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Ações sociais ameaçadas

Instituições beneficentes parceiras que executam serviços sócio-assistenciais no DF reagem contra decisão da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) de não prorrogar termo de colaboração dessas entidades

Ana Maria Pol
postado em 14/06/2022 00:01
 (crédito: Material cedido ao Correio )
(crédito: Material cedido ao Correio )

Pais e representantes de instituições beneficentes parceiras que executam serviços sócio-assistenciais no Distrito Federal fizeram uma manifestação, na manhã de ontem, contra a não prorrogação do termo de colaboração com a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes). Mais de 200 pessoas se reuniram na quadra 515 da Asa Norte, ao lado do Banco do Brasil, para evitar que as organizações do DF corram risco de fechar as portas até o final deste mês, por falta de prorrogação do termo. O contrato com a pasta responsável por realizar o repasse financeiro para essas entidades beneficentes termina em 30 de junho.

As instituições firmaram termos com a Sedes em 2016, pelo prazo de cinco anos. Em 2021, a parceria venceu e a secretaria prorrogou os termos por mais 12 meses, para que, neste período, fosse lançado um edital, que veio a ser publicado no início do ano. O edital chegou a ser cancelado e reeditado. Agora, a 17 dias do encerramento de todos os termos de cooperação, as instituições aprovadas ainda não foram convocadas para assinarem o novo termo, e outras entidades foram desclassificadas dos novos chamamentos.

Advogado do Conselho de Entidades de Promoção e Assistência Social do DF (Cepas-DF) — que organizou a manifestação —, Thiago De Castro diz que as organizações foram desabilitadas devido ao "excesso de formalismo dos termos de cooperação criados". O edital 23, por exemplo, de fortalecimento de vínculos a crianças e adolescentes, é um exemplo. "Ele criou um excesso de formalismo tão grande que diversas instituições que atuam há mais de 20 anos em parceria com a Sedes, foram desclassificadas por critérios totalmente absurdos, e vão ter seus serviços descontinuados", cita Thiago.

Dentre as instituições que devem fechar as portas, estão nomes conhecidos no DF, como a Casa Azul, em Samambaia; a Ampare-DF, na Asa Norte; e o Centro Formar, no Paranoá. "Por exemplo, a Casa Azul, é uma instituição renomada, que atende 800 crianças em Samambaia e tem o prêmio de melhor ONG do Brasil por quatro anos seguidos. A proposta deles não foi classificada devido a excesso de rigores técnicos totalmente inconcebíveis", explica o especialista.

Ainda, de acordo com Thiago, nenhuma outra instituição da região chegou a ser aprovada para receber essas crianças e adolescentes. "Temos um problema em Samambaia, porque não haverá serviço de fortalecimento de vínculos para crianças e adolescentes", alerta. Outras cidades, como Recanto das Emas, Paranoá, Estrutural devem ter descontinuidade, porque não conseguiram cumprir os termos técnicos excessivos da Sedes e foram desclassificadas. Segundo Thiago, os critérios estabelecidos não foram esclarecidos pela pasta.

Sob risco

A doméstica Gilvane Cardoso dos Reis, 36 anos, é uma das mães assistidas pela instituição Casa Azul, que está sob risco de fechamento. Há cerca de cinco anos na organização, a moradora de São Sebastião conta que os três filhos foram assistidos pelo local, sendo que o mais velho, de 18 anos, conseguiu ser inserido no mercado de trabalho graças aos cursos de capacitação oferecidos pela casa de acolhimento. "Eu fui na assistência social, porque meus meninos estavam sem ter o que fazer, ficavam em casa sozinhos. Aí consegui uma vaga nesse projeto social, que evita que jovens e crianças estejam nas ruas", cita.

A mãe, que participou da manifestação ontem, contou que a preocupação com o possível fechamento da Casa Azul faz parte da realidade dos pais assistidos. "Eu trabalho, assim como os outros pais. E meu filho vai ficar onde, enquanto estiver trabalhando? Provavelmente em casa, sozinho, porque não tenho condições de pagar alguém. Então peço, como mãe, que os governantes pensem nos jovens e crianças das nossas cidades. Nossos filhos são orientados, assistidos nesses locais. Precisamos disso", pede.

Presidente do Cepas-DF e fundadora da Casa Azul, Daise Lourenço divulgou, nas redes sociais, um vídeo em que faz um apelo à secretária da Sedes, a primeira dama do DF, Nayara Rocha, com o intuito de sensibilizar e interceder junto à sua equipe de gestão. Segundo Daise, hoje são atendidas 3.500 crianças e adolescentes no contraturno escolar nas regiões de grande vulnerabilidade social. De acordo com o resultado definitivo do edital nº 23/2022 da Sedes, só serão atendidas 550, fazendo com que aproximadamente 2.950 crianças e suas famílias fiquem desassistidas pela rede de proteção social básica. Além disso, 300 idosos deixarão de ser atendidos no Serviço de Convivência.

"Vocês sabem para onde irão as crianças e adolescentes? Para o trabalho infantil, para a exploração sexual, ou devem parar na Secretaria de Justiça. E as famílias? Vão engrossar as filas do Cras, do Creas, ou vão para as ruas. E os idosos? Vão para a Secretaria de Saúde ou abrigos, porque as famílias não vão ter como protegê-los", reiterou a presidente. "O que importa não é se as instituições vão fechar ou não. São as pessoas que estão sendo assistidas por elas e ficarão desamparadas, e os trabalhadores que ficarão desempregados", lamentou.

Normas gerais

O Correio procurou a pasta para esclarecimento dos fatos. Em nota, a pasta informou que o encerramento das parcerias não decorre da vontade da administração pública, mas, sim, do prazo estipulado segundo os termos da Lei 13.019/2014, que institui normas gerais para as parcerias voluntárias. De acordo com a Sedes, os chamamentos públicos ainda estão em andamento e, portanto, "não há como adiantar informações a esse respeito". "Importante colocar que houve audiência pública referente a todos os editais publicados pela Secretaria e que não houve impugnação a nenhum deles. A gestão está trabalhando para que nenhuma família fique desassistida e para que não haja interrupção dos serviços sócio-assistenciais", garantiu.

Ainda, segundo a pasta, todas as entidades atualmente parceiras tiveram a oportunidade de participar dessas novas seleções. "Ocorre que nem todas conseguiram se habilitar ou se classificar nos novos chamamentos. Dessa forma, faremos a transição entre as parcerias que estão vigentes e as que serão firmadas no âmbito dos novos chamamentos públicos. Importante lembrar que não haverá interrupção dos serviços para a população", disse a secretaria.

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