Entrevista / Felipe von Glehn, neurologista e professor da Universidade de Brasília

Maioria das sequelas podem ser revertidas

Edis Henrique Peres
postado em 27/05/2021 22:00
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

Embora sequelas neurológicas por covid-19 sejam consideradas raras, devido ao alto número de pessoas infectadas no Brasil — quase 17 milhões desde o começo da pandemia — o problema se tornou uma preocupação séria no país. O professor da Universidade de Brasília (UnB) e neurologista do Hospital Sírio-Libanês, Felipe von Glehn, reforça que, apesar disso, a maioria das sequelas podem ser revertidas com acompanhamento médico. O neurologista foi o entrevistado pela jornalista Carmen de Souza ontem no CB. Saúde — parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília.

Confira os principais trechos da entrevista.


Alguns estudos têm mostrado que uma em cada três pessoas que contraem a covid-19 desenvolvem sequelas neurológicas ou psiquiátricas, é o que o senhor tem visto no Distrito Federal?
É importante salientar que temos um alto número de infectados por covid-19 no país. São quase 17 milhões de contaminados, mas esse número está provavelmente subnotificado. E temos visto pacientes que desenvolvem sintomas neurológicos. Como não é comum um vírus que afeta as vias respiratórias causar doenças neurológicas, a comunidade científica internacional resolveu estudar esses fenômenos para saber se existe uma relação direta entre o vírus e essas alterações. Para não deixar ninguém assustado, a quantidade de sequelas sérias é baixa. O que mais observamos é alteração no olfato e no paladar, mas também há notificação de polineuropatia ou síndrome de Guillain-Barré aguda, em que o paciente adquire uma fraqueza ascendente. Também vimos alguns casos de encefalite, pois o vírus causa uma inflamação no cérebro que pode levar a crises compulsivas e alteração do nível de consciência. Mas todas essas sequelas são raras.

Depois de quanto tempo o paciente pode dizer que ficou com uma sequela da covid-19? Porque logo após a alta é normal um período de recuperação, não é isso?
Geralmente após, mais ou menos, duas ou três semanas da infecção aguda. Se a perda do olfato se prolonga por todo esse tempo, a dor de cabeça não melhora, existe uma falta de memória ou atenção e algum desses sintomas persiste mesmo passado esse período, o paciente deve procurar um neurologista para ser avaliado e descobrir se existe algo mais grave.

De que forma isso acontece? O vírus age diretamente no cérebro, o que os estudos têm mostrado?
Esse é um grande desafio que estamos estudando. Logo com o primeiro coronavírus, que causou uma epidemia, o Sars-CoV-1, em 2002, já foi visto que ele afetava o nervo que nos dá a sensação dos odores e já vimos que o vírus tinha uma capacidade de invadir a mucosa nasal e os nervos que vão formar o nervo olfatório. Com o tempo começamos a questionar se o novo vírus, do Sars-CoV-2, também poderia causar isso. Por meio de estudos anatomopatológicos, com indivíduos que infelizmente vieram a falecer por complicações da covid-19, e também com experimentos in vitro utilizando neurônios em laboratório, foi visto que o vírus tem a capacidade de realizar essa invasão. Mas não é em todo o indivíduo que o vírus vai ter esse comportamento.

Falamos de diversas sequelas, mas boa parte dessas complicações podem ser revertidas, não é isso?
Sim, nós podemos fazer uma reabilitação cognitiva com a ajuda do neuropsicólogo que vai treinar as funções que estão alteradas. Memória, raciocínio, linguagem, tudo isso pode ser treinado. O neuropsicólogo vai fazer um programa e acompanhar junto esse treinamento.Outro ponto é a reabilitação motora. Por meio da fisioterapia é possível deixar o paciente com uma funcionalidade mais próxima do normal.

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