Hormônio do exercício pode ter efeito contra a covid-19, aponta estudo

Pesquisadores da Unesp descobriram que irisina diminui a expressão dos genes da proteína que o vírus se liga, assim, o SARS-CoV-2 tem dificuldade em entrar na célula humana; entenda

Dados preliminares de um estudo desenvolvido pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) indicam que o hormônio irisina — liberado pelos músculos durante atividades físicas — pode ter efeito terapêutico em casos de covid-19. 

Em testes feitos em laboratório, ao analisar dados, os pesquisadores observaram que o hormônio tem um efeito modulador em uma linhagem de células adiposas — responsáveis por armazenar gordura e regular a temperatura do corpo — em genes associados à reaplicação do vírus SARS-CoV-2 no corpo humano. Ou seja, a substância diminui a expressão dos genes da proteína que o vírus se liga e, se não tem proteína, o vírus apresenta dificuldade para infectar a célula.

Por causa da pandemia, os pesquisadores decidiram investigar possíveis efeitos da irisina em genes relacionados à replicação do vírus. A partir do cruzamento de dados, eles descobriram que o tratamento com o hormônio em células adiposas diminuiu a expressão de vários genes que regulam o ACE2 — fundamental para a replicação do vírus em células humanas. O gene ACE2 codifica a proteína a que o vírus precisa se ligar para invadir células humanas.

Outro ponto positivo encontrado no estudo foi o hormônio ter triplicado os níveis de transcrição do gene TRIB3. Em indivíduos idosos é comum ocorrer a diminuição da expressão desse gene, o que pode estar relacionado à maior replicação do novo coronavírus e ao risco aumentado dessa população à covid-19.

A pesquisadora da faculdade de Medicina da Unesp, em Botucatu (SP), Miriane de Oliveira explica, ainda, que um terceiro aspecto importante é o tecido adiposo aparentemente servir como “repositório” do vírus. “Isso ajuda a entender por que indivíduos obesos têm maior risco de desenvolver a forma grave da covid-19. Fora isso, indivíduos obesos tendem a ter níveis menores de irisina, assim como maiores quantidades da molécula receptora do vírus [ACE2], quando comparados a indivíduos não obesos”, detalhou.

O artigo, publicado na revista Molecular and Cellular Endocrinology, descreve dados gerados no estudo de pós-doutorado de Oliveira. O trabalho contou com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPES).

Metodologia

A pesquisa utilizou dados de moléculas de RNA expressas em um tecido — chamado de transcriptoma — de células adiposas que não estavam infectadas pelo novo coronavírus e que receberam doses do hormônio. A pesquisadora esclareceu que os transcriptoma foram significativos para correlacionar com genes importantes da covid-19.

“O resultado representa uma sinalização positiva para a busca por novos tratamentos nesse momento de emergência com a pandemia. É preciso ressaltar que trata-se de dados preliminares, uma sugestão do potencial terapêutico da irisina para casos de covid-19. Estamos indicando um caminho de pesquisa para comprovar ou não o efeito benéfico do hormônio em pacientes infectados”, diz Oliveira.

Irisina

A irisina, normalmente produzida pelo corpo durante o exercício físico contínuo, é conhecida pela função de modificação metabólica do tecido adiposo branco — que armazena triglicerídeos, lipídios, acumula gordura e pode vir a ser inflamado —, tendo função similar ao tecido adiposo marrom. Esse processo favorece o gasto energético, o que torna a irisina um agente terapêutico para doenças metabólicas, como a obesidade.

É também conhecida a capacidade moduladora do hormônio na atividade dos macrófagos (células de defesa do sistema imune), o que confere potencial propriedade anti-inflamatória.

*Com informações da Agência FAPESP