: Pazuelo foi contratado para desencalhar o navio no canal de Suez. Mas ele foi para o canal do Panamá. Tentou desencalhar o navio com cloroquina e ele mesmo ficou encalhado”. Então, ao comentar os sinais de desorganização passamos a questionar. Se acordamos de madrugada por quê a vacinação não poderia começar às 7 da manhã?
Mas, enfim, sem saber se poderia ser vacinado, bateu as 9 e a fila de carros se movimentou dando um alento. No entanto, ao acionar a chave de ignição, nosso carro permaneceu imóvel, não ligava. Alguns que estavam atrás buzinavam. Sai voado na direção de um conjunto comercial em busca de um mecânico. Não havia. Voltei para o outro lado da pista, pensando no aborrecimento e a perda de tempo que teria ao acionar o socorro do seguro. No entanto, ao retornar, depois de uns três minutos, me deparei com um motoqueiro de uma companhia de seguro fazendo a ligação para recarregar a bateria do carro. Ele foi acionado por outro motorista que teve o mesmo problema que o meu. Uma senhora que estava na fila assistiu a tudo e pediu a ele que socorresse meu carro também.
A fila andou rapidamente, mas a senhora sugeriu que eu alcançasse o carro do meu amigo do bloco do Pacotão, que estava à frente, para não perder o lugar na vacinação. Partimos, observamos, procuramos, mas não encontramos o amigo. Que pena, eu não conseguiria me vacinar. Voltamos para casa desalentados. No entanto, ao assistirmos a um telejornal, uma nova reviravolta. A secretaria de Saúde resolveu aumentar o número de doses para vacinação com mais 2 mil frascos e estender o horário de encerramento, das 15h para as 17. Corremos novamente em direção ao Itapemi. Chegamos às 13h. A fila era ainda mais quilométrica, mas não desistimos. De nada adiantou, logo um carro do Detran passou e avisou que não havia mais vacina. Se quiséssemos, poderiam passar no Parque da Cidade.
Sem muita esperança, fomos para lá, mas, para nossa surpresa, conseguir uma senha para vacinar. Chegamos às 13h e, finalmente, tomei a vacina, às 16h. Os bravos agentes de saúde, que estão na linha de frente, nos trataram com a melhor atenção. Só tenho de agradecer-lhes. Mas não precisava de tanta confusão e desencontros na vacinação do ponto de vista da comunicação e da organização geral. A cada dia e a cada hora uma informação desencontrada. Parece que o general Pazuello fez escola em matéria de logística. Quando chegamos no território dos profissionais de saúde tudo funciona maravilhosamente.
Mas a parte boa da história é que o negacionismo da vacina deu com os burros n’água. Todos querem, desesperadamente, serem vacinados. Não há loucura pior do que preferir a enfermidade do que a saúde, a peste do que a cura, a morte do que a vida. Viva os nossos cientistas! Viva o nosso SUS! Viva os nossos profissionais de saúde! Viva o nosso Instituto Butatan.! Viva a nossa Fiocruz! Viva a nossa democracia!
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