Heróis Brasileiros

Correio Braziliense
postado em 19/06/2022 00:01

Mais uma vez, os índios deram ao Brasil uma lição de solidariedade, de civismo, de organização e de coragem no episódio do desaparecimento e das mortes bárbaras do jornalista Dom Phillips e do indigenista Bruno Pereira, no Vale do Javari. Os indígenas já tinham um serviço de inteligência, monitoraram o movimento de Dom e Bruno e detectaram a presença suspeita do pescador Amarildo da Costa Oliveira.

A linha de investigação que elucidou a autoria do crime foi delineada pelos índios. Chegaram a montar um acampamento flutuante na área. Desde que Dom e Bruno desapareceram, eles apontaram Amarildo como o principal suspeito. A partir daí, a polícia prendeu o pescador e o interpelou.

O maior esforço de busca dessa operação foi dos mais de 100 índios de cinco etnias: Matis, Kulinas, Kanamaris e Marubos. Eles guiaram as equipes do Exército, da Polícia Federal e da Marinha. Fizeram e ainda fazem uma varredura na mata e no rio. Os índios encontraram os pertences de Dom e de Bruno, e também o barco de Amarildo.

As equipes de voluntários indígenas foram treinadas pelo próprio Bruno Pereira, em evento promovido pela Univaja, União das Organizações Indígenas do Vale do Javari, no ano passado. Por tudo isso, foi vergonhosa a omissão da participação dos índios, durante a entrevista coletiva dos delegados responsáveis pela elucidação das mortes de Dom Phillips e de Bruno Pereira.

Como se não bastasse, ainda declaram, atropelando o processo de investigação, que não existem mandantes para o crime. A Univaja se manifestou, discordando da Polícia Federal, pois enviou inúmeros ofícios apontando suspeitos, mandantes, métodos e rotas utilizadas para invadir o território indígena. Nem depois de um crime tão estarrecedor, eles são ouvidos.

Ao conhecermos a realidade do Vale do Javari fica a dúvida sobre para que o governo quer soberania nacional? Para deixar a Amazônia como uma terra sem lei, comandada pela criminalidade? Enquanto os meliantes dominam a Amazônia, altas autoridades da República caçam o fantasma das falhas nas urnas eletrônicas, sem ter a mínima prova.

Dom e Bruno eram duas pessoas extraordinárias. Bruno foi demitido, quando ainda era coordenador-geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai, porque comandou uma operação que culminou na destruição de 60 balsas que desenvolviam atividades ilegais no rio Jandiatuba, situado dentro de terras indígenas no Vale do Javari. É assim, os funcionários que cumprem a lei são demitidos, os incompetentes, são condecorados.

Nos vídeos que circularam pelos programas de tevê, quando está com os índios, Bruno aparece feliz, cantante e risonho. Quando volta ao mundo dos brancos, ele fica circunspecto. Essa tragédia deveria ser um marco na luta em defesa dos índios e da Amazônia; Bruno Pereira deveria se transformar no nome de um instituto nos moldes do Instituto Chico Mendes. Bruno Pereira é um herói brasileiro. Mas esse crime estúpido não pode mais se repetir, pois não é um fato isolado, mas, sim, a consequência de políticas nefastas.

É uma burrice histórica destruir a Amazônia e legalizar a invasão de terras indígenas pelos garimpeiros ou por outras formas de exploração predatória. Como bem disse o cacique Raony, nós nunca invadimos as terras dos bancos, eles invadem as nossas. Os índios estão onde deveriam estar: são guardiões da floresta para eles; para nós, que estamos na cidade; e para garantir o ciclo das chuvas para as plantações do agronegócio.

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