Crônica da Cidade

Severino Francisco
postado em 17/10/2021 23:36

Energia oscilante

Que me desculpe o leitor em busca de alguma amenidade para escapar do sufoco, mas a crônica de hoje será de utilidade pública. Diversos governantes alardeiam a privatização como uma panaceia, o emplastro Braz Cubas de Machado de Assis, a solução mágica para todos os problemas de ineficiência, má gestão e maus serviços prestados à população. Mas a Neoenergia, empresa privatizada, que substituiu a antiga CEB, está aí para desmentir todos esses dogmas.
Vamos aos fatos. Moro em um condomínio horizontal e, a cerca de um mês, houve um pico de energia e ficamos sem luz durante dois dias. Isso nunca havia ocorrido antes. No período das chuvas, as interrupções do fornecimento de energia são frequentes e, não raras vezes, causam avarias nos equipamentos domésticos, mas jamais durante tanto tempo.
Pensei que só o nosso condomínio havia sido brindado com o problema. No entanto, logo constatei que ainda éramos privilegiados no contexto do caos, pois a situação era pior em vários outros locais. Alguns condomínios ficaram sem luz por cinco dias. No nosso, a energia demorou a voltar e, quando foi reestabelecida, veio fraca e descontínua. Algumas lâmpadas acendiam, outras. piscavam oscilantes.
Fui verificar a situação dos aparelhos domésticos. O sistema de internet parecia avariado, a geladeira não funcionou, a televisão deu pau. O fornecimento de energia permanecia intermitente, a luz vinha e se apagava. A primeira providência que tomei foi chamar um técnico para avaliar a situação da geladeira. As luzes de controle não se acendiam.
O técnico examinou a geladeira e sentenciou que o motor havia queimado. Perguntei quanto custava a troca de um novo e ele me respondeu: R$ 1.400. Antes, a CEB aceitava o laudo de qualquer técnico autorizado; agora, a Neonergia só aceita o técnico da empresa e pede cinco dias para enviar o profissional.
Argumentei com o funcionário: como é que eu vou ficar cinco dias sem geladeira? De nada adiantou a ponderação. O funcionário alegou que eram normas da empresa. Eu já estava disposto a arcar com o prejuízo da geladeira quando, dois dias depois, tudo voltou a funcionar normalmente. Simplesmente, mesmo depois de reestabelecida, a carga era ainda baixa e insuficiente.
Pois bem, passemos para a esfera pública. Na semana passada, os semáforos próximos à Câmera Legislativa permaneceram desligados por falta de energia durante seis dias. É isso mesmo: seis dias. Falo de cátedra, pois faço todos os dias esse trajeto para trabalhar. O perigo para os pedestres, ciclistas e motoristas era enorme. Raramente, detectei a presença de um guarda ou funcionário do Detran para ordenar o trânsito. É muito descaso com a vida dos cidadãos.
O caso da Neoenergia deveria nos fazer refletir sobre a panaceia da privatização. Não digo também o contrário: que a estatização é a solução mágica para tudo. Depende de muitos fatores. Por exemplo, a privatização da Eletrobrás inseriu tantos jabutis que, ao fim, o consumidor é que pagará a conta. Suas excelências só faltaram incluir um orçamento secreto nas despesas.
Como se vê, no caso da Neoenergia, não houve nenhum cuidado em exigir compromissos de prestar serviços de qualidade para o consumidor. Essas privatizações levam pouco (ou nada) em conta o interesse público. De que adianta mudar o estatuto de uma empresa para piorar a vida dos cidadãos?

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