Direito do Consumidor

Dor de cabeça na hora da reforma

Problemas contratuais podem complicar todos os planos de quem quer melhorar o imóvel

Quem tem um imóvel quer conservá-lo sempre da melhor forma possível, tanto na estética quanto na estrutura e, às vezes, ampliá-lo. Mas esse cuidado na hora da reforma ou outro tipo de benfeitoria pode virar um grande transtorno se houver problemas nos serviços. Uma forma segura de evitá-los é se antecipar, em uma fase pré-contratual à escolha dos profissionais ou produtos, como explica o presidente da Comissão de Direito do Consumidor da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB-DF), Ricardo Barbosa Nunes. "Pode-se, primeiro, como forma de tentar esclarecer melhor com quem ele está contratando, fazer uma pesquisa no Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Distrito Federal (CREA-DF) e analisar junto ao Tribunal de Justiça (TJDFT) se existem ações distribuídas em nome dessas pessoas ou empresas, emitindo certidões de nada consta (pelo site cnc.tjdft.jus.br)", recomenda. 

O advogado também aconselha uma consulta às redes sociais. "Isso vai contribuir, nesse momento prévio, para que o consumidor tenha noção de quem, efetivamente, ele pode estar contratando para prestar esse serviço e, de certa maneira, já eliminar alguns profissionais que não tenham uma fama muito boa no mercado", adianta.

Após o primeiro filtro, o advogado alerta para a formalização do contrato, que deve ser detalhado. A atenção deve ser a mesma em relação aos trabalhadores. "Quem aplica ou realiza a mão de obra tem regras atreladas à ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) de como realizar a prestação daquele serviço. Se descobrir que aquele serviço não foi realizado da forma preconizada pela regra geral, quando não segue a ABNT — no caso da construção civil —, muitas vezes, vai depender de uma perícia, de uma análise de outro profissional, que vai elaborar um laudo e descrever o que foi e o que não foi realizado dentro da especificação que as regras de construção trazem", detalha o mestre em Direito.

Pesadelo

O servidor público Silvio Barbosa, 40 anos, começou a ter dor de cabeça com a reforma de seu apartamento na Asa Norte, em 2020. "O primeiro arquiteto já começou passando muito do orçamento no pacote, me sugerindo praticamente o dobro do teto do que eu tinha previsto para a obra, depois do projeto estar pronto. Entrei em contato com outro arquiteto, que falou que conseguiria mexer melhor, num tempo de dois meses. Aceitei e aí começou o inferno verdadeiro: tinha erros na obra e no projeto, ele era negligente, não aparecia na obra, todos os profissionais indicados por ele me deram problema", relata.

"Esse mesmo arquiteto indicou uma construtora que não cumpriu prazos estabelecidos e roubou parte do material da obra, pedindo material a mais. A construtora se prontificou a fazer uma pesquisa para trocar as minhas janelas comuns por acústicas — eles embolsaram o dinheiro das janelas novas e não fizeram a mudança. Abandonaram a obra e tentaram justificar com o reajuste no preço dos materiais. No fim, tive que contratar outra equipe. Gastei quatro vezes mais do que foi planejado. Acabou sendo uma experiência terrível", conta o servidor.

"Entrei na Justiça há mais de um ano e notificaram apenas um dos arquitetos do último projeto. Os demais não foram encontrados, só o dono e o gerente da construtora. A suposta empresa das janelas não tem representação em Brasília e era um nome usado pela construtora. Duvido que a situação se reverta, acho pouco provável", lamenta.

O que diz o CDC?

Analisando o caso, a advogada especialista Ildecer Amorim reforça a questão do cuidado na hora da contratação. "Na reforma, é inevitável a dor de cabeça que acompanha a obra. É difícil lidar com os prazos inadimplidos, os gastos inesperados, orçamentos discrepantes e outros problemas. O artigo 40 do Código de Defesa do Consumidor prevê a obrigatoriedade de o fornecedor entregar um orçamento, que deve ser o mais específico e concreto possível. O valor da mão de obra, dos materiais de construção e equipamentos a serem empregados, as condições de pagamento, bem como as datas de início e término dos serviços, o que será considerado extra, quais os valores das multas em caso de atraso da obra ou do pagamento, além do prazo e termos de garantia, todos devem estar claramente especificados", esclarece.

Ildecer sugere que o consumidor peça referências e faça visitas a outras obras realizadas por aquele prestador, para saber se está contratando pessoas competentes. "A lei determina, ainda, que, no caso de as partes não combinarem outro prazo por escrito, os valores do orçamento são válidos por dez dias contados a partir do seu recebimento pelo consumidor. Sugerimos que o consumidor, para garantir o seu direito, caso concorde com o valor, escreva um 'aprovou o orçamento', com data e assinatura", esclarece.

A advogada aponta como o código protege o consumidor nessa situação. "O CDC estabelece que o fornecedor responde pelos vícios de qualidade que possam prejudicar as obras executadas e o consumidor pode exigir a reexecução dos serviços, a restituição imediata da quantia paga ou o abatimento proporcional no preço", explica.

O cliente também é protegido, uma vez que o valor orçado é extrapolado, como no caso de Silvio. "Se, no fim da reforma, o profissional ou a empresa cobrar a mais por um serviço prestado que já estava previsto no contrato, esse valor não precisa ser pago", informa, acrescentando que o consumidor deve procurar o Procon e, se for o caso, um advogado para ajuizar uma ação judicial, com pedido de dano moral.