Direito do consumidor

Especialistas esclarecem dúvidas e informam como o consumidor deve proceder nesses casos. O recomendável é buscar uma solução amigável por meio de acordo

» Jessica Cardoso*
» JÚLIA ELEUTÉRIO*
postado em 30/05/2021 23:39

 

Uma simples viagem de avião de oito horas acabou se tornando um grande problema para Marcella Queiroz, após a empresa área descumprir o que estava previsto no contrato. A estudante de 22 anos contou, em entrevista ao Correio, que comprou, em outubro de 2020, uma passagem de Lisboa para Natal, com embarque previsto para janeiro de 2021. Mas, alguns dias depois, a companhia informou que o voo havia sido cancelado.
Segundo ela, a empresa ofereceu uma outra passagem que fazia escala na Espanha, São Paulo e Brasília antes de chegar ao destino final. “A viagem duraria 40 horas. Era um absurdo porque eu tinha comprado um voo direto, de oito horas e de primeira classe”, explica. Além do trajeto mais longo, Marcella teria que pagar 120 euros por cada uma das três bagagens que estava levando, enquanto que, na passagem original, o serviço estava incluso.
“Eu perguntei para eles como é que eu chegaria em Natal. Abri três chamadas na empresa e no Procon tentando fazer com que respondessem”, relatou a estudante. Na época, Marcella precisava voltar para o Brasil até janeiro, porque o seu visto de estudante estava para expirar. Foi somente em dezembro que a empresa deu outra alternativa e ofereceu a opção do reembolso ou do voo de Lisboa para Recife, destino diferente do original. Marcella acabou optando pela passagem até a capital pernambucana, mas precisou recorrer a um serviço de transporte privado e pagar R$ 600 para chegar em Natal. “Eu peguei o voo até Recife porque, se eu fosse pedir o reembolso e pegar outra passagem, eu pagaria um absurdo [de diferença], e não sabia até quando as fronteiras continuariam abertas”, explica.
Depois de todo o transtorno, a estudante decidiu abrir uma ação no juizado especial, pedindo o valor da passagem, o valor que gastou com o aplicativo de carro e uma indenização por danos morais. “Eu pedi a indenização pelo absurdo que foi [a situação], pelo descaso da empresa ao demorar dois meses para me responder, por não me propor um voo alternativo decente e ainda ficar me enrolando”, conta Marcella. O processo está em andamento na Justiça.
Segundo o especialista em direito do consumidor Marcello Aragão, em casos de relação de consumo de qualquer natureza, como o da estudante, o consumidor estará protegido pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC). “Constatada a existência de relação de consumo, o consumidor é presumido a parte mais fraca da relação, uma vez que, no contexto do mercado de consumo, o fornecedor é quem detém, com exclusividade, informações sobre os bens e produtos e a decisão sobre quando, onde e como disponibilizá-los para o consumidor”, ressalta.

Entenda o CDC

O CDC defende uma série de direitos básicos relacionados ao consumidor e ao fornecedor de serviços e atividades. O descumprimento de pontos acordados na compra do serviço pode ocorrer de diferentes maneiras, como quando a reforma de uma casa excede o tempo previsto no contrato ou, até mesmo, não é concluída, forçando o consumidor a procurar outro fornecedor. A advogada e especialista no tema Ildecer Amorim diz que “para que a atividade de serviços atenda a suas finalidades, é imprescindível que o cliente, seu destinatário final, tenha seus direitos respeitados, como consumidor que é”.
Conforme descrito no artigo 40 do CDC, o consumidor não responde por quaisquer ônus ou acréscimos decorrentes da contratação de serviços que não estão previstos no orçamento prévio. Outro ponto relevante do código está no artigo 14, dispondo que o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre o uso e riscos. Vale ressaltar que há exceções nos casos em que o prestador de serviço prova a inexistência de defeito ou que a culpa pelo erro é exclusivamente do consumidor.
Ildecer destaca, também, o artigo 48 do CDC, que trata do respeito às formas de vínculo contratual entre as partes, mesmo não havendo um contrato formal. “As declarações de vontade constantes de escritos particulares, recibos e pré-contratos relativos às relações de consumo vinculam o fornecedor, sendo possível ao consumidor exigir, na Justiça, seu cumprimento, mesmo não havendo contrato formal ou qualquer documento escrito, como recibos, propostas, pré-contratos e similares”, explica.

O que fazer

Em casos de serviço inacabado ou não feito pelo contratado, a advogada Ildecer Amorim indica buscar uma solução amigável por meio de acordo. Ela ressalta que “caso não obtenha êxito, o cliente deve recorrer aos órgãos de defesa do consumidor”. Quanto aos pagamentos ao fornecedor, a especialista afirma que o consumidor não deve deixar de pagar pelo serviço, mesmo que ele não tenha sido efetuado na sua totalidade. Para ela, o ideal nesses casos é que o consumidor procure seus direitos, pois o Código de Defesa do Consumidor garante o cumprimento do contrato.
O especialista Marcello destaca a importância de fazer um contrato independente da complexidade do serviço contratado. “Em toda a relação de serviço, por mais simples que seja, o consumidor sempre deve fazer um contrato, estipulando, prazo, preço, o que será realizado no serviço e multa por descumprimento”, ressalta. Ele explica que o contrato formal auxilia o consumidor a ser resguardado de possíveis prejuízos e danos. “Pois, com essas disposições, será muito mais fácil exigir na Justiça os direitos do consumidor, sem se falar que será muito mais fácil demonstrar a relação de consumo e exigir qualquer prejuízo que se tenha”, explica.

*Estagiárias sob a supervisão de Rosane Garcia

Dicas

» Buscar referências e indicações antes de contratar;

» Solicitar a opinião do profissional sobre a prestação do serviço;

» Informar de forma bem detalhada ao prestador de serviço qual é o problema apresentado e qual é o serviço que deve ser efetuado por ele;

» Exigir o orçamento por escrito com valor, prazo e garantia;

» Exigir o recibo de todo o pagamento efetuado, além da nota fiscal de serviço do material utilizado;

» Nunca efetuar o pagamento antecipado. Caso o prestador de serviços exija um adiantamento, nunca pagar mais que 50% do valor combinado.

» Depois de executado o serviço, verificar se ele ficou conforme o solicitado. Em caso de vício ou dúvida, não pague até que o serviço seja refeito.

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