Brasília se despede de um grande nome da história da capital: Sebastião Gomes da Silva, o Tião Padeiro, fundador da Pastelaria Viçosa. Ele faleceu ontem, aos 92 anos, após não resistir a uma internação para tratar de complicações de saúde; ele tinha diabetes e fazia hemodiálise.
Patrícia Rosa, filha de Tião e atual gestora da Pastelaria Viçosa, afirma que, apesar da dor da perda, a família está grata por tudo que aprendeu com o empresário. “Meu pai foi uma pessoa muito importante na nossa vida. Desde o começo de Brasília, ele teve garra e perseverança. O positivismo e a fé dele foram passados para nós, e eu me orgulho disso”, conta.
Ela afirma que durante as mais de nove décadas de vida, Tião deixou um legado de criatividade, ousadia e força. “Nós, da família, temos uma característica do meu pai que o representa bem: ele dizia que o mundo só melhora, aconteça o que acontecer, entra governo ou sai governo. Ele era um guerreiro e lutador”, afirma. Tião era pai de três filhos, avô de nove netos e bisavô de um bisneto.
Na última sexta-feira, Tião chegou a visitar a sede administrativa da Viçosa. “Ele estava bem, mas tinha problemas de saúde que o faziam ir e voltar do hospital”, relata Antônio Paulo Gonçalves, 53 anos, do departamento pessoal da pastelaria. Ele lembra com carinho de Tião, que lhe deu o primeiro emprego em Brasília. “Eu cheguei do Maranhão, há 24 anos, sem nada. Comecei nos serviços gerais da Rodoviária do Plano, e ele me promoveu até chegar ao departamento pessoal. Ele valorizava os empregados, era um bom patrão”, lembra, emocionado.
Em nota publicada nas redes sociais, a Pastelaria Viçosa diz que Tião deixou um legado “de um homem alegre, batalhador e positivo, que realizou inúmeras tarefas, dentre as quais, viveu uma vida bem vivida”. A publicação afirma que a família “está sentida”, mas agradecida pela convivência com o empresário.
De Minas para Brasília
Natural de Barra Longa (MG), Tião Padeiro foi criado em uma fazenda de plantação de milho e feijão. Foi dono de bar e restaurante em Belo Horizonte, e no Rio de Janeiro se aventurou na carreira de ator, com a esposa Ivanildes, mas desistiu após ver o dia a dia da profissão. No entanto, foi na terra fluminense que ele viu, no cinema, um trailer que mostrava o começo de Brasília. Ele propôs à esposa que mudassem para a nova capital, plano que foi concretizado em 1957, quando Tião tinha 28 anos.
Em pouco tempo, ele se aventurou a servir pão com manteiga aos pioneiros. O negócio deu certo, e ele abriu uma padaria em Sobradinho. Tudo mudou, no entanto, quando Tião e a esposa perderam um ônibus para Belo Horizonte e, com fome, comeram um pastel de um ambulante que vendia os produtos em uma cesta — o vendedor viria a ser o futuro sócio de Tião, Eugênio Apolônio.
A unidade mais famosa da pastelaria, na Rodoviária do Plano Piloto, começou, em 1960, em um espaço de dois metros por cinco metros quadrados, com uma fritadeira e uma máquina de caldo de cana. Nascia a Pastelaria Viçosa, a mais tradicional da cidade. O negócio chegou a vender, no início, cerca de 40 mil pastéis por dia. Passaram pelo local o ex-presidente da República Juscelino Kubitschek, ainda no começo da construção de Brasília, além de Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro.
Em um vídeo gravado para uma campanha publicitária da pastelaria, ele diz que Brasília mostrou ao mundo o poder do país. “Eu vi tanta coisa. Qualquer coisa que você me perguntar de Brasília eu vi. Entreguei pão em todas as obras. Hoje, Brasília mostra ao mundo que tem um país na América do Sul que tem poder e que terá ainda mais”, diz Tião. “Eu me sinto orgulhoso, cheio de vaidade de ter ajudado a fazer Brasília. Eu dei à cidade o que eu pude. Onde eu passei, eu ajudei. Faria tudo de novo. Hoje eu tenho uma esperança só: fazer o mundo melhor, todo dia”, conclui.
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