Dados divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), por meio do Censo 2022, mostram que a população do Distrito Federal envelheceu. De acordo com o levantamento, a quantidade de pessoas com 65 anos ou mais (qualitativo adotado pelo instituto) que moram no DF subiu de 128.128 para 248.576, de 2010 a 2022 — número que é 8,8% da população total da capital federal (2.817.068). O aumento de 94% da população idosa no DF foi maior do que o nacional, que ficou em 57,4%.
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Estatística, demógrafa e secretária Geral da Associação Brasileira de Estudos Populacionais (ABEP), Marília Miranda acredita que, antes mesmo de 2040, a participação da população idosa poderá ser maior que a da população menor de 15 anos. Utilizando projeções do Instituto de Pesquisa e Estatística (IPEDF), ela comenta que a população com menos de 15 anos de idade, que correspondia a 24,7% da população do DF em 2010, corresponderá a menos de 17,5% ,em 2030.
"Por outro lado, a população idosa passará de 7,6% da população total, para 16,6%", calcula. "Com a divulgação dos dados do Censo 2022, poderemos revisar essas estimativas, mas já sugere que antes mesmo de 2040, a participação da população idosa no conjunto poderá ser maior que a população menor de 15 anos", avalia Marília.
Na divisão por gênero, as mulheres idosas são maioria no Distrito Federal. Segundo o IBGE, 146.821 (59,07%) das pessoas acima dos 65 anos são do sexo feminino, enquanto 101.755 (40,93%) são homens. A pesquisa também aponta que a idade mediana (que mais se repete) dos moradores da capital do país subiu de 28 anos, em 2010, para 34 no ano passado.
Outro dado que chama a atenção é o índice de envelhecimento, que mostra a relação de idosos e a população de 0 a 14 anos. De acordo com o IBGE, no DF, o índice foi de 46,5 pessoas idosas para cada 100 crianças, em 2022. No Censo 2010, o valor era de 21, o que mostra um envelhecimento por parte da população da capital do país.
Para a secretária da ABEP, os resultados do IBGE para o DF mostram uma tendência nacional, no que diz respeito aos subgrupos da população ditas "dependentes". "Houve uma redução da população menor de 15 anos e um aumento significativo daqueles com 60 anos ou mais. Isso é consequência do envelhecimento populacional que estamos experimentando, em virtude das quedas dos níveis de mortalidade, natalidade e fecundidade experimentada pela população brasileira desde 1950", ressalta.
Sobre o número maior de mulheres idosas em relação aos homens, a demógrafa afirma que isso já era esperado. "Os homens têm altas taxas de mortalidade por causas externas (especialmente por homicídios e acidentes de trânsito), que corroboram com essa análise, que se intensifica na terceira idade, também conhecida como feminização do envelhecimento", explica.
Preconceito
A reportagem foi à rua para perguntar como é ser uma pessoa idosa no DF. O preconceito contra os mais velhos é percebido por Maria de Jesus, 72 anos, ao utilizar serviços de transporte público. A moradora de Samambaia, que constantemente necessita de ônibus para se locomover pela cidade, afirma que o desrespeito nas viagens é comum. A aposentada conta que, por várias vezes, os motoristas ignoram os idosos que aguardam pelo embarque.
Se ela não estiver acompanhada por alguém mais jovem, muitas vezes, os ônibus passam direto pelo ponto. "Muitas vezes, a gente nota muita brutalidade do motorista com os idosos", conta Maria, que é paciente do Hospital Oftalmológico de Brasília (HOB). O transporte público é importante para que ela consiga comparecer às consultas, pois a idade impede que a aposentada transite sozinha pela cidade.
Só que o preconceito não é limitado aos serviços. Judith da Conceição, 65, vive na pele a hostilidade direcionada aos mais velhos. "As pessoas evitam, tratam mal", desabafa. A moradora da Asa Norte relata ter sido constrangida em um estabelecimento localizado na Rodoviária do Plano Piloto. "Uma mulher colocou o som bem alto para eu sair da loja, porque estava na hora de fechar. Disse que estava muito alto, mas ela fingia que não via e aumentava mais o volume", detalha.
Apesar de próximo da aposentadoria, o funcionário público do Ministério da Justiça, Bio Pinheiro, tem 62 anos e não pretende se aposentar antes dos 70, pois revela ainda ter energia para tal. "Acho que quando a pessoa fica mais em casa é mais fácil ficar doente. Ela fica mais ociosa", defende. O morador do Arapoanga vê, no cotidiano do trabalho, outros idosos que continuam empregados. Fora do trabalho, Pinheiro também se mantém ativo, com hobbies que mantém em casa. "Nos finais de semana, cultivo plantas, cuidado dos vasos, faço poda de árvores e ainda confecciona móveis", descreve.
Desafios
A secretária da ABEP destaca um ponto relevante, tendo em vista todas as mudanças na distribuição etária da população do DF. "São os desafios da transformação digital, especialmente quando olhamos para a população idosa. Pensar em ações que possibilitem que a pessoa idosa, especialmente os de idade mais avançada, tenham não só o acesso aos serviços digitais, mas também consiga utilizá-los com êxito, é de extrema importância", alerta.
Professora associada da Universidade de Brasília (UnB) e coordenadora do grupo de trabalho Envelhecimento Saudável e Participativo (DASU/UnB), Leides Moura afirma que as desigualdades no DF produzem processos precoces de envelhecimento e adoecimento por multimorbidades, que impedem muitos de envelhecer com qualidade de vida. "O DF segue com um desequilíbrio intenso entre o aumento da população idosa e a oferta de serviços que garantam os direitos fundamentais dessa população que mais cresce", lamenta.
Segundo a professora, o idadismo estrutural pode ser parte da insuficiência de financiamento público que garanta o direito ao cuidado ao idoso. "Não temos nenhum Centro Dia público gratuito e nem uma Instituição de longa permanência para idosos que seja pública. Esses equipamentos urbanos são essenciais para o direito de envelhecer com dignidade", reforçou Leides.
Outros dados
Os números divulgados pelo IBGE também mostram que, de forma geral, a capital do país tem 1.474.595 mulheres (52,3%) e 1.342.786 homens (47,7%) — a razão entre sexos é de 91,1 homens para cada 100 mulheres. Além disso, o DF terá uma população de 3.789.728 pessoas em seu aniversário de 100 anos, em 2060, segundo projeção do instituto também divulgada ontem. É importante frisar que nem sempre a projeção do Instituto equivale a quantidade de pessoas que virão a existir.
Um exemplo era a projeção de que Brasília ultrapassaria os 3 milhões de habitantes em 2019, fato que ainda não se confirmou até 2023. A população de Brasília, segundo o Censo de 2022, é de 2.817.381 pessoas, o equivalente a uma densidade demográfica de 489,06 habitantes por quilômetro quadrado. O índice é maior do que o de estados como Rio de Janeiro (366,97), São Paulo (178,92), Minas Gerais (35,02) e Goiás (20,74).
*Com a colaboração de João Carlos Silva, estagiário sob a supervisão de Márcia Machado
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