Colegas de trabalho descobrem forma de transformar lixo em dinheiro

Dois trabalhadores da construção civil montaram uma empresa de coleta e reaproveitamento de materiais que são descartados diariamente pela população. No ano passado, o DF produziu 718.547 toneladas de rejeitos

Naum Giló
postado em 27/01/2023 06:00 / atualizado em 27/01/2023 06:05
 (crédito: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)
(crédito: Ana Rayssa/Esp. CB/D.A Press)

Nunca antes as questões relacionadas ao meio ambiente estiveram tão em voga quanto agora. Não só a emissão dos gases responsáveis pelo efeito estufa estão no centro dos debates, mas também o descarte adequado do lixo que é produzido por todos o tempo todo. Segundo o Serviço de Limpeza Urbana (SLU), o Distrito Federal produziu 718.547 toneladas de lixo em 2022, número exorbitante que obriga a sociedade a pensar constantemente o que fazer com todo esse material descartado sem que haja dano ao meio ambiente. Uma das principais soluções para o grave problema é a reciclagem, atividade que depende fundamentalmente do trabalho dos catadores.

Várias cooperativas e empresas fazem o trabalho de coleta e reciclagem de lixo no Distrito Federal. Uma delas é a Eco Ambiental Recicláveis, empresa localizada na avenida principal do Assentamento 26 de Setembro, que recebe em torno de três a cinco toneladas de materiais recicláveis por mês. Chegando lá, ocorre a seleção e, se necessário, o tratamento do objeto para revenda. E tem de tudo: plástico, PVC, eletrônicos, baterias, eletrodomésticos e metais em diversos tipos de objetos. Moradores da região, que está em franca expansão, recorrem ao estabelecimento para adquirir, por exemplo, material de construção mais barato do que é encontrado no mercado tradicional, como portas, pias, chapas de ferro e ferramentas.

O negócio começou há dois anos, após João Batista Marcelino Costa, 53, fazer um curso profissionalizante on-line de reciclagem. Antes disso, ele trabalhava havia um bom tempo na construção civil, mas viu na reciclagem uma oportunidade de ter uma vida mais tranquila e um maior potencial de renda. "Também chamou a minha atenção a importância da nossa atividade para a preservação do meio ambiente. Outro fator são os empregos gerados pela Eco Ambiental. A empresa conta com o trabalho de oito pessoas, contando comigo e meus sócios", declara.

Batista contou à reportagem que, em média, 20 catadores de recicláveis vão ao local todos os dias para vender o que eles conseguiram coletar nas ruas. A empresa, por sua vez, trata ou vende o material para outras pessoas, entidades ou estabelecimentos interessados. A Eco Ambiental também sai a campo em busca de materiais recicláveis descartados pela população. A cada dois dias, uma equipe se desloca até Águas Claras para fazer a coleta nos condomínios da cidade. "São cerca de 200 quilos de lixo todas as vezes que vamos lá", revela o empresário, que planeja fazer um trabalho de conscientização dos moradores desses condomínios sobre o gerenciamento de resíduos sólidos, que é saber separar cada tipo de material e organizá-los antes de ir para o lixo.

Félix Ribeiro Pinto, 46, é outro sócio da Eco Ambiental Recicláveis. Ele trabalhava com João desde os tempos da construção civil e foi convidado por ele para embarcar no novo negócio. Hoje, assim como o parceiro, ele vê a importância do que faz tanto nos empregos que têm gerado quanto na preservação do meio ambiente. "Com o dinheiro que estou ganhando hoje, eu estou conseguindo segurar as pontas", comemora o empresário. Ele relata que a grande maioria dos catadores que busca o local para vender o material é da Cidade Estrutural e do Assentamento 26 de Setembro. No entanto, a empresa atua em todo o DF e Entorno.

Ciclo produtivo

"Eles são agentes ambientais", define Izabel Cristina Zaneti, professora doutora do Centro de Desenvolvimento Sustentável (CDS) da Universidade de Brasília (UnB), referindo-se aos catadores. "O que eles coletam vai ser vendido para a indústria e não vai para um lixão ou um aterro sanitário. Todo esse material volta para o ciclo produtivo", explica a professora, destacando os danos ao meio ambiente. "Diferentemente do aterro sanitário, os lixões não são impermeabilizados, o que favorece que o chorume contamine o solo e o lençol freático, além de produzir o gás metano. Os aterros são impermeabilizados com camadas de argila. O problema é que eles deveriam receber apenas rejeitos, materiais que não são orgânicos e nem recicláveis, mas isso nem sempre é o que acontece", lamenta. 

Izabel lembra que, em 2010, foi sancionada lei que institui a política nacional de resíduos sólidos. De acordo com a legislação, todos os lixões deveriam ter sido desativados até 2014, o que não ocorreu na realidade. "Cada pessoa, em média, produz 800 gramas de lixo por dia. É um absurdo. Precisamos nos educar para separar os materiais orgânicos dos recicláveis, para ajudar os catadores na hora da triagem de todo esse material", sustenta. 

A acadêmica lembra de um dado da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), que revela que apenas 3% do lixo seco gerado no Brasil é reaproveitado. "É um descalabro", indigna-se. "Por isso o trabalho dos catadores é muito mais importante do que conseguimos imaginar."

 

 

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  • Colônia Agrícola 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental dá outro destino ao material descartado nas ruas
    Colônia Agrícola 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental dá outro destino ao material descartado nas ruas Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press
  • Colonia Agriculoa 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental faz reciclagem de lixo e ferros.  Sócios, João Batista Marcelino Costa (camisa polo) e Felix Ribeiro Pinto (camiseta)
    Colonia Agriculoa 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental faz reciclagem de lixo e ferros. Sócios, João Batista Marcelino Costa (camisa polo) e Felix Ribeiro Pinto (camiseta) Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press
  •  26/01/2023 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press Brasília- DF - Colonia Agriculoa 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental faz reciclagem de lixo e ferros.  Sócios, João Batista Marcelino Costa (camisa polo) e Felix Ribeiro Pinto (camiseta)
    26/01/2023 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press Brasília- DF - Colonia Agriculoa 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental faz reciclagem de lixo e ferros. Sócios, João Batista Marcelino Costa (camisa polo) e Felix Ribeiro Pinto (camiseta) Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press
  •  26/01/2023 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press Brasília- DF - Colonia Agriculoa 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental faz reciclagem de lixo e ferros.  Sócios, João Batista Marcelino Costa (camisa polo) e Felix Ribeiro Pinto (camiseta)
    26/01/2023 Crédito: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press Brasília- DF - Colonia Agriculoa 26 de Setembro, Empresa Eco Ambiental faz reciclagem de lixo e ferros. Sócios, João Batista Marcelino Costa (camisa polo) e Felix Ribeiro Pinto (camiseta) Foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A. Press
  • Garrafas de vidro são separadas de outros objetos...
    Garrafas de vidro são separadas de outros objetos... Foto: Antonio Cunha/CB/D.A Press
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