De casa nova
Na crônica As plantas e os cachorros, publicada em 17 de julho de 2021, contei a história de uma senhora que, há anos, morava na calçada, próximo a uma panificadora em Taguatinga Sul. O espaço parecia uma casa a céu aberto, ou melhor, um lar. Nele, havia muita história dessa mulher. Tinha colchão, sofá, malas com roupas, muitas plantas e uns cachorros. A moradora costumava se distrair ouvindo um radiozinho de pilha e interagindo com quem passava entre a casa dela (os pedestres na calçada). Ela, inclusive, recebia visitas (outros em situação de rua ou alguém da vizinhança disposto a ajudá-la).
Poucos dias após eu publicar o texto, soube que ela tinha sumido. Fiquei preocupado e perguntei aos vizinhos o que tinha acontecido. Para minha surpresa, disseram que ela ganhara uma casa e que havia se mudado. Mesmo sem ter a confirmação, contei a história para Irlam Rocha, grande nome do jornalismo cultural e amigo de trabalho. Ele arregalou os olhos e perguntou se a casa teria sido dada graças à minha crônica. Respondi que não, que seria muita coincidência.
A senhora desapareceu da região, e eu fiquei sem notícias dela. Porém, sábado passado, recebi uma mensagem da defensora Popular de Direitos Humanos Marga Oliveira. Ela contou que havia lido minha crônica e confirmou que a senhora Márcia Ferreira realmente havia se mudado, em 26 de julho, para uma casa doada por uma idosa, em Santo Antônio do Descoberto (GO). Marga, com o apoio do Instituto Ubuntu e de outros parceiros, conseguiu para Márcia tratamento dentário e óculos de grau. Um grupo de alunas da Universidade de Brasília (UnB) deu uma repaginada no visual dela, com tranças afro. “Mais do que isso, demos para ela visibilidade e cidadania”, resume Marga.
No último sábado, eles realizaram um bingo solidário no Bar do Kareka, em Taguatinga Norte, para custear o conserto do telhado da casa de Márcia. Segundo Marga, o valor arrecadado não foi muito, mas dará para pagar a mão de obra do serviço. O evento também foi uma oportunidade para Márcia conhecer um local diferente, explica a defensora. “Ela ficou tímida no início, disse que aquele não era o lugar dela, porque ela não cabia na sociedade. Antes, quando foram fotografá-la, ela disse: ‘eu não quero ser fotografada, eu quero ser vista’. Então, fizemos uma série de ações para dar um upgrade no visual dela, valorizando seus traços de mulher negra, de apenas 45 anos.”
Desses 45 anos de Márcia, 34 foram morando na rua. Agora, além de uma casa, ela tem uma rede de apoio. “Uma funcionária do POP, que é o serviço de acolhimento da população de rua, perguntou como conseguimos convencê-la a aceitar morar em Santo Antônio, porque eles tentaram muito. Eu respondi que ela só aceitou após trabalharmos sua autoestima”, complementa a defensora. Para ajudar Márcia na reforma do telhado da casa, basta entrar em contato pelo telefone: (61) 9 9904-4322 (Falar com Marga Oliveira, Joana Darc ou Roberto Schiavini).
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