Olhe para cima

Correio Braziliense
postado em 27/06/2022 00:01

Este não é mais um texto sobre são-joão. Estou aqui para falar de sobrevivência, de aprendizados, de descobertas. Entrei na Universidade de Brasília antes ainda de completar 18 anos. Deslumbrada pelos corredores largos que abraçavam o infinito, me perdia facilmente pela imensidão da federal.

Cheguei antes da consolidação da expansão, quando muitos dos prédios que hoje abrigam novos cursos ou que permitiram instalações mais completas para aqueles que já existiam ainda não haviam sequer saído do papel.

A Faculdade de Comunicação também foi beneficiada nesse processo. Salas reformadas, mais bem equipadas e um espaço novo em folha para o jornal-laboratório Campus. Manteve, no entanto, o espaço tradicional na parte Norte do Minhocão, o apelido carinhoso do Instituto Central de Ciências (ICC).

Fincado numa parte extensa da Asa Norte, o câmpus pioneiro da universidade segue o padrão das quadras de seu endereço e se organiza todo em números que só quem o percorreu exaustivamente consegue compreender. E uma descoberta que, para mim, foi crucial e ajuda a desvendar os mistérios dos algoritmos que acompanham cada nome de sala: olhar para cima.

Nas pilastras monumentais que seguem um traço firme e contínuo até a laje do edifício, bem lá no alto, estão pequenas placas com a numeração que permite localizar exatamente onde você, pedestre desavisado, se encontra no arranjo cartográfico de Oscar Niemeyer.

Não me recordo mais se descobri essa informação sozinha ou se alguma alma caridosa decidiu compartilhá-la comigo, mas lembro-me bem de quando testei a, até então, "teoria" e percebi que funcionava. Olhei para cima, li o número e vi que correspondia exatamente ao da sala que se encontrava logo abaixo. A partir daí, passei a economizar preciosos minutos sem a necessidade de procurar as salas corretas a cada início de semestre.

Hoje, no entanto, a UnB já tem outra cara. As construções mais antigas seguem firmes e fortes, recebendo novos alunos a cada semestre. Mas a universidade cresceu, não só para abrigar outros cursos em Ceilândia, no Gama e em Planaltina. O próprio câmpus Darcy Ribeiro está de cara nova, com prédios e instalações recém-erguidos.

Na última semana, voltei a esse lugar que virou referência para mim, cheia de confiança e de certeza de que saberia me virar por ali. Até ignorei uma placa com QR Code que oferecia um mapa virtual. Segui segura e... Me perdi. Não fui capaz sequer de acertar o prédio do curso que procurava.

Apesar do imprevisto, consegui chegar a tempo da entrevista que havia marcado, e o esforço valeu a pena. Tive o privilégio de ouvir e poder contar a vocês, leitores, as histórias dos dois professores indígenas da UnB. Altaci Corrêa Rubim, do Instituto de Letras, vocês conheceram ontem. E, no próximo domingo, poderão ler sobre Gersem Baniwa, docente da Antropologia.

Não por acaso, o título dessa crônica acabou parecido ao do filme da Netflix, a paródia dos tempos atuais Não olhe para cima. Só tenho a agradecer à UnB e aos professores que, gentilmente, concordaram em dividir um pouco de suas trajetórias comigo e, por isso, convido a todos a desafiarem o status quo: olhem para cima!

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