VIOLÊNCIA

Caso Lázaro: "fake news prejudicam operação e moradores", diz especialista

Em 19 dias de caçada, autoridades e agências de checagem precisaram desmentir, ao menos, oito fake news relacionadas à fuga de Lázaro Barbosa

Samara Schwingel
Edis Henrique Peres
postado em 27/06/2021 06:00
Especialista em segurança pública Leonardo Sant’Anna: desinformação aumenta medo, ansiedade e estresse -  (crédito: PRI-2706-1610)
Especialista em segurança pública Leonardo Sant’Anna: desinformação aumenta medo, ansiedade e estresse - (crédito: PRI-2706-1610)

Com a repercussão das buscas por Lázaro Barbosa de Sousa, 32 anos — acusado de cometer crimes no Distrito Federal, no Entorno e na Bahia —, informações falsas têm prejudicado o andamento do caso e gerado mais alarde na população. Levantamento feito pelo Correio identificou, ao menos, oito fake news que tiveram grande alcance e, por isso, precisaram ser desmentidas pelas autoridades ou por agências de checagem de fatos. Os boatos começaram a circular depois de o foragido matar três pessoas e sequestrar uma empresária, em 9 de junho.

A primeira informação que demandou um posicionamento oficial dizia que o foragido estava morto. Com essa mensagem publicada em diferentes perfis nas mídias sociais, a força-tarefa à frente do caso teve de desmentir o factoide, em 16 de junho.

Três dias depois, líderes de grupos religiosos de matriz africana se pronunciaram sobre imagens vinculadas ao caso de Lázaro. Os registros faziam associação entre o criminoso e o que denominaram na internet como “rituais satânicos”. No entanto, as fotos não tinham qualquer relação com a fuga do suspeito e haviam sido tiradas em terreiros durante as buscas na região de Cocalzinho (GO) e Águas Lindas (GO).

O pai de santo André Vicente de Souza, 81, líder de um dos centros religiosos visitados pelas forças de segurança durante a megaoperação, conta que os frequentadores têm sofrido os efeitos da repercussão das imagens. “Fiquei bem chateado com (o fato de) terem vindo aqui, tirado as fotos e repercutido como se fossem de ‘ritual satânico’, ainda mais relacionado ao Lázaro. É desrespeitoso com a gente. O que fazemos aqui não tem nada a ver com qualquer criminoso”, ressaltou.

Em 21 de junho, agências de checagem desmentiram um vídeo publicado nas mídias sociais com imagens sobre a suposta prisão de Lázaro. O registro, na verdade, era de outra ocorrência, na qual um homem foi detido acusado de furtar um celular. No mesmo dia, circularam boatos de que o fugitivo havia escapado de Goiás — com menção a Mato Grosso do Sul —, além de fotos do procurado ao lado de políticos. Todas as insinuações eram falsas.

Legislação

Especialista em direito penal e constitucional, Acacio Miranda da Silva Filho destaca que a dimensão do problema das fake news, e até de brincadeiras na internet, é maior do que se pode imaginar: “Os trotes trazem custos e oneram o Estado. Para negar essas informações falsas, despendem-se tempo e buscas, pois as autoridades são tiradas (das responsabilidades) do dia a dia. Além disso, a população precisa entender que, com a divulgação dessas informações imprecisas, acaba contribuindo para a criminalidade, ainda que indiretamente”.

Em relação à publicação de fake news, Acácio lembra que ainda não há criminalização prevista em lei. “Alguns projetos tramitam no Congresso Nacional com esse foco. Em relação aos trotes, existe uma contravenção penal (na legislação), embora (a pena) seja relativamente branda. O indivíduo pode pagar de um a 360 dias de multa, a qual pode ser de meio até cinco salários-mínimos (R$ 550 a R$ 5,5 mil)”, explica Acacio. “(A força-tarefa) conta com a ajuda da população é importante, mas isso deve ser feito de forma parcimoniosa e centrada.”

Para tentar combater o problema, a Secretaria de Segurança Pública de Goiás (SSP-GO) fica responsável por repassar as informações oficiais sobre as buscas. Além disso, para evitar que os investigadores recebam direcionamentos falsos sobre o paradeiro de Lázaro, a força-tarefa criou dois meios para receber denúncias específicas sobre o caso: o telefone 61 998-395-284 e o aplicativo Brasil Mais Seguro, que funciona em um raio de até 100km a partir do distrito de Girassol, em Cocalzinho.

Prejuízos

Leonardo Sant’Anna, especialista em segurança pública, considera que o fluxo de comunicação é um dos maiores problemas enfrentados em buscas como essa. “Não só em relação à comunidade ou à informação que ela precisa ter para saber se comportar, mas também em relação às forças de segurança. Enquanto cidadã, a pessoa tem de saber se deve deixar o local onde mora, se o Lázaro está longe ou próximo da propriedade dela. Já a parte que envolve as equipes é justamente para direcioná-las a uma ação mais efetiva”, destaca.

Parte do impacto das fake news nas buscas se relacionam ao medo, segundo Leonardo. “As pessoas ficam confusas com o local em que ele (Lázaro) está, e isso aumenta o volume de ansiedade e estresse. Logicamente, traz um impacto social: moradores param de sair de casa, comércios deixam de abrir, escolas podem fechar. Uma informação mal colocada ou uma brincadeira de mau gosto a respeito desse tipo de caso, infelizmente, traz diversos problemas”, observa. “O desenrolar das investigações sofre efeitos devido a essa irresponsabilidade na hora de fazer denúncias.”

Pesquisas

Desde que Lázaro matou a família Marques Vidal, em 9 de junho, a procura pelo nome dele na internet aumentou cerca de 4.800% em 10 dias. Registros da plataforma Google Trends mostram que, naquela data, a busca pelo termo registrava dois pontos por dia no Brasil. Em 19 de junho, esse indicador subiu para 98. O número representa a taxa de interesse no assunto, com 0 significando que não há dados suficientes e 100 representando um pico de popularidade.

No mesmo período, o aumento foi de 54% no Distrito Federal. As buscas pelo nome de Lázaro não tinham registro de interesse quando ele cometeu a chacina no Incra 9, em Ceilândia Norte. Dez dias depois, a pesquisa atingiu relevância de 54 pontos. Na sexta-feira, quando as buscas completaram 17 dias, o termo marcava 48 pontos. O interesse se estendeu às mídias sociais. No Facebook, por exemplo, havia, ao menos, 346 perfis falsos com o nome, sobrenome e foto do foragido em 16 de junho.


Fake news

Confira algumas das informações falsas que circularam sobre o caso Lázaro

16 de junho
Surgem perfis falsos de Lázaro Barbosa de Sousa no Facebook
A polícia desmente a morte do foragido, após informação circular nas mídias sociais

19 de junho
Representantes de religiões de matriz africana denunciam fotos de supostos “rituais” erroneamente associados a Lázaro

21 de junho
Circula vídeo com imagens da prisão de um homem, mas suspeito detido não é Lázaro
Mensagens afirmam que Lázaro teria fugido em um caminhão e que as polícias de Goiás e do DF saberiam disso
Montagem fotográfica mostra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a namorada, Rosângela da Silva, e o correligionário Fernando Haddad segurando uma faixa com a frase “Lázaro é inocente”
Secretaria de Segurança Pública do Mato Grosso do Sul afirma que não há indícios de que Lázaro esteja na região, desmentindo informação publicada falsa nas mídias sociais

23 de junho
Outra montagem fotográfica circula na internet, mostrando Lázaro ao lado do ex-presidente Lula

 

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