Quando o cliente perde a razão

Especialistas alertam que estar atento ao Código do Consumidor ajuda as duas partes, que podem entrar em consenso sem precisar acionar a Justiça

Eduardo Fernandes*
postado em 18/04/2022 00:01
 (crédito: THIAGO FAGUNDES)
(crédito: THIAGO FAGUNDES)

A relação entre comerciante e consumidor é, algumas vezes, marcada por discussões. Em algumas situações, o consumidor pode não estar com a razão. Qual o limite de exigências que o comprador pode fazer? O que a empresa não precisa acatar e fazer em episódios de ameaças ou imposições?

O advogado e especialista em direito do consumidor Marcello Aragão alerta que a melhor forma de o comerciante evitar possíveis atritos é estando atento às normas e seguir estritamente o Código de Defesa do Consumidor (CDC). De acordo com ele, o maior direito dentro do relacionamento consumerista é o que privilegia a informação sobre as condições de compra e garantia do produto ou serviço.

Gerente de uma papelaria e loja de variedades no Setor Comercial Sul, Cláudio Souza Gomes, 33 anos, lidou com um fato de extremo desgaste e estresse. Uma cliente criou problemas por conta de uma suposta troca de valores vinculados a dois produtos iguais. Um copo custava R$ 12,99 e o outro R$ 24,99. A diferença entre ambos era o tamanho. Contudo, o item de maior valor não contava com o preço na placa e, sim, no próprio objeto. Com isso, a mulher, que queria levar as duas mercadorias pelo mesmo valor, informou que o lojista estava mentindo.

Para provar que não havia irregularidade, Cláudio subiu até a parte alta da prateleira onde se encontrava o produto e confirmou a diferença de preço. Em momento de raiva, ele descreve que a cliente proferiu palavras de baixo calão e o ameaçou — dizendo que colocaria o comerciante na Justiça — e o empurrou. "Ela começou a me filmar e, pela confusão proporcionada, acabei a deixando com os copos pelo valor que ela queria: R$ 12,99", diz.

Para evitar problemas e uma possível polêmica, o gerente da loja decidiu ceder à pressão, mesmo provando para a cliente que os dois copos estavam à venda por valores diferentes. Chateado, Cláudio revela que se sentiu injustiçado, mas que situações assim são recorrentes.

Troca e garantia

Eliana Damasceno, 40, é dona de uma empresa de eletrônicos há mais de 15 anos. Ao longo desse período, ela ressalta que é comum lidar com todos os tipos de clientes, inclusive, aqueles que desejam sair por cima do comerciante e ganhar discussões sem ter a razão. No caso mais recente, ela cita um consumidor que, na compra de um carregador, perguntou se o produto teria garantia. A lojista, então, esclareceu que apenas a fonte, sem a parte do cabo, portava a segurança de mercadoria dada ao usuário.

Após dois meses, o cliente retornou à loja alegando que queria trocar o item comprado, pois, segundo ele, o fio do carregador estava danificado. Novamente, foi reiterado pelo estabelecimento que era fornecido novo produto em casos de deterioração da fonte, já que o cabo não possuía garantia, uma vez que os estragos foram feitos por mau uso do próprio comprador.

Apesar das diversas explicações, os comerciantes forneceram outro acessório para evitar confusões no estabelecimento. "A gente testa aqui com as pessoas e damos garantia apenas no equipamento, não nos cabos ou fios. Mas, mesmo assim, a clientela volta para realizar consertos em peças que não estão na garantia e que eles mesmos quebraram", complementa.

Em caso de trocas, a advogada especialista em direito do consumidor Erika Leite afirma que o consumidor pode exigir, por exemplo, um novo produto se esse apresentar algum problema dentro da garantia legal. Além disso, o cliente pode reivindicar a troca de itens de mostruário, que muitas lojas alegam não possuir garantia. "Se o produto de mostruário possuir alguma avaria e o consumidor for informado a este respeito previamente, apenas este problema em específico é que não pode ser objeto de reclamação posterior. No mais, em relação a outros problemas que possam aparecer, o consumidor poderá recorrer normalmente à garantia", explica.

Erika ressalta que esse aviso prévio deve ser informado, obrigatoriamente, pelo comércio responsável pela venda. A ausência dessa informação afronta diretamente os princípios basilares do Código de Defesa do Consumidor, como a transparência e boa-fé objetiva. De acordo com o CDC, a troca pode ser efetuada quando o produto for adquirido por nota fiscal em lugar autorizado; estiver no prazo de garantia do fabricante; ou se o vício for de fábrica e o fornecedor não conseguiu saná-lo em 30 dias.

