Indicado ao Oscar como melhor documentário curta-metragem, a produção norte-americana Onde eu moro não é apenas comovente, mas também impactante. É inimaginável que em um dos países mais ricos do mundo exista uma população em situação de rua estimada em mais de meio milhão de pessoas, em 2020, de acordo com o Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano dos EUA.
No Brasil, em março de 2020, quase 222 mil pessoas estavam nessas condições, de acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). A pandemia deve ter inflado ainda mais esses números.
Disponível no Netflix, o filme aborda a questão em três cidades: Seattle, São Francisco e Los Angeles. Os depoimentos das pessoas em situação de rua giram em torno da crise econômica e da falta de oferta de moradia a preços acessíveis, aliado a outros problemas como desemprego, questões psicológicas, uso de drogas e abandono familiar. A temática nos faz refletir sobre nosso quintal, evidentemente.
O Distrito Federal teve uma população em situação de rua estimada em quase 2.500, no ano passado, de acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes). Os motivos são praticamente os mesmos que os das três cidades norte-americanas mostradas no documentário. Aqui, soma-se também o fator sazonalidade, com pessoas vindas de outras unidades da Federação em determinada época do ano.
Programas do governo e trabalhos de organizações governamentais não são suficientes para diminuir de forma considerável o problema, infelizmente. Há, ainda, o fato de nem todos saberem que podem contar com os auxílios, governamentais ou de ONGs. Dica: invistam mais em comunicação para quem necessita dessas informações, e não apenas para quem precisa ver que o governo faz algo. Ideias como pontos de apoio fixos a essa população na Praça do Relógio, em Taguatinga, ou no Conic, por exemplo, também poderiam ser avaliadas.
Sempre que possível, além de uma ajuda financeira, eu passei a transmitir informação a quem me pede um trocado. Alguns dizem não saber que podem ser assistidos por auxílios governamentais ou não sabem onde encontrar o apoio de ONGs. Outros, por exemplo, descartam a hipótese de ir para um abrigo por motivos como violência e roubo praticados por outros moradores desses locais.
Lembrando do nome do documentário norte-americano, refleti sobre minha condição. Onde eu moro (?). Sou muito privilegiado. Tenho minha residência própria, pago só condomínio, energia e IPTU. Tenho dinheiro para necessidades básicas e ainda guardo um pouco para dias piores (no Brasil, sempre temos de estar preparados para isso). No fim, parece que vivo num paraíso. Mas o problema do outro, que está ao meu lado, grita. E é um grito de desespero.
E o que fazemos ou podemos fazer? Às vezes, bate uma sensação de impotência, aliada a uma certa tristeza e desesperança. Dia desses, caminhando em direção ao ponto de ônibus, avistei um senhor parado numa esquina. Tinha a idade para ser meu avô, e, em mãos, uma enxada. Creio que tinha onde morar, já que pedia dinheiro para comprar gás de cozinha. Na pressa, não parei para conversar com ele ou ajudá-lo financeiramente. Poderia falar do Cartão Vale Gás, do governo local, ou dar algum trocado. Mas segui apressado para o trabalho.
Talvez eu pudesse ter feito algo, alguma diferença. Mas não fiz. Isso acontece não apenas comigo, mas com muitas outras pessoas que podem ajudar, seja com dinheiro ou com informação. No fim, restou-me a frustração naquele momento. Mas que ela nos dê forças para mudar algo.
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