Ao me deparar com a manchete estampada na parte inferior da capa do Correio de terça-feira levei um susto: "Do horror ao otimismo". A foto em quatro colunas mostrava uma senhora, ao fundo, duas crianças em uma cadeira de rodas, guiadas por mais duas crianças. Todas com um riso luminoso nos rostos. Demorei um pouco a estabelecer a conexão dos fatos.
Mas, em seguida, percebi que eram as mesmas quatro meninas que haviam sido atropeladas por um motorista bêbado, em uma faixa de pedestre na Ceilândia. Todas receberam alta médica e se recuperam em casa, mas ainda inspiram cuidados. São elas Bruna, Ana Júlia e Ester; estava acompanhadas pela avó Glória Pereira. Elas foram fotografadas quando reviam as amigas no Instituto Abraçando Vidas, organização social de Sol Nascente.
Confesso que, ao ler a notícia do atropelamento, pensei que elas não escapariam ou ficariam com sequelas irreversíveis. Cinco meninas, entre 4 e 11 anos, iniciaram a travessia da faixa de pedestre da Via P2, em Ceilândia Norte, para ir ao parquinho, quando surgiu, abruptamente, o carro Fox branco, dirigido pelo pedreiro Francisco Manoel da Silva, de 53 anos, que atingiu as crianças antes que elas cruzassem a rua.
Francisco estava bêbado e não tinha carteira de habilitação. Três das cinco meninas foram internadas na UTI em estado grave. É uma mistura de irresponsabilidade, covardia e impunidade.
Ana Júlia e Bruna continuam com pinos no fêmur e se deslocam em cadeira de rodas. Ainda recebem cuidados especiais e tomam medicamentos.
Mas as famílias das cinco crianças estão felizes com a solidariedade dos amigos. Ganharam cadeiras de rodas e de banho. A faixa de pedestre é uma das conquistas da cidadania em Brasília. Um amigo dizia: eu tenho orgulho de parar na faixa. As crianças se sentiam empoderadas, quando elas levantavam as mãos, os carros paravam. Chegaram a ficar tão imbuídos de importância que cometiam exageros, provocando freadas bruscas.
O respeito sempre foi maior no Plano Piloto do que nas cidades da periferia, mesmo porque a fiscalização no centro da capital é mais intensa. No entanto, seria necessário que as campanhas de trânsito fossem permanentes para que os valores e os comportamentos sejam inculcados a diversas gerações. É uma conquista que, em certa medida, Brasília perdeu e deve empenhar esforços para reconquistar.
Além disso, existe a sensação de impunidade, de que não vai acontecer nada de mais grave se alguém atropelar uma pessoa na rua, mesmo quando flagrado em estado de embriaguez. No mês passado, o STF manteve, por unanimidade de votos, trechos da Lei Seca e a tolerância zero do consumo de álcool para motoristas nas rodovias brasileiras.
Ratificou a deliberação de que o condutor não pode se recusar a fazer o teste do bafômetro. Os infratores podem ser multados e ter a carteira de habilitação suspensa. É uma medida importante, que não pode ser jogada fora sob o argumento irresponsável da liberdade individual.
Algumas vezes, leio notícias que me levam a concordar, por alguns instantes, com o poeta Maiakóvski: "Ah, fechem, fechem os olhos dos jornais". No entanto, as surpresas boas também acontecem. Em meio a tantas notícias ruins ou mentirosas, a foto do renascimento das meninas atropeladas me proporcionou um instante de alegria.
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