Marcello Aragão aponta uma dica que deve ser seguida, tanto por lojistas quanto pelos consumidores: procurar órgãos de proteção ao consumidor como o Procon ou o site www.consumidor.gov.br para tirar dúvidas e resolver as confusões diárias. Ele frisa que, caso o problema não seja solucionado, os envolvidos devem procurar o Judiciário por meio de um advogado ou por conta própria nas assistências judiciais no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT).

 

*Estagiário sob a supervisão
de Adson Boaventura

Reparo em automóvel

Extra Veículos

Vitor Pereira Paulo Moreira

Valparaíso (GO)

O auxiliar de manutenção Vitor Pereira Paulo Moreira, de 31 anos, morador de Valparaíso (GO), entrou em contato com a coluna Grita do Consumidor devido a problemas que teve ao fazer reparos em seu carro na empresa Extra Veículos. Vitor relata que deixou o automóvel no estabelecimento para que fossem consertados painel, vidro traseiro, dentre outros, além de polimento. "Me disseram que os reparos levariam três dias, mas o carro ficou com eles por 15 dias", afirma. Mesmo após tanto tempo na oficina, somente o painel foi arrumado, e ainda bateram o carro. Segundo o morador de Valparaíso, ainda há serviços a serem feitos, como alinhamento das rodas traseiras e dianteiras direita, além da troca de parafusos de roda. Porém, o estabelecimento parou de responder.

Resposta da empresa

A oficina informou que os reparos no capô e no painel foram feitos. A Extra Veículos também pontuou que o caso da batida poderá ser resolvido sem custos. "Pode trazer o carro que iremos repará-lo", declarou a gerência do estabelecimento. A loja afirmou que a falta de resposta ao cliente se deu por saídas frequentes de funcionários, o que pode acarretar perdas de conversas.

Resposta do consumidor

Já tem três meses que estou ouvindo esse tipo de resposta. Ele fala que vai reparar o carro em um dia. E se ele não devolver? Pois se demorou 15 dias antes, tenho certeza que não entrega em um. Só para polir o carro leva o dia todo. Se for pintar a parte que bateu, não consegue polir. Aí já foram dois dias, ou seja, não será como ele falou. Ainda há outros reparos que precisam ser feitos. Estou correndo atrás, porque é um direito meu. Se ele vai me vender o serviço, tem que ser algo que preste.

Entrega de armário

Planejado Magno

Maria Angélica Gonsalves Correa

Guará 2

A servidora pública Maria Angélica Gonsalves Correa, 59, moradora do Guará 2, entrou em contato com a coluna Grita do Consumidor para relatar problemas com a empresa Planejado Magno. Ela conta que, em 6 de janeiro, fez a compra de um armário sob medida e a troca das portas de um armário que já tinha. A entrega ficou marcada para 17 de fevereiro. "Ansiosa para trocar os móveis, passei a acompanhar a data de entrega e, quando faltavam três dias para o dia programado, contatei a empresa, questionando sobre a retirada do armário e portas existentes", afirma. A partir daí, deu-se uma série de atrasos na entrega. A consumidora também afirma que em 18 de março recebeu fotos do produto, as quais não condiziam com o que foi pedido. Por fim, em 28 de março, foi realizada a entrega. "Instalaram o caixote que não corresponde ao que foi solicitado, uma vez que as medidas não estão de acordo e, também, não trouxeram as portas", relata. A consumidora narra que, depois do ocorrido, resolveu aceitar a entrega errada, mas questionou sobre as portas dos armários, que tiveram a entrega agendada para 28 de março, o que não ocorreu. Também não houve mais resposta da empresa. 

Resposta da empresa

A empresa informou que a contratação dos serviços foi feita em  6 de janeiro, mas que a entrega estava prevista para ocorrer em até 35 dias úteis (25/02/2022). Também foi informado que a empresa passou por "problemas de logística em razão de caso fortuito e força maior", mas que a consumidora foi informada sobre o motivo e sobre a nova data de entrega (06/04/2022), com nota fiscal. "Sendo assim, a empresa continua à disposição da consumidora para eventuais reparos conforme garantia", esclarece a Planejado Magno.

Resposta da consumidora

Eu já me manifestei, por intermédio do profissional deles, que não vou aceitar essa porta, não foi isso que eu paguei. A empresa não retornou sobre a troca da porta, aliás, como nunca se manifestou sobre nada. E os "casos fortuitos" de força maior alegados, foram covid e guerra na Ucrânia. Também foi uma luta para conseguir a nota fiscal.

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