Eleições 2022

Eleitores de baixa renda priorizam emprego, saúde e segurança

Moradores da Estrutural e do Sol Nascente/Pôr do Sol esperam que o governador eleito em outubro crie oportunidades de geração de renda, construa UBSs e melhore as condições de segurança e infraestrutura, como pavimentação

Ana Isabel Mansur
Pedro Marra
postado em 14/09/2022 05:49 / atualizado em 14/09/2022 05:51
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

"Queria que o lixão voltasse para cá, porque tem muita gente desempregada", desabafa a catadora de materiais recicláveis da Estrutural Késia Lourenço de Melo, 40 anos. O pedido dela por trabalho é uma entre as várias demandas dos eleitores de baixa renda, que esperam melhorias nas comunidades onde vivem no Distrito Federal. Para mostrar esse cenário, o Correio conversou pessoas de diferentes idades e funções que esperam do próximo governo a instalação de unidades de saúde, o asfaltamento de vias, mais iluminação pública e o policiamento frequente.

  • Késia Lourenço de Melo, 40 anos, é catadora de materiais recicláveis da Estrutural. Atualmente, ela está sem ocupação e vive com auxílio social Fotos: Carlos Vieira/CB/D.A.Press
  • O casal Francisco e Iraneide pede por policiamento no Pôr do Sol Carlos Vieira/CB/D.A.Press
  • Cícero reclama que as ruas do Pôr do Sol são precárias Carlos Vieira/CB/D.A.Press
  • Mariana pede uma área de lazer para a região onde vive Carlos Vieira/CB/D.A.Press

Levantamento da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan) mostra que a população pobre do DF cresceu de 12,9% para 20,8% entre 2019 e 2021. São aproximadamente 600 mil pessoas vivendo com até R$ 450 por mês. Késia ganha cerca de R$ 50, por dia, com venda de materiais recicláveis a empresas da região. Em 1982, ela chegou em Brasília de ônibus com o pai, vindos de Natal (RN), cidade onde nasceu.

A potiguar morava em Ceilândia Norte, quando começou a recolher lixo nas ruas. Hoje, ela vive com o marido em um barraco de madeirite próximo ao antigo Lixão da Estrutural, desativado em janeiro de 2018. Os dois têm apenas o recurso do Auxílio Brasil — de R$ 400 por meio do Cadastro Único (CadÚnico) — para se manterem. Além da geração de renda, Késia pondera que a construção de um setor habitacional na Estrutural seria importante para a população mais vulnerável da região. "Iria ajudar muito, porque a gente não consegue ganhar tanto dinheiro", conta.

Segundo a última Pesquisa Emprego e Desemprego (PED), de julho, a capital do país tem 15,7% de pessoas que integram a estatística do desemprego, o que representa 260 mil moradores do DF. O levantamento foi feito pelo Instituto de Pesquisa e Estatística (IPE). Em relação aos trabalhadores autônomos, Brasília soma 249 mil pessoas nessa modalidade.

Falta de atendimento

O casal de comerciantes Francisco Sérgio Leite, 44, e Iraneide Sousa Leide, 46, são donos da Hidroelétrica Capital, no Pôr do Sol, a 33 quilômetros do centro de Brasília. Para a futura gestão, eles avaliam ser urgente a criação de uma unidade básica de saúde para acolher a comunidade local. Recentemente, o filho deles, de 9 anos, sofreu uma crise de asma enquanto aguardava atendimento, na UBS 17 de Ceilândia Sul.

Os pais levaram o menino para o Hospital Regional de Ceilândia (HRC), a 7,4 quilômetros da casa da família, e que também não tinha atendimento. Em seguida, foram ao Hospital Regional de Brazlândia (HRBz), mas não conseguiram ajuda. "Então, chegamos no Hospital Regional de Taguatinga (HRT), onde viram a situação dele, que fez nebulização, tomou medicamentos. É uma luta cuidar do meu filho nessas condições", desabafa Iraneide.

