SAÚDE

Medicamento para gripe ajuda a diminuir carga viral da covid-19, diz estudo

Duas pesquisas trazem novidades que poderão ajudar a conter a disseminação do Sars-CoV-2. Em um dos experimentos, a vacina da Moderna gera anticorpos por até 90 dias. Em outro, uma droga de aplicação simples reduz a carga do vírus em infectados

Vilhena Soares
postado em 04/12/2020 06:00
 (crédito: AFP / Sakis MITROLIDIS)
(crédito: AFP / Sakis MITROLIDIS)

Enquanto os países começam a divulgar calendários de vacinação, surgem mais avanços científicos que poderão ajudar no combate à covid-19. Duas pesquisas divulgadas ontem mostram ganhos significativos na área de controle da transmissão do Sars-CoV-2. Estudo divulgado no periódico New England Journal of Medicine mostra que a vacina da empresa Moderna gera anticorpos no organismo humano por até 90 dias. Já na revista Nature Micriobiology, cientistas norte-americanos apresentam um medicamento para a gripe que reduz a carga viral do novo coronavírus e diminuiu a transmissibilidade da enfermidade em furões.

A equipe estadunidense explica que os remédios usados atualmente para tratar a covid-19, como o remdesivir e o soro convalescente, são inadequados no controle da transmissão comunitária do vírus. Isso porque não podem ser administrados por via oral, o que dificulta o tratamento de um número maior de pessoas. Os cientistas resolveram testar a eficácia do medicamento MK-4482/EIDD-2801, com potencial para resolver os embates. “Esse remédio pode ser administrado por via oral e ajudou a prevenir a transmissão do vírus influenza em porquinhos-da-índia e em camundongos”, relatam os autores do artigo, liderados por Richard Plemper, pesquisador da Universidade Estadual de Geórgia.

Para avaliar melhor os efeitos da droga, furões foram tratados com diferentes abordagens ao longo de três dias: receberam, duas vezes ao dia, 5mg ou 15mg da droga cerca de 12 horas após serem infectados ou receberam 15mg, 36 horas depois do contágio. Havia ainda um grupo de controle, que não recebeu o medicamento. “O RNA da Sars-CoV-2 foi detectável nos tecidos nasais de todos os animais, mas em quantidade significativamente reduzida nos grupos tratados com a droga”, frisaram os cientistas.

Os autores também avaliaram se o medicamento poderia suprimir a transmissão do vírus. Para isso, reuniram, em um mesmo alojamento, animais saudáveis com furões que receberam a droga 12 horas após a confirmação de infecção pelo Sars-CoV-2. Três dias depois, não foram detectadas, nos furões saudáveis, partículas infecciosas do vírus. Isso mostra que o uso do medicamento impediu que esses animais contaminassem os saudáveis, segundo os cientistas.

Já quando animais infectados que não receberam o medicamento foram postos no mesmo ambiente que cobaias saudáveis, todos os furões foram contaminados. “É necessário frisar que a eficácia antiviral da MK-4482/EIDD-2801 em humanos é desconhecida. No entanto, os resultados em nossos experimentos indicam que esse medicamento pode ter o potencial de bloquear a transmissão do Sars-CoV-2”, enfatizaram.

Adaptações

Victor Bertollo, médico infectologista do Hospital Anchieta de Brasília, explica que os resultados obtidos são positivos, apesar de bastante iniciais. “Esse medicamento testado pelo grupo pertence a uma classe de remédios chamada análogos de nucleosídeo. Eles já se mostraram eficazes no controle de outras enfermidades, como o HIV, porque conseguem bloquear uma enzima responsável pela replicação desse vírus. Mas é importante ter cautela, pois os testes foram feitos em animais”, afirmou. “O remédio também foi administrado 12 horas depois do diagnóstico, mas, no nosso cotidiano, só vamos tratar um paciente quando ele demonstrar os sintomas, e isso pode demorar para acontecer.”

O especialista destaca também que, se o medicamento experimental se mostrar eficaz em humanos, terá características importantes para facilitar o combate à pandemia. “É um remédio de uso oral, o que facilita o controle da transmissão da doença. Esse diferencial é importante porque outros medicamentos, por serem intravenosos, são administrados apenas em hospitais. Isso faz com que seja trabalhoso atingir um número maior de pessoas e em pouco tempo, algo necessário para a diminuição do contágio. Outro ponto importante é que é um tipo de terapia menos cara”, justificou.

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"Imunidade durável"

À espera de autorização para o uso da fórmula para além dos testes clínicos, a farmacêutica Moderna teve o efeito de sua vacina atestado em uma revista científica. Um estudo divulgado na New England Journal of Medicine mostrou que a fórmula gera anticorpos persistentes por 90 dias após a aplicação da segunda dose. Os dados são provenientes da primeira fase de testes clínicos do medicamento, e os participantes serão acompanhados por 13 meses para verificar a imunidade a longo prazo.

“Recentemente, relatamos os resultados de um estudo de fase um de uma vacina de RNA mensageiro (mRNA-1273) para prevenir a infecção por Sars-CoV-2. Esses dados provisórios cobriram um período de 57 dias após a primeira vacinação. Aqui, descrevemos os níveis de imunogenicidade 119 dias após a primeira dose e 90 dias após a segunda”, detalharam, no artigo, os cientistas.

No texto, eles relatam ainda que observaram uma diminuição “leve” e esperada no nível de anticorpos em participantes vacinados, mas a um grau que ainda permanece alto e acima da imunidade natural (que ocorre em pacientes que foram infectados. “Esses resultados mostram que, apesar de um ligeiro declínio esperado na quantidade de anticorpos neutralizantes, a mRNA-1273 tem o potencial de fornecer uma imunidade durável”, ressaltaram.

A equipe pondera que novas análises precisam ser feitas para entender melhor o efeito protetor da vacina, já que os anticorpos são apenas um componente da resposta imunológica. Os responsáveis pela vacina também informaram, no estudo, que nenhum efeito colateral grave foi observado em todo o ensaio de fase um, que teve início em março.

“São notícias muito positivas no geral”, comentou Benjamin Neuman, professor da Universidade do Texas à agência France-Presse de notícias (AFP). O especialista também ressaltou que a resposta imunológicas permaneceu “razoavelmente forte” nos idosos, o que, avalia, é outra notícia bastante animadora revelada pelo estudo.

 

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