Em fevereiro, o jornal The New York Times publicou uma receita revisitada do espaguete à carbonara, ícone da culinária italiana. Chamou-a de smoky tomato carbonara, acrescentando-lhe um ingrediente que os italianos adoram, o tomate, porém inaceitável na carbonara. Ainda por cima, a receita trocou o guanciale (bochecha gorda e curada do porco) ou a pancetta pelo bacon, igualmente banido na interpretação autêntica. A reação foi imediata. O chef romano Alessandro Pipero, intitulado "rei do carbonara", declarou: "carbonara com tomate não é carbonara; e usar bacon equivale a fazer um sushi com mortadela", numa entrevista ao Corriere della Sera, de Milão.
Para que os executores da gastronomia italiana não cometam heresias é que a Federazione Italiana Cuochi (FIC), presente em 30 países, inclusive o Brasil, onde tem a maior delegação fora da Itália, com 450 filiados, promove cursos para os seus associados. Como o Up Grade Culinária Italiana, realizado segunda-feira, no Taguatinga Shopping, com 18 cozinheiros. Além da bela decoração de Natal no interior do centro comercial com uma árvore de 33 metros de altura e 400 mil leds, os participantes puderam ver, no Espaço Gourmet instalado na cobertura, uma fiel demonstração da "verdadeira e tradicional cozinha italiana", no dizer do chef Diego Koppe, diretor financeiro da FIC nacional.
Por lá, passaram o chef Bruno Stippe, presidente da Federação no Brasil, desde 2006, que comanda a Cantina Ce que Sabe, em São Paulo; o chef-consultor Roberto Ravioli, fundador do restaurante e empório Ravioli, na capital paulista, que fechou na pandemia; o chef Rosario Tessier, da Trattoria da Rosario, que deu aula de nhoque; entre outros. Uma das principais recomendações aos cozinheiros foi a de investirem em marcas italianas de qualidade comprovada para garantir bom resultado, especialmente em relação às farinhas — de sêmola de grano duro e as do tipo 00 — que "tenham elasticidade suficiente para serem esticadas sem romper".
Café dos pescadores
Não faltaram clássicos da cozinha, como antepastos italianos de origem bem antiga. Tanto a sardella como a alichella (ambas feitas com filé de anchova) são receitas centenárias que já foram, um dia, o café dos pescadores, que, em busca dos cardumes de peixes no Mediterrâneo, levavam o aliche salgado para o barco e produziam pastas para serem comidas com biscotti, pão torrado típico do Sul da Itália, muitas vezes amolecidos com a água do mar.
Além das massas, que todo o brasileiro adora, como a macarronada de domingo, tem o risoto do qual se fala há quase 500 anos. Desde que o risotto alla milanese foi criado em Milão, em 1574, pelas mãos do mestre Valério de Fiandra, "o mundo ganhou uma nobre e encantadora maneira de se consumir o arroz", ressalta a apostila, que prega a ordem da entrada dos ingredientes na panela, que pode contar com carnes, crustáceos, verduras, frango, pato, caça, bacalhau, queijos, etc. De um modo geral, primeiro vai a cebola ralada refogada na manteiga, depois os grãos de arroz, vinho branco, o fundo, tempero e finalização com manteiga e parmesão.
Pacifista
O curso chega a Brasília depois de cumprir um roteiro que passou por São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Espírito Santo, com o objetivo de aprimorar os conhecimentos e as técnicas dos chefs especializados na cultura italiana. Além de pratos salgados, como o delicioso cacciucco da Ligúria, espécie de caldeirada de frutos do mar com molho de tomate, confeccionado por Roberto Ravióli, vice-presidente da FIC Brasile, foram dadas lições de confeitaria pela chef Lucia Cappelletti que, ao lado do marido, o chef Lino Iluliani, secretário-geral da FIC, tocam a cantina Bella Italia, em Bragança Paulista. Segundo lembrou Lino, a confeitaria deve muito à Catarina de Médici que, quando saiu de Florença para se casar com Henrique II, da França, "levou equipe de cozinheiros e confeiteiros, receitas e o hábito de se comer com talheres".
O dirigente Bruno Stippe avalia que "nada tem vocação mais pacifista que a cozinha, que é capaz de colocar lado a lado antagonistas". O chef afirma que, quando o cliente está sentado no restaurante, não sabe sequer quem é que está preparando a refeição.
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