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O fascinante sabor do tucupi

Derivado da mandioca-brava-amarela, o caldo fermentado é uma iguaria bastante apreciada. Empresa criou uma forma de conservar o produto sem química ou refrigeração

Liana Sabo
postado em 06/11/2021 00:01
 (crédito:  Arquivo Pessoal)
(crédito: Arquivo Pessoal)

Para o folclorista Câmara Cascudo, ela é "a rainha do Brasil", ao se referir à mandioca, com a qual os povos indígenas fizeram o tucupi, o polvilho, a farinha de tapioca e, das folhas, a maniçoba. Mas é o tucupi, o ingrediente mais cobiçado por nove entre 10 chefs de cozinha que contemplam a culinária brasileira. É feito a partir da fermentação do caldo extraído da mandioca-brava-amarela e consiste no tempero mais emblemático da gastronomia amazônica, que pode ser utilizado em qualquer receita e até mesmo armazenado sem precisar de refrigeração, mantendo todas as propriedades sensoriais e a segurança alimentar.

Quem conseguiu essa façanha foi a startup paraense Manioca, criada em 2014, que, depois de anos de pesquisa, sem adição de nenhum aditivo ou conservante, apenas o desenvolvimento de um processo tecnológico específico, embalou o precioso líquido da floresta para uso funcional. O reconhecimento veio de fora, justamente da pátria-mãe da alta gastronomia. Em um evento realizado em Lyon, na França, no fim de setembro, o produto ganhou um prêmio de inovação em alimentos.

Coube a Joanna Martins, diretora da indústria de alimentos naturais da Amazônia, defender as cores do tucupi amarelo engarrafado, que conquistou o Sirha Inovations Awards 2021. Além do tucupi, o portfólio da Manioca reúne outros temperos, molhos, farinhas e geleias — todos produtos à base de ingredientes da floresta. Joanna é filha de Paulo Martins, que foi o embaixador informal da culinária paraense e idealizador do evento culinário Ver-o-Peso, que já não se realiza mais em Belém.

Comida da floresta

Manaus (AM) passou a ser a capital para a promoção do sabor da Amazônia. "Depois de três edições voltadas para chefs convidados de outras partes do Brasil e também de renome internacional, sem que necessariamente tivessem foco na cozinha amazonense, a quarta edição da Feira Internacional da Gastronomia Amazônia (Figa) se volta para a cozinha de raiz dos estados contemplados pela gigante Amazônia", pontuou Denise Araújo, curadora do evento, realizado em outubro. Foi ela quem garimpou, entre outros nomes da região, o do chef colombiano Eduardo Martinez, um agrônomo que se tornou cozinheiro.

"Cozinhar é uma forma de cultivar a floresta", é o que afirmou o chef colombiano, em palestra. Quando deixou de se interessar pelo mundo da soja, do milho, da palma africana (dendê que produz azeite), Martinez encontrou, na cozinha, a resposta à pergunta de como transformar a grande biodiversidade em uma oportunidade econômica para as comunidades locais. Atualmente, ele toca alguns projetos, além de seu restaurante Mini-Mal, em Bogotá, que pratica a cozinha colombiana contemporânea. Na região de Letícia, próxima à fronteira brasileira, a cidade de Tabatinga (AM), mantém a empresa Selva Nevada de fabricação de sorvetes de frutas amazônicas cultivadas em 11 comunidades, onde 500 famílias processam açaí, camu-camu, cupuaçu, araçá e outras.

Umami

Sobre o tucupi negro, o chef colombiano contou que provou a primeira vez há 16 anos e, até hoje, se impressiona com "a complexidade do sabor e o nível de umami tão poderoso e profundo a partir de um ingrediente vegetal, como a raiz de mandioca, cujo estado natural é quase neutro, e ainda mais vindo de uma planta venenosa".

Em Brasília, quem mais entende de tucupi é o chef-restaurateur Francisco Ansiliero, profundo conhecer dos sabores da Região Norte, desde que morou em Rondônia, há mais de 30 anos, antes de vir para a capital. Para o festival Gosto da Amazônia, realizado em outubro, Francisco desenvolveu um prato com filé de pirarucu grelhado, molho de arubé (redução do tucupi), castanha-do-Brasil e farofinha de jambu com banana da terra que, diante da demanda, permanece no cardápio.

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