Crônica da Cidade

Alô, alô, marciano

Aqui quem fala é da Terra. Brasília, Brasil. Anos 2020. Alô, alô, marciano. Tu que podes até nem existir, já que nossos cientistas ainda não recolheram indícios suficientes para confirmar a possibilidade de vida em Marte. Mas caso habitasse mesmo o Planeta Vermelho, talvez, daí de longe, conseguisse enxergar em perspectiva nossa situação aqui no globo terrestre.
Pra variar, estamos em guerra. Tá cada vez mais down no high society. Imagine só, cogitam taxar as fortunas dos mais ricos. Isso reduzirá as desigualdades sociais, destacou um observador atento. Mas deixará os ricos mais pobres, emendou o mesmo cidadão. Veja o nível do dilema que enfrentamos. Diante de tal encruzilhada, só nos resta mesmo recorrer ao turismo espacial para espairecer.
Neste mês, inclusive, deve ser dada a largada dessa nova era de viagens que se pretendem um dia chegar ao nível interplanetário e, quiçá, intergaláctico. Só mesmo sonhando com desafios dessa magnitude para fugir dos problemas reais que afligem nossos povos castigados. Talvez seja essa a solução dos problemas da humanidade: exilar-se numa empreitada pelo espaço sideral aguardando respostas de extraterrestres.
Alô, alô, marciano. Você não imagina a loucura. Queria que Elis estivesse ainda aqui para interpretar os versos célebres da canção. Caprichar naquele agudo sarcástico do high society. Nunca o cada um por si fez tanto sentido quanto agora. É todo mundo na lona nesse salve-se quem puder.
Quem vive na miséria e na pobreza já se acostumou aos castigos sem justificativa da vida sofrida. Aos que têm condições de viverm melhor e um coração batendo no peito, assistir a esse sofrimento basta para sentir as amarguras da crise virando zona. Os que restam são igualmente coitados pela cegueira e falta de humanidade que os acomete.
Todas as nossas tentativas parecem em vão. Quando achamos que o conhecimento nos salvaria, veio um balde de fake news. Por medo e, muitas vezes, ignorância, mergulhamos nas águas geladas da trama de mentiras.
Quando pensamos que as evidências seriam suficientes para mostrar o caminho, descobrimos que elas não tiveram nem mesmo a popularidade do clássico da música sertaneja interpretado por Chitãozinho e Xororó.
Os fatos, a compaixão, o respeito e a fraternidade estão em baixa. Nem mesmo angariaram algumas centenas de curtidas nas redes sociais. Pagamos caro por um despertar que nunca chega. Tem muito rei aí pedindo alforria.