Entrevista | Julival Ribeiro | infectologista

"A pandemia ainda não acabou", alerta o infectologista Julival Ribeiro

Membro da Sociedade Brasileira de Infectologia, médico reforça a urgência de investimentos em pesquisa e avalia a importância da vacinação contra a covid-19, principalmente entre idosos, pacientes crônicos e imunossuprimidos

Edis Henrique Peres
postado em 10/10/2022 06:00 / atualizado em 10/10/2022 06:00
 (crédito: Reprodução)
(crédito: Reprodução)

Depois de dois anos e meio do começo da pandemia de covid-19, decretada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), muitas dúvidas sobre a doença já foram respondidas e o ser humano se adaptou a uma nova realidade. Atualmente, sem a obrigação do uso de máscaras, aos poucos, a rotina dos brasilienses retorna ao ritmo pré-pandêmico.

Até mesmo o álcool em gel, um dos companheiros mais fiéis durante os primeiros momentos de crise sanitária, está esquecido. No entanto, apesar da tranquilidade da população, os boletins epidemiológicos da Secretaria de Saúde alertam para o aumento da taxa de transmissão do Sars-CoV-2. O índice deixou seu ritmo de queda dos últimos meses e alcançou 0,95% — quando 100 pessoas contaminam outras 95.

Médico infectologista e membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), Julival Ribeiro destaca que o mundo se volta aos países do Hemisfério Norte para entender como o vírus vai se comportar na estação de outono e inverno e, consequentemente, saber o que esperar da doença para o próximo ano.

O especialista destaca que o Brasil tem que reconquistar seu lugar como referência de vacinação no mundo, afastando, inclusive, o risco de voltar a ter casos de poliomielite, erradicada do país desde 1994. A doença pode voltar a acometer crianças devido à baixa cobertura vacinal.

Confira abaixo os principais pontos da entrevista:

Como avalia o atual momento que estamos vivendo? Podemos realmente ficar tranquilos?

Vejo da seguinte maneira: a pandemia ainda não acabou e é importante fazer esse alerta, principalmente para pessoas idosas, com comorbidade e imunossuprimidos. Estamos avançando e isso se deu, sobretudo, devido à vacinação segura e eficaz, que preveniu o maior número de casos de mortes, internações e casos graves. Contudo, a OMS ainda não decretou o fim da pandemia, embora estejamos vivendo, aqui no Brasil, um bom momento.

Para onde se direciona, atualmente, a atenção dos estudiosos?

A Inglaterra está entrando agora no inverno e isso vem trazendo um aumento do número de casos. Os cientistas estão debruçados para verificar se isso trará novas variantes ou não. Vale lembrar que mesmo para quem tem o ciclo completo da vacina, as doses vão diminuindo sua proteção ao longo do tempo, e esse é um medo das autoridades sanitárias. Nos Estados Unidos, eles já utilizam a vacina bivalente, e precisamos descobrir se o Brasil vai importar essas vacinas no ano que vem, quando enfrentarmos a nossa estação fria.

O que seria essa vacina bivalente?

São vacinas que contêm as últimas cepas da covid, a BA4 e a BA5. Essas foram as cepas que circularam com maior intensidade nos Estados Unidos e essa vacina terá um impacto na proteção maior contra elas.

Hoje, mesmo os usuários mais assíduos de máscaras, estão deixando o item de lado. Podemos realmente ficar tranquilos?

Os Estados Unidos praticamente aboliram as máscaras, mas analiso que ainda é necessário, principalmente em ambientes fechados, utilizar o objeto. Principalmente aqueles grupos de risco, de idosos, pacientes com doenças crônicas e imunossuprimidos. Mesmo que a vacina garanta uma boa proteção contra a doença, não sabemos, em um mundo tão conectado, se novas variantes podem chegar ao nosso país.

Como analisa a covid-19 daqui para frente?

Pelo que tenho acompanhado dos estudiosos, a covid-19 vai virar uma doença endêmica, em que provavelmente todos os anos teremos que fazer as vacinas de acordo com as cepas que estejam circulando. Por isso, o mundo agora está observando o Hemisfério Norte, para saber o que podemos esperar quando chegar o nosso inverno.

Acredita que o ser humano aprendeu algo com a pandemia?

Toda pandemia, como a da H1N1, enfrentada em 2009, deixa algum aprendizado. Infelizmente, na pandemia da covid-19, milhares de pessoas morreram e tivemos um impacto enorme na sociedade. O mais sério é que percebemos que somos dependentes de outros países. É urgente que façamos investimento na ciência e na tecnologia para suplementar os problemas que temos agora. Não podemos enfrentar as mesmas dificuldades tendo uma economia tão grande como a nossa. Ficamos dependendo de máscaras e insumos dos outros países nesta crise sanitária e isso não pode acontecer novamente. O mundo também precisa aprender sobre as fake news. Muitas pessoas não tomaram as vacinas devido às mentiras compartilhadas. Devemos lembrar, sempre, que a vacina é a melhor proteção contra a covid.

O que precisa ser feito agora?

Com urgência, precisamos retomar o nosso orgulho de ser um dos maiores países do mundo com um excelente calendário vacinal. Precisamos reverter essa situação de quem pensa que a vacina não é segura ou eficaz. Vimos o efeito dela comprovado pela ciência e também na prática. A questão das vacinas é essencial, inclusive, em outras doenças, como a poliomielite, que, atualmente, com índices tão baixos de vacinação, corre o risco de o Brasil enfrentar, de novo, a paralisia infantil, pela falta do cumprimento do calendário de vacina.

 




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Para Saber Mais

A crise sanitária do Sars-CoV-2 foi a sexta vez na história que uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional foi declarada. Veja abaixo:


25 de abril de 2009: pandemia de H1N1
5 de maio de 2014: disseminação internacional de poliovírus
8 agosto de 2014: surto de Ebola na África Ocidental
1 de fevereiro de 2016: vírus zika e aumento de casos de microcefalia e outras malformações congênitas
18 maio de 2018: surto de ebola na República Democrática do Congo
Fonte: OMS

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