CRÔNICA DA CIDADE

Correio Braziliense
postado em 19/09/2022 00:01

CRÔNICA DA CIDADE

Mariana Niederauer

mariananiederauer.df@dabr.com.br


A sorte de um

amor tranquilo


O primeiro verso de Todo amor que houver nessa vida, de Cazuza e Frejat, resume o sentimento que muitos de nós carregamos: ter a sorte de encontrar um amor tranquilo. Se mesmo para os dois músicos que viveram tão intensamente tantos momentos, era importante encontrar, no fundo, certa paz e constância, imagine para nós, anônimos.

É que o amor carrega em si certa intensidade difícil de explicar. Não é a mesma que a da paixão e, portanto, diferente também daquela trazida pela raiva. Trata-se da capacidade de nos sugar para uma espiral de outros sentimentos avassaladores e assustadores e, ainda assim, nos deslumbrar com a potência de um gesto ou palavra do ser amado. Vale para qualquer relação: entre pais e filhos, tios e sobrinhos, avós e netos, companheiros de vida, namorados, amigos…

Na mesma música, os compositores começam a tecer a receita ideal para lidar com esse furacão. A tranquilidade é apenas um dos ingredientes essenciais. Mas no caldeirão também vem uma pitada de veneno “anti-monotonia”. É claro que, no caso da canção, está em questão o amor romântico. Quantos de nós não nos identificamos com esse retrato particular?

Houve quem transformasse também o amor pelo samba em canção metalinguística de beleza sem igual. “Se um dia / Meu coração for consultado / Para saber se andou errado / Será difícil negar / Meu coração / Tem mania de amor / Amor não é fácil de achar / A marca dos meus desenganos ficou, ficou / Só um amor pode apagar / A marca dos meus desenganos ficou, ficou / Só um amor pode apagar”, escreveu e cantou Paulinho da Vila para a sua Portela.

Já Martinho da Vila homenageou justamente um amor do passado. “Ex-amor/ Gostaria que tu soubesses / O quanto que eu sofri / Ao ter que me afastar de ti / Não chorei! / Como um louco eu até sorri / Mas no fundo só eu sei / Das angústias que senti”, sangra a primeira estrofe da composição.

E nada mais potente que esse sentimento universal. Em todos os cantos do Globo, como no Velho Continente, sob a pena certeira de Shakespeare, também sofreram e regojizaram os corações que ousaram se encantar em encontros mágicos e sem explicação. “Pois toda essa beleza que te veste / Vem do meu coração, que é teu espelho; / O meu vive em teu peito, e o teu me deste: / Por isso como posso ser mais velho?”

Ter a sorte de um amor tranquilo é realmente um privilégio.

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