CIÊNCIA

Fósseis indicam presença de macacos fora da África há 6,4 milhões de anos

Fósseis descobertos em mina no sudoeste da China indicam que macacos estavam na Ásia ao mesmo tempo que os símios e bem antes do imaginado. Análise das peças também revela que os animais tinham versatilidade e adaptabilidade surpreendentes

Correio Braziliense
postado em 10/10/2020 07:00
 (crédito: Mauricio Antón/Divulgação)
(crédito: Mauricio Antón/Divulgação)

Três fósseis encontrados em uma mina de linhito no sudeste da província de Yunan, na China, têm cerca de 6,4 milhões de anos, indicando que os macacos existiam na Ásia ao mesmo tempo que os símios, de acordo com uma equipe internacional de pesquisadores. Provavelmente, eles são os ancestrais de alguns dos animais do gênero na região, indica o estudo, publicado no Journal of Human Evolution.

“Isso é significativo porque eles são alguns dos fósseis mais antigos de macacos fora da África”, diz Nina G. Jablonski, professora de Antropologia da Universidade Evan Pugh, Penn State. “É próximo ou realmente o ancestral de muitos dos macacos vivos do Leste Asiático. Uma das coisas interessantes, do ponto de vista da paleontologia, é que esse macaco estava no mesmo lugar e na mesma época que os símios antigos na Ásia.”

A equipe, que inclui Xueping Ji, do Departamento de Paleoantropologia do Instituto de Relíquias e Arqueologia Culturais de Yunnan, em Kunming, na China, estudou os fósseis desenterrados da mina de linhita Shuitangba, onde já foram encontradas muitas peças do tipo. Eles relatam que a mandíbula e o fêmur proximal estavam próximos e, provavelmente, são do mesmo indivíduo.

Um pouco mais abaixo, estava um calcâneo esquerdo — osso do calcanhar — relatado por Dionisios Youlatos, da Universidade Aristóteles de Thessaloniki, na Grécia, em outro artigo on-line na revista. O animal pertence à mesma espécie de macaco, Mesopithecus pentelicus. “O calcâneo revela que o macaco estava bem adaptado para se mover com agilidade e poder se locomover tanto no solo quanto nas árvores”, conta Jablonski. “Essa versatilidade locomotora, sem dúvida, contribuiu para o sucesso da espécie em se dispersar por corredores florestais da Europa à Ásia.”

Alimentação diversificada

A mandíbula inferior e a porção superior do osso da perna indicam que o indivíduo era do sexo feminino, segundo os pesquisadores. Eles sugerem que esses macacos eram provavelmente “macacos para todos os negócios”, capazes de navegar nas árvores e em terra. Os dentes indicam que podiam comer uma grande variedade de plantas, frutas e flores, enquanto os símios se alimentam principalmente de frutas. “O que é fascinante nesse macaco é que, como outros colobines (macacos do Velho Mundo), ele tinha a capacidade de fermentar celulose”, afirma Jablonski. “Ele tinha um intestino semelhante ao de uma vaca.”

Esses animais são bem-sucedidos porque podem comer alimentos de baixa qualidade com alto teor de celulose e obter energia suficiente, fazendo a fermentação e usando os ácidos graxos subsequentes então disponíveis nas bactérias. Um caminho semelhante é usado por animais ruminantes, como vacas, veados e cabras. “Macacos e símios comem coisas fundamentalmente diferentes”, relata Jablonski. “Os símios comem frutas, flores, coisas fáceis de digerir, enquanto os macacos comem folhas, sementes e até mais folhas maduras se for preciso. Por causa dessa digestão diferente, eles não precisam beber tanta água, obtendo toda o fluido da vegetação.”

Assim, não precisavam viver perto de corpos d’água e podiam sobreviver a períodos de dramáticas mudanças climáticas. “Esses macacos são iguais aos encontrados na Grécia durante o mesmo período”, conta Jablonski. “Isso sugere que eles se espalharam de algum lugar da Europa central para a Ásia e fizeram isso com bastante rapidez. É impressionante quando você pensa em quanto tempo leva para um animal se dispersar por dezenas de milhares de quilômetros por florestas e bosques”

Dispersão rápida

Embora haja evidências de que a espécie começou na Europa Oriental e saiu de lá, os pesquisadores dizem que os padrões exatos são desconhecidos, mas eles sabem que a dispersão foi rápida, em termos evolutivos. Durante o fim do Mioceno, quando esses macacos estavam se mudando da Europa Oriental, eles estavam se extinguindo, ou quase, em todos os lugares, exceto na África e em partes do Sudeste Asiático.

“O final do Mioceno foi um período de mudanças ambientais dramáticas”, afirma Jablonski. “O que temos nesse sítio arqueológico é um instantâneo fascinante do final do Mioceno — com um dos últimos macacos e um da nova ordem de macacos. Esse é um caso interessante na evolução dos primatas porque atesta o valor da versatilidade e da adaptabilidade em ambientes diversos e mutáveis. Mostra que, uma vez que uma forma altamente adaptável se estabelece, ela é bem-sucedida e pode se tornar o ancestral de muitas outras espécies.”

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