Corona vírus

Pandemia pode dobrar mortes por malária

Maior registro de óbitos se dará pela interrupção de tratamentos na África Subsaariana, alertam cientistas britânicos. A doença que matou 405 mil pessoas no continente africano em 2019 também é endêmica em 19 países das Américas, incluindo o Brasil

Correio Braziliense
postado em 07/08/2020 21:30
 (crédito: Albert Gonzalez Farran/AFP - 13/5/13)
(crédito: Albert Gonzalez Farran/AFP - 13/5/13)

Mesmo sem ter relação direta com a doença, o Sars-CoV-2 poderá aumentar mais do que o dobro as mortes por malária na África subsaariana neste ano. Um estudo de modelagem publicado na revista Nature Medicine sugere que, com as atividades de prevenção interrompidas por causa da covid-19, essa parte do continente ficará seriamente afetada por uma enfermidade endêmica que, só no ano passado, matou 405 mil africanos.

A carga da malária na África está fortemente concentrada na região subsaariana, onde os casos da covid-19 também seguem aumentando. Em resposta à pandemia, os países dessa área estão implementando medidas não farmacêuticas para retardar a transmissão do Sars-CoV-2. A distribuição de mosquiteiros inseticidas de longa duração teve um papel importante no controle da malária na África Subsaariana, e muitas nações fazem campanhas de distribuição de rede planejadas para 2020. No entanto, não se sabe como as interrupções dessas campanhas teriam impacto sobre o fardo da malária.

Thomas Churcher e colegas do Imperial College de Londres usaram dados epidemiológicos da covid-19 e modelos de transmissão da malária para estimar o impacto de se interromper as iniciativas de prevenção e outros serviços essenciais de saúde em quatro cenários diferentes de pandemia. Eles descobriram que, se as medidas preventivas da malária fossem suspensas completamente, 2020 poderia registrar mais do que o dobro de casos, em relação a 2019.

Os autores mostraram que, apenas na Nigéria, reduzir o tratamento de casos de malária por seis meses e atrasar a distribuição de mosquiteiros pode resultar em uma média de 81 mil mortes adicionais. Na região subsaariana como um todo, 2020 registrará 206 milhões de casos e 379 mil mortes a mais em comparação ao ano anterior.

Infecções simultâneas

Os autores observam que o gerenciamento desses efeitos negativos é possível. Eles argumentam que as atividades de prevenção da malária — especialmente a distribuição de redes mosquiteiras — devem ser priorizadas, com o acesso aos tratamentos antimaláricos, além do distanciamento social e o uso de outras intervenções não farmacêuticas para prevenir a transmissão do Sars-CoV-2.

“A adesão às diretrizes de distanciamento social permanecerá crítica porque muitas pessoas infectadas com covid-19 também podem abrigar parasitas da malária”, escreveram os autores. “Por exemplo, nossos resultados modelados indicam que, no pico da estação de transmissão da malária em Mali (um exemplo de um país com transmissão sazonal), em indivíduos com idade acima de 15 anos, 30% dos infectados com covid-19 também têm parasitas da malária e, portanto, não podem se isolar se forem diagnosticados com malária como a causa de sua febre”, apontam.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a malária é uma das principais causas de mortes no mundo, com 228 milhões de casos e 405 mil mortes registrados em 2018. A África é o continente mais atingido, e nas Américas a transmissão permanece endêmica em 19 países e territórios — entre eles, o Brasil.

Cepa resistente em Ruanda

Pesquisadores do Instituto Pasteur, na França, descobriram uma cepa do parasita que causa a malária resistente ao medicamento usado para tratar a doença, em Ruanda. O estudo, publicado na revista Nature, demonstrou que os parasitas foram capazes de resistir ao tratamento com artemisinina — um remédio de primeira linha na luta contra a enfermidade. Os pesquisadores alertam que isso “representaria uma grande ameaça à saúde pública” no continente.

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Testes hepáticos anormais

Pesquisadores do Yale Liver Center descobriram que pacientes com covid-19 apresentaram testes hepáticos anormais, com taxas muito mais altas do que as sugeridas por estudos anteriores. Eles também constataram que níveis mais elevados de enzimas hepáticas — proteínas liberadas quando o fígado é danificado — estavam associados a prognósticos piores para essas pessoas, incluindo admissão na UTI, ventilação mecânica e morte. A pesquisa foi publicada na revista Hepatology.

Estudos na China descobriram que aproximadamente 15% dos pacientes com covid-19 tiveram testes hepáticos anormais. O estudo de Yale, que analisou retrospectivamente 1.827 pacientes hospitalizados no sistema de saúde de Yale New Haven entre março e abril, constatou incidência entre 41,6% e 83,4%.

Embora os pesquisadores não saibam por que a incidência de testes hepáticos anormais foi muito maior, o autor sênior, Joseph Lim, diretor do Programa de Hepatite Viral de Yale, disse que outras diferenças de saúde entre os chineses e os norte-americanos poderiam explicar isso. “Podemos especular que os pacientes dos EUA podem ter uma taxa elevada de outros fatores de risco, como doença hepática gordurosa alcoólica ou não alcoólica.”

Aproximadamente um quarto dos pacientes no estudo teve testes hepáticos anormais antes de serem admitidos no hospital. Mas, independentemente disso, uma forte associação foi observada entre testes hepáticos anormais e a gravidade dos casos da covid-19. Em vez de o próprio fígado gerar resultados piores em infectados pelo Sars-CoV-2, o órgão é mais provavelmente “um espectador” afetado pela hiperinflamação associada à doença e pelos efeitos colaterais de tratamentos relacionados, segundo Nathanson.

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