Em 1994, Iraneide veio de Vitorino Freire (MA) e desembarcou na Rodoviária de Taguatinga para buscar uma nova vida na capital do país e trabalhou como empregada doméstica, atendente em floricultura e em loja de sapatos. O marido, Francisco, chegou cinco anos depois, de Campos Sales (CE), e desembarcou na antiga Rodoferroviária. Os dois começaram a namorar em 2000 e tiveram dois filhos. Francisco avalia que o policiamento comunitário na região com a volta da dupla Cosme e Damião seria importante para a segurança. "Agora, quando passam aqui, descem e sobem rápido para o P. Sul", detalha, sobre o patrulhamento policial.

Sem asfalto

Outro problema do Pôr do Sol é a falta de asfaltamento, pedido feito pelo pintor de automóveis Cícero Noleto, 54, à próxima gestão do GDF. Segundo ele, há dois meses, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap) colocou brita em algumas vias do local. "Seria bem melhor o governo asfaltar, porque, toda vez que chove aqui, alaga as ruas e cria poças", critica o morador da cidade.

Filha de Cícero, Mariana da Silva Noleto, 20, que trabalha com polimento de carros na oficina do pai — que funciona na garagem da casa onde moram — gostaria que o próximo governador revitalize uma área de mata usada para descarte de rejeitos, ao lado do Centro de Ensino Fundamental 32 (CEF 32) do Sol Nascente. "É um local onde fazem fogo, jogam lixo. Então, se tivesse uma área de lazer com quadra poliesportiva seria bem mais produtivo para a gente, porque muitas crianças se divertiriam bastante, ao invés de ter que subir até o P Sul para jogar bola, por exemplo", cobra.

Educação

Professora de políticas públicas e diretora do Instituto de Fiscalização e Controle (IFC), Laura Karoliny Nogueira ressalta que muitas pessoas em situação de vulnerabilidade ou de muita pobreza sequer tiveram acesso ao ensino básico e, consequentemente, não conhecem os próprios direitos. Para mudar esse cenário, a especialista assegura que o caminho é a educação. "Quando a gente fala de saúde, educação, transporte, lazer, moradia e direito à infância, não estamos falando de coisas que a gente deseja para o outro, mas de direitos constitucionais", contextualiza.

Laura acredita que o Estado serve à população, e não deve ser o contrário, para que o espaço de voz seja ocupado pelos eleitores. "A forma que possivelmente a gente vai construir essa realidade é com informação, não de forma solta, mas com capacitação, leitura e embasamento para que a gente possa cobrar da administração responsáveis, dos poderes, aquilo que é pertinente", finaliza a professora.

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Politize-se; por Danilo de Morais*

Maquiavel dizia que a opinião pública deve ser acomodada ou até instrumentalizada, mas jamais ignorada. No contexto eleitoral, portanto, é comum que a generalidade dos candidatos se excedam em suas promessas, que, em boa medida, não se concretizarão, seja por restrições político-institucionais, seja por restrições fiscais.

O não cumprimento das promessas não necessariamente vai resultar na não reeleição, na medida em que a opinião pública é um filme do qual a data da eleição é apenas uma fotografia. A reeleição, em revés, será muito mais uma variável da elevação dos agregados macroeconômicos de bem-estar social e a adoção de medidas populistas, que geralmente possuem forte apelo eleitoral, num horizonte de médio prazo, tendem justamente a deteriorar esse quadro.

A população pode qualificar seu papel fiscalizatório educando-se politicamente, mas, sendo realista, isso é um desafio mesmo em democracias consolidadas. O mais comum é que essa fiscalização fique a cargo de instituições independentes da burocracia profissional e, sobretudo, de entidades da sociedade civil organizada. Nesse passo, aperfeiçoam o controle social medidas como a transparência efetiva, sistemas eleitorais de mais fácil assimilação pelo eleitor e o fortalecimento de instituições de controle com foco na efetividade de seus resultados e obediência ao devido processo legal.

Os Poderes Legislativo e Executivo são, em termos empíricos, até mais transparentes que o Judiciário. No entanto, não basta que os dados estejam disponíveis: é preciso interpretá-los e contextualizá-los, convertendo-os em informação relevante. É nesse contexto que desponta essencial o papel da Imprensa profissional, que usualmente monitora o cumprimento destas promessas.

As oposições também têm um papel central neste sentido, no contexto das democracias abertas, seja denunciando excessos do governo, seja provocando órgãos de controle, como o Ministério Público, o Judiciário e os tribunais de contas, para exigir o cumprimento das regras.

*Professor de ciências políticas do Ibmec Brasília

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