Entrevista Andrea Jácomo, coordenadora do Departamento de Pediatria Ambulatorial da Sociedade de Pediatria do Distrito Federal

Urgência no retorno às aulas

Ao CB.Saúde, médica destaca a importância da volta ao ensino presencial para a saúde das crianças, desde que os protocolos de segurança sejam atendidos. Ela comenta sobre os órfãos da pandemia e avalia a interrupção de tratamentos oncológicos infantis

Ana Maria da Silva
postado em 22/07/2021 22:56
 (crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)
(crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

A retomada das aulas presenciais na rede pública ainda divide opiniões. Em entrevista ao CB. Saúde — parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília — a coordenadora do Departamento de Pediatria Ambulatorial da Sociedade de Pediatria do Distrito Federal (SPDF), Andrea Jácomo, reforçou a necessidade da volta às escolas, mas adotando todas as medidas sanitárias. À jornalista Carmen Souza, Andrea explicou, ontem, que, para muitas crianças e adolescentes, o colégio é o único local que aborda o desenvolvimento coletivo e individual, pessoal e mental desse público. “Eles precisam voltar. Muitos alunos da rede pública perderam o único local de segurança nutricional, alimentar, física e mental”, ressalta.


Este é o momento para a retomada das aulas?
Já passou, inclusive, do momento. Desde setembro de 2020, a Sociedade de Pediatria fala sobre a importância do retorno seguro das nossas crianças para as escolas. Desde outubro do ano passado, as escolas particulares voltaram com os protocolos de segurança. Pudemos acompanhar o comportamento da primeira onda com escolas públicas e particulares fechadas, e, na segunda onda, com escolas particulares funcionando. O comportamento na faixa etária pediátrica foi muito parecido, demonstrando que, com protocolos de segurança, é possível, sim, fazer esse retorno seguro. O nosso país é líder de semanas de escolas fechadas, isso amplia o abismo cultural, de futuro, de possibilidades e oportunidades para nossas crianças.

Tivemos confirmação da variação Delta e vemos aumento na taxa de transmissão. Ainda assim, a senhora avalia que os alunos podem voltar?
Eles precisam voltar. Muitos alunos da rede pública perderam o único local de segurança nutricional, alimentar, física e mental. Os pais também não têm condição de prover assistência educacional para essas crianças. Com a Delta, até o momento, não temos dados de ser uma cepa mais grave em criança, o que temos é de maior transmissibilidade. Então, é o momento de redobrar os protocolos.

De acordo com um levantamento do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), cerca de 57% das instituições têm o protocolo de cuidados em escolas definidos. Ou seja, tem metade das escolas que não seguem esses cuidados.
Isso é um absurdo, porque, depois de 53 semanas de escolas públicas fechadas, é inadmissível que o nosso país não tenha pensado e se preparado para esse retorno. Isso é triste, porque sabemos que a educação é o que dá a possibilidade de as nossas crianças mudarem o mundo, o futuro delas e das comunidades em que estão inseridas. É isso que nós, como pediatras, temos deferido, temos feito trabalho com pais e professores, por meio de aulas abertas, tentando mostrar que é possível, seguindo os protocolos.

A gente sabe que, para muitas crianças, a escola é o único momento de alimentação. Além de uma série de outras questões do desenvolvimento dos jovens
A gente fala que as crianças são vítimas não fatais da covid-19. Elas sofreram muito com o isolamento físico. Os adolescentes foram privados do convívio social, e é uma idade em que o cérebro precisa se privar do convívio com a família, e entrar em contato com outras realidades, formar suas personalidades. É algo que vai refletir na vida adulta. A isso os pais, os pediatras e os professores precisam ficar atentos no desenvolvimento das crianças. É um período crítico.

Um levantamento fala dos órfãos da covid-19. Existe uma estimativa de que, no mundo, um milhão e meio perderam pais, cuidador ou responsável direto. No Brasil, são 130 mil crianças nessa condição. Como isso afeta a saúde delas?
Um milhão e meio perderam o pai, a mãe ou o cuidador diretamente. Porque observamos isso, em que famílias inteiras perdem os pais e os avós, que, muitas vezes, eram a fonte de segurança econômica, física e emocionais. Esses órfãos, as esposas que ficaram viúvas, precisam da nossa atenção neste momento também, de cuidado com a saúde.

O câncer pediátrico tem sido afetado?
Foi um relato impressionante que tivemos em março de 2021. Uma publicação no The Lancet, mostrando a diminuição e o impacto. Foram mais de 200 países com várias instituições que trabalham com oncologia pediátrica. Do Brasil, tínhamos 10 envolvidas nesse estudo, mostrando redução do número de leitos disponíveis e descontinuação do tratamento. Estamos diante de uma situação, como é o caso do câncer infantil, que não podem esperar, perder tempo. Algumas batalhas são mais difíceis do que outras, e lidar com isso, durante a pandemia, foi um grande desafio e teve um grande impacto na saúde das crianças.

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