CB.SAÚDE

Excesso de medicação preocupa

O professor de microbiologia da Universidade de Brasília Alex Pereira falou sobre a relação do excessivo de antibióticos, durante a pandemia, com o surgimento de bactérias multirresistentes

Ana Maria Pol
postado em 26/11/2021 00:01
 (crédito: Ed Alves/CB/DA Press)
(crédito: Ed Alves/CB/DA Press)

O Laboratório de Pesquisa em Infecção Hospitalar da Fiocruz registrou um aumento três vezes na detecção de bactérias resistentes a antibióticos, em comparação ao que foi analisado em 2019, último ano antes da pandemia da covid-19. Para o professor de microbiologia da Universidade de Brasília (UnB) Alex Pereira, os dados são alarmantes. Em entrevista ao CB.Saúde, uma parceria do Correio com a TV Brasília, ontem, o especialista analisou o futuro do país com o avanço do uso excessivo de antibióticos.

Em conversa com a jornalista Carmen Souza, o professor falou que, com a crise sanitária, surge uma apreensão quanto às possibilidades de o paciente desenvolver infecções secundárias. "Para evitá-las, lançou-se o uso profilático de antibióticos, ou seja, o uso para prevenir uma possível infecção bacteriana", explica. Há, ainda, o uso do remédio em pacientes hospitalizados. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), em 2050, o número de mortes em razão das superbactérias será de 10 milhões por ano, para o professor, com a pandemia, esse número pode aumentar. Confira alguns destaques da entrevista.

Pensando para além da pandemia, a longo prazo, qual será a consequência desse cenário de uso exagerado de antibióticos?

Existe uma relação direta entre consumo de antibiótico e a frequência de infecções por bactérias multirresistentes. À medida que aumenta o consumo, leva à seleção mais frequente de bactérias, e o risco de contato com uma bactéria super resistente aumenta. Então certamente estamos em um momento que mudamos o uso de antibiótico, também mudamos o patamar de frequência das infecções multirresistentes

Passado o cenário pandêmico, a tendência é de que essas infecções aumentem. Quanto tempo durará?

A aquisição de resistência a antibióticos ocorre mais rápido do que a perda da capacidade de resistência pelas bactérias. Então, não se espera que esse novo patamar tenha uma regressão fácil. Ao longo da história, não temos visualizado regressão dos padrões de resistência em bactérias.

Existe uma pesquisa voltada ao cenário do DF. Como estamos?

Analisamos a dispersão de bactérias hospitalares multirresistentes através do esgoto, no Distrito Federal. Coletamos análises de esgoto em estações de tratamentos, para avaliar se as bactérias multirresistentes chegavam até os locais. Muitos pensam que elas só crescem em ambientes hospitalares. Isso não é verdade. Sendo assim, podem escapar do ambiente hospitalar. Quando um paciente colonizado pela bactéria deixa o hospital e vai para casa, tende a levá-la consigo. Esse estudo, que está passando pela revisão de uma revista internacional, mostrou que estações de tratamento de esgoto que servem a áreas que concentram hospitais têm maior frequência de ocorrência de bactérias multirresistentes, mostrando uma relação direta de ambientes que fazem uso massivo de antibióticos, e a presença dessas bactérias.

Um outro projeto que o senhor participa desenvolve o kit de diagnóstico da covid-19. Em que pé está essa pesquisa e como vai funcionar?

O diagnóstico envolve um teste que é baseado no RT-PCR, resultado que mostra se você está infectado pelo Sars-COV-2. O que vimos é que existem variantes. O vírus é o mesmo, mas, geneticamente, são diferentes. Eles passam a acumular mutações, que dão origem a diferentes variantes. Alguns têm mostrado resistência parcial à imunização. Até o momento, as vacinas são eficazes, mas precisamos manter a vigilância, porque, certamente, outras surgirão. Nesse cenário, houve ocorrência de duas variantes, a gama e a delta. Então, neste momento, o Hospital Universitário de Brasília (HUB), desenvolveu um teste para identificar as variantes alfa, gama e delta. O teste é baseado na mesma lógica do RT-PCR, e consegue diferenciar as variantes em uma reação que leva aproximadamente duas horas e meia.

É um teste mais barato?

É mais barato do que a técnica tradicional para identificar variantes, que se chama sequenciamento genético. Ela é mais cara e leva mais tempo. Nós reduzimos o valor em 10%, usando a técnica baseada em RT-PCR. Nossa intenção não foi comercial, mas sim de aumentar a capacidade de vigilância no DF.

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