Retrospectiva

Pedro Krambeck, do caso Naja, depõe à Justiça: "Não trafiquei animais"

Dois anos depois, o jovem se defendeu das acusações de tráfico de animais e maus-tratos. Negou que o intuito era comercializar serpentes e confessou que, à época, tinha desequilíbrio em comprar animais

Darcianne Diogo
postado em 09/07/2022 21:22
Pedro Krambeck foi indiciado e responde na Justiça -  (crédito: Reprodução)
Pedro Krambeck foi indiciado e responde na Justiça - (crédito: Reprodução)

Há exatamente dois anos, Brasília presenciava um dos maiores casos de repercussão daquele ano. Réu na Justiça por tráfico de animais silvestres, associação criminosa, maus-tratos e exercício ilegal da profissão, Pedro Henrique Krambeck Lehmkuhl, 24 anos, — picado por uma naja kaouthia em 9 de julho de 2021 —, se defende das acusações e nega que nunca teve a intenção de comercializar serpentes. Na última audiência de instrução, em 31 de maio, o jovem deu sua versão dos fatos ao juiz Manoel Franklin Fonseca Carneiro (veja vídeos dos trechos do depoimento do réu).

Por mais de 20 minutos, Pedro deu detalhes ao juiz, promotores e advogados de todo o caso, começando pelo o dia em que foi picado dentro de casa, no Guará, a recuperação no hospital, a descoberta do esquema criminoso, o indiciamento, o amor por animais exóticos e peçonhentos e os julgamentos enfrentados por parte da sociedade. De início, o então estudante de medicina veterinária confessa que nunca teve o intuito de comercializar cobras e que, em uma das provas colhidas pela polícia que comprova a venda de uma das serpentes, Pedro considera o fato como isolado.

“Eu tinha muitos animais, e esses animais tinham que comer, mesmo que uma vez na semana. Isso demandava gasto, despesa. Precisava comprar antibióticos e nebulizadores. E eu pensava: ‘Como vou fazer isso?’. Minha mãe me dava uma mesada mensal por atividades que exerço com ela e, na época, eu vendia produtos e tirava um bom dinheiro. Mas mesmo assim, um jovem de 22 anos (na época), sem trabalho e que só estudava, eu queria sair com a namorada, com os amigos. Mas abria mão disso porque tinha um animal anunciado (na internet), e eu falava: ‘Prefiro pegar esse bicho do que sair’. Eu tinha esse desequilíbrio, essa compulsividade e caráter acumulador de animais”, relatou o jovem na audiência.

  • Pedro Krambeck foi indiciado e responde na Justiça Reprodução
  • 16/07/2020. Brasil. Brasília - DF. Cidades. Caso Pedro Henrique Lemkuhl, estudante de veterinária picado por uma cobra naja. Na foto, o padrasto do Pedro Henrique, Eduardo Conde, na 14ª DP do Gama. Ana Rayssa/CB/D.A Press
  • Pedro foi preso em 29 de julho, mas foi solto dois dias depois. Caso veio à tona quando ele foi picado pela naja Ed Alves/CB/D.A Press
  • Caso Naja: Pedro Krambeck provocando cobra Reprodução
  • Pedro Henrique dos Santos Krambeck Lehmkul é investigado por suposta participação em esquema internacional de tráfico de animais exóticos e silvestres Ed Alves/CB/D.A. Press
  • 16/07/2020. Crédito: Ana Rayssa/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Cidades. Caso Pedro Henrique Lemkuhl, estudante de veterinária picado por uma cobra naja. Na foto, cobra apreendida com o Nelson Junior Soares Vasconcelos. Ana Rayssa/CB/D.A Press
  • 16/07/2020. Crédito: Ana Rayssa/CB/D.A Press. Brasil. Brasília - DF. Cidades. Caso Pedro Henrique Lemkuhl, estudante de veterinária picado por uma cobra naja. Na foto, o padrasto do Pedro Henrique, Eduardo Conde, na 14ª DP do Gama. Ana Rayssa/CB/D.A Press

Além de Pedro, também foram indiciados a mãe dele, a advogada Rose Meire dos Santos; o padrasto do jovem, o tenente-coronel Clóvis Eduardo Condi; e o amigo Gabriel Ribeiro Moura. Questionado pelo juiz sobre a formação do grupo criminoso voltado ao tráfico de animais, Krambeck colocou sobre si todas as atribuições e responsabilidades com as cobras. “Em determinados manejos, precisava de ajuda. E o Gabriel era essa minha ajuda, o amigo que eu confiava. Imagina se quero mexer numa naja? Eu preciso de alguém que saiba conter aquele animal e essa pessoa era o Gabriel. Por isso acredito que ele tenha me ajudado a retirar os animais, porque ficava implícito na nossa amizade que ele poderia me ajudar em qualquer circunstância acerca dos animais. Mas os animais eram meus, o sonho era meu, a responsabilidade era minha e quem quis ter foi eu”, pontuou.

