Minha namorada está muito preocupada. Fez um alerta e escreveu até URGENTE, assim mesmo em caixa alta no WhatsApp, como fazem alguns repórteres no Twitter para coisas nem tão relevantes assim. Talvez eu devesse manter no privado o motivo, porque é possível que alguém queira desejar o mal para mim depois da revelação. Ela me convenceu, porém, que o melhor seria me abrir e deixar registrado aqui que, de antemão, peço desculpas pelo que possa acontecer.
A essa altura, um parágrafo depois, não tenho como mais voltar atrás. Vou revelar tudo. Chegou, nesta semana, meu aviso de férias. São só 10 dias, mas ela está aflita. Meu histórico não ajuda. Passei um bom tempo sem tirar longos períodos de descanso. Minhas primeiras férias oficiais, na CLT mesmo (esse troço lindo que, infelizmente, está ficando fora de moda), foram, acreditem, em março de 2020.
Eu planejei durante muito tempo viajar para o Uruguai. Fui sozinho. Bem no comecinho do mês. Havia o burburinho do coronavírus, mas ninguém sabia nada direito. O Brasil tinha pouquíssimos casos. O Uruguai, nenhum. Fiquei apaixonado por Montevidéu, mas voltei desesperado e encontrei Brasília, com razão, fechadíssima.
Hoje, tremo de medo só de lembrar que me enfiei num avião sem máscara — era a recomendação da época. Se soubesse o que sabemos agora, sem dúvida, não teria ido, mesmo que a taxa de contaminação ainda fosse muito baixa e quase não houvesse casos e nenhuma morte naquele momento. Nunca mais fui ao aeroporto.
Alguns colegas me disseram: que hora para tirar férias, hein? Eles estavam atolados em notícias e mais notícias. Tirei férias novamente em março de 2021. Sem planos de viagem, só fui visitar meus pais — de carro e de máscara — em Minas Gerais. Voltei novamente para uma Brasília, com razão, repito, fechada. Segunda onda (se bem que nem sei se dá para dizer que saímos da primeira) e lockdown.
Fiquei com fama de que é só eu sair de férias que tragédias acontecem e notícias importantes surgem. De modo que a aflição de minha namorada tem a ver com o que pode vir a acontecer nos 10 dias que tirarei em julho. Espero que nada. Meus planos são modestos. Quero só me isolar no meio do mato e evitar contato com celulares, pessoas e outros riscos.
Meus planos para o resto do mundo são humildes também. Não peço muito, só que não venham tragédias, aumento de número de casos — apesar de o presidente complicar isso —, novas variantes, caçadas a criminosos e coisas bizarras. Eu gostaria que as manchetes fossem as florações dos ipês-roxos e amarelos. Sei que aí é muito, mas, quem sabe, depois deste apocalipse e de 2022, o universo nos conceda um momento de paz.
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