GEOGRAFIA

Grotas, rios e matas: conheça principais características de Cocalzinho (GO)

Geógrafo, guia turístico e morador do município explicam como relevo da região pode favorecer deslocamento sem chamar a atenção, bem como o encontro de esconderijos. Eles consideram necessário ter familiaridade com o local para fazer buscas efetivas

Edis Henrique Peres
Mateus Gaudêncio*
postado em 22/06/2021 06:00
O povoado de Edilândia fica a cerca de 80km do centro de Brasília e pertence ao município de Cocalzinho (GO) -  (crédito: Editoria de Arte/CB)
O povoado de Edilândia fica a cerca de 80km do centro de Brasília e pertence ao município de Cocalzinho (GO) - (crédito: Editoria de Arte/CB)

O suspeito de matar quatro integrantes da família Marques Vidal, em 9 de junho, Lázaro Barbosa de Sousa, 32 anos, é procurado pela polícia no povoado de Girassol e no distrito de Edilândia, em Cocalzinho (GO). A equipe conta com cerca de 270 agentes, mas, apesar do efetivo, o secretário de Segurança Pública do estado, Rodney Rocha Miranda, mencionou que as buscas sofrem prejuízos, principalmente, devido à grande quantidade de grotas e ao relevo da região (leia Glossário).

Doutorando em geoprocessamento e análise ambiental na Universidade de Brasília (UnB), o geógrafo Elton Souza Oliveira explica que a região entre o centro de Cocalzinho de Goiás e o povoado de Girassol é composta por áreas de vale que incluem “cursos d’água, com presença de encostas com relevo mais acidentado e de difícil acesso”. Ele afirma que, apesar da presença de chapadas — terrenos planos —, a região tem pontos que apresentam características de “forte ondulado”, onde há declives com inclinação de 20% a 45%.

“O local, cerrado, tem desde matas de galeria, com vegetação mais densa e fechada, até locais de campo limpo, com poucos arbustos, onde há gramíneas. O clima da área é tropical chuvoso e apresenta temperaturas médias que variam de 19°C a 23°C, com máximas que podem superar os 30°C. No período seco, a umidade relativa do ar pode chegar a 20%”, detalha Elton.

Em relação à locomoção de Lázaro pela região, o geógrafo ressalta que o relevo acidentado em alguns pontos é um problema para a mobilidade, devido à presença de subidas e descidas íngremes, as quais podem levá-lo a se mover mais devagar ou a cansá-lo mais rápido. “Entretanto, a presença de rios com matas de galeria permite que ele se desloque sem ser visto, além de proporcionar água para se manter hidratado. Os cursos que existem nessas matas são de baixo fluxo, não chegam a ser um obstáculo para travessia. O agravante maior é a questão do relevo, com presença de grotões ou barrancos altos”, ressalta.

À noite, as matas próximas aos rios apresentam temperaturas mais baixas, segundo o especialista, e isso pode fazer com que, nesse período, Lázaro tenha de deixá-las. “Na região próxima a Girassol, o maior rio que existe é o Pichuá. Mas ele não apresenta corredeiras no período de estiagem, e os outros, pelas características do ambiente, são de baixa vazão, com pouca água”, completa o geógrafo.

Desafios

Morador de Girassol há 27 anos, Rodrigo Santos de Sousa, 38, é motorista e guia turístico. Antes de assumir esses ofícios, visitava constantemente a área rural da cidade. “Meu avô tinha uma fazenda, e eu sempre vivi por aqui (em Cocalzinho)”, comenta. Para ele, o que dificulta as buscas por Lázaro é a falta de familiaridade dos policiais com o local. “Eles não conhecem a região. Claro que são preparados, mas a vantagem que Lázaro tem é de conhecer tudo. Ele consegue andar à noite e saber para onde vai. Aqui, temos diversos acessos e saídas. Quem conhece bem o lugar consegue usar isso a favor. O que atrapalha também são as informações falsas: o pessoal fala que ele está aqui (em Girassol); depois, que está em Edilândia”, opina.

Rodrigo salienta que a pouca quantidade de árvores altas na região torna-se um ponto positivo. No entanto, o mato está amarelado devido à fase de seca, e isso facilita para quem quer se esconder. “Em relação a cavernas, só temos uma, a Gruta dos Ecos, que tem quatro entradas e é enorme. Conversei com um tenente e disse que o Lázaro dificilmente usaria o local, porque lá é fácil se perder. Sem lanterna, ele ficaria acuado e sem manobra para fugir”, diz o guia.

Mamede Pereira dos Santos Júnior, 35, dono de um comércio de plantas ornamentais e jardins, mora há mais de 32 anos em Girassol. Ele conta que não há “feras” na região e que raramente se veem onças ou lobos-guará. “O que temos é: tamanduá, paca, tatu, seriema, perdiz e gambá. Em geral, são mais caças, mesmo”, explica. Em relação à flora, há diversas árvores frutíferas. “Tem pequi, jatobá, mangaba, cajuzinho, araticum e guariroba, mas elas não dão nessa época. Outras espécies de frutos ele (Lázaro) teria de pegar nas propriedades”, afirma.

O comerciante concorda que, para quem não conhece a região, o relevo pode dificultar, especialmente devido às grotas. “No caso do uso de helicóptero, imagino que, mesmo se (os policiais) visualizarem algo suspeito, até a equipe em terra chegar ao local, foi possível a ele (Lázaro) se esconder”, observa Mamede. “A região tem muitas vicinais, estradas de terra que chegam a outros municípios. Acho que, por isso, precisam de muitos efetivos, para fazerem blitz e impedirem as rotas de fuga. Mas, realmente, o povo vive um terror psicológico. Os fazendeiros têm abandonado as chácaras, deixando-as à mercê de outros bandidos que circulam por aí. Estão muito apreensivos. Nosso desejo é de que a situação se resolva logo.”


Glossário

Gramíneas: plantas de pequeno porte e folhas semelhantes a lâminas
Grota: encosta ou ribanceira que forma barrancos devido à erosão
Grotão: depressão — cavidade — de grande profundidade
Mata ciliar: vegetação que cresce às margens de uma nascente ou curso d’água
Mata de galeria: sinônimo de mata ciliar, é a vegetação que acompanha rios de pequeno porte e córregos
Relevo acidentado: quando o solo apresenta montanhas, desníveis e vales

Fonte: Geógrafo Elton Souza Oliveira

*Estagiário sob supervisão de Jéssica Eufrásio

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