No interrogatório, o juiz perguntou ainda sobre o envolvimento e participação da mãe e do padrasto de Pedro no esquema. Em resposta, o jovem afirmou que a genitora tinha ciência de alguns animais que ele levava para a casa para tratar, mas em relação a Condi, fez questão em afirmar que tentava esconder as serpentes dele. “Nunca tive uma relação boa com meu padrasto e sempre tivemos embate. Ele é muito estúpido, grosso e tivemos muito embates na infancia e adolescência. Então, não tinha relações, não tinha contato com ele.”


Incidente


A ajuda de retirar os animais que Gabriel teria oferecido, segundo Pedro, diz respeito ao dia em que o jovem foi picado pela naja. Na noite, Gabriel recolheu cobras que estavam no local e as distribuiu entre outros endereços, incluindo a naja. No dia seguinte, em 8 de julho, 8 de julho, o rapaz deixou a cobra perto de um shopping no Lago Sul e o animal foi recolhido por uma equipe do Batalhão de Polícia Militar Ambiental. Ao longo das investigações, os policiais recolheram ao menos 22 serpentes, todas ligadas a Pedro.

Em sua fala, Pedro contou detalhes do dia do incidente. Krambeck relata que estava fazendo práticas rotineiras de limpeza com a naja, quando foi picado. “Até hoje não consegui entender porque ela me mordeu. Como conhecedor e pesquisador, eu sabia do risco que a naja tinha, e quando ela me mordeu, pensei: ‘Isso é um sonho, não é possível que eu fui mordido’. Ela me mordeu e eu soltei ela no chão e assim que vi ela no chão, guardei, tranquei, corri para o banheiro e disse para a minha mãe correr para a casa, que eu precisava de uma UTI. [...] Ainda pedi a ela que, se eu ficasse vegetal, era para desligar os aparelhos”, afirmou.

Com necrose no braço e lesões no coração, o estudante acordou do coma dois dias depois. O tratamento dele contou com um soro antiofídico produzido com o veneno da naja kaouthia, trazido ao Distrito Federal diretamente do Instituto Butantan, em São Paulo. Havia só uma dose disponível. A criação dessa espécie no Brasil é proibida por lei. Após o caso, o laboratório importou 10 doses para estoque dos Estados Unidos.

Ao longo de dois anos, Pedro descreve a sensação em ser julgado pela sociedade como um traficante internacional e fala sobre como lida com a situação. “Não é prazeroso. As pessoas me olham torto. Já fui parado nas ruas muitas vezes, mas vejo algo benéfico no fim das contas. Tem gente que vem com duas facas na mão para me pegar, e quando ficam cinco minutos conversando comigo, podem ter suas próprias conclusões que não sou esse monstro que criaram”, disse, em depoimento.

Linha do tempo


7 de julho
» O então estudante de medicina veterinária Pedro Henrique Krambeck é picado por uma naja kaouthia, no apartamento onde morava, no Guará 2. Na mesma noite, o amigo dele Gabriel Ribeiro recolhe cobras que estavam no local e as distribui entre outros endereços

8 de julho
» Gabriel deixa a naja kaouthia perto de um shopping no Lago Sul. Uma equipe do Batalhão de Polícia Militar Ambiental recolhe o animal

9 de julho
» A Polícia Militar resgata mais 16 cobras de Pedro Henrique, em um Núcleo Rural de Planaltina

22 de julho
» Gabriel Ribeiro é preso, acusado de atrapalhar as investigações

29 de julho
» Pedro Henrique Krambeck é preso pelo mesmo motivo

31 de julho
» Gabriel Ribeiro e Pedro são liberados da prisão

13 de agosto
» Polícia Civil conclui inquérito e envia provas ao Ministério Público

28 de agosto
» Ministério Público do DF e Territórios denuncia envolvidos

3 de setembro
Tribunal de Justiça do DF e dos Territórios acata a denúncia

 

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação