Os intelectuais de terno e gravata que me perdoem, mas, no Brasil hoje, à exceção de todas as tragédias e dos problemas muito sérios, pouquíssimos assuntos rendem mais do que o BBB. De modo que vou dedicar este espaço a um elogio à figura mais interessante do programa: Gil do Vigor. Se pudesse escolher, teria dado o prêmio a Gil há algumas semanas e encerrado esta edição, que caminhou para um rumo um tanto entediante — o símbolo maior disso é a chegada de Fiuk à final.
Antes que me acusem de ignorante e iletrado, não há necessidade de enviar e-mails dizendo que eu deveria ler livros (outros tipos de mensagens podem mandar, eu adoro). Continuo fazendo isso, por mais que estejam cada vez mais caros e que algumas figuras equivocadas do Governo Federal insistam em querer aumentar a taxação. Aproveito e deixo uma recomendação (não, não será Torto arado, apesar de gostar dele). Leiam Impressão sua, bom livro de poemas — agudo e sem beletrismo — do, mais celebrado como cartunista, André Dahmer.
Podem também ficar tranquilos. Longe de mim dizer que o BBB é uma representação fiel do Brasil, um debate sobre a cultura do cancelamento, um experimento antropológico ou um prenúncio do que virá nas eleições de 2022. Isso, na maioria das vezes, é bobagem e desculpa para quem sente vergonha de assistir a um programa de qualidade pouco elogiável. BBB é entretenimento. Eu vejo por isso e, de vez em quando, tento entender uns livros muito densos, uns filmes complexos e ouço música erudita. Uma salada e uma droga, não é isso que recomenda a sabedoria popular?
Não fecho com Juliette, como diriam os jovens descolados. Toda unanimidade é burra, escreveu Nelson Rodrigues, com um punhado de ironia e paradoxo. Não a detesto, mas, também, não teria paciência para um papo de boteco com ela. Na primeira hora, eu já estaria cansado das problematizações e de um certo egocentrismo que a advogada carismática e de voz bonita exibe de vez em quando.
Prefiro a loucura de Gil, que parece ter saído da caneta de um roteirista muito inspirado. Se vejo BBB por entretenimento, ninguém me ofereceu mais isso do que ele. Corajoso, paranoico e instável, Gil do Vigor me lembra um pouco, também, do que tenho sido neste mais de um ano de pandemia, com um tanto a mais de discrição.
O fato de que, fora da casa, Gil seja um prodígio e tenha sido aprovado para instituições de ensino importantes no exterior dá um gostinho a mais. Gil é, além de tudo, uma porrada em certa caretice vigente, no discurso de que o diferente deve sempre se adequar. Não deve. Que os incomodados com os gritos e trejeitos de Gilberto se acostumem e se acostumem, também, aos corpos gordos, pretos e diversos. O tempo de silêncio e de opressão precisa acabar.
Fico na torcida para que, daqui a pouco, o jeito exagerado de dizer “O Brasil tá lascado” seja só comédia e não um retrato trágico do país que escolhemos ser